
Pará - O juiz federal titular da 9ª Vara, José Airton de Aguiar Portela, rejeitou, nesta segunda-feira (01), pedidos de concessão de liminar formulados pelo Ministério Público Federal (MPF), para que fossem suspensos os procedimentos de concessão de 47 blocos de petróleo e gás na Bacia da Foz do Amazonas, até que sejam cumpridas uma série de medidas previstas na legislação socioambiental.
A decisão (veja a íntegra) tem repercussão não apenas no Pará, mas nos Estados do Amapá, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande, abrangidos pela chamada Margem Equatorial, uma vez que o pedido compreende a oferta de blocos em todos eles. Os investimentos estimados para a exploração de petróleo nessa área, conforme o plano de negócios da Petrobras traçado para o período de 2025 a 2029, são de US$ 3 bilhões, representando 38% do total de US$ 7,9 bilhões destinados à exploração pela empresa no período, com a geração de royalties que podem mudar condição econômico-financeira dos referidos Estados, hoje com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que avalia o estágio de bem-estar da população.
Na ação civil publicada ajuizada perante a 9ª Vara, especializada no julgamento de ações de natureza ambiental, o MPF pede que a realização do leilão para conceder os blocos ficasse condicionada à realização de estudo de impacto climático, como também de estudos sobre povos e comunidades tradicionais que habitam a região costeira. Também pedia um estudo estratégico, chamado Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), e a realização de consulta prévia, livre e informada aos povos e comunidades tradicionais potencialmente afetados.
Investimentos – Em relação aos argumentos para a suspensão do processo de concessão dos blocos, a 9ª Vara considerou legítima a preocupação do MPF, em razão dos altos investimentos exigidos para explorar a produção de petróleo e gás na Foz do Amazonas e de eventuais impactos ambientais, mas ponderou que “essa sindicância acerca dos riscos e cumprimento do regramento que vincula tal processo precisa ser feita a tempo e modo”.
Airton Portela fundamenta que um estudo de impacto climático, conforme alega o MPF, somente poderá ser exigido após delimitado e determinado o objeto do contrato de exploração, e durante o processo de licenciamento ambiental. “Nesta fase, conforme normativos do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), obrigatoriamente, será apresentado um plano gerenciamento de riscos identificados, que consolida e relaciona medidas preventivas e mitigadoras à sua possibilidade de tolerância ou recusa, conforme Análise de Risco Ambiental (ARA), cabendo lembrar que tal estudo será custeado e realizado pelo empreendedor, e não pelo Poder Público ofertante”, reforça a decisão.
Consulta prévia – Em relação à consulta prévia, livre e informada, o magistrado argumenta que esse requisito só deve ser observado em ações estatais que afetem diretamente “os povos interessados”, neste caso, indígenas, quilombolas e demais povos tradicionais (tais como ribeirinhos) alcançados por tal expressão.A decisão acrescenta, no entanto, que manifestação conjunta dos Ministérios de Minas e Energia (MME) e do Meio Ambiente (MMA) atesta não existirem blocos de exploração sobrepostos a terras indígenas, bem como a Portaria Interministerial MMA/MME nº 01/2022 determina a exclusão de áreas que apresentem sobreposição com terras indígenas em diferentes fases de regularização, conforme as bases georreferenciadas da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). “Também constato que a Manifestação Conjunta MME-MMA nº 06/2020 atendeu ao artigo 4º da referida Portaria e, nesta preliminar análise, não diviso blocos ofertados sobrepostos a terras indígenas”, afirma o magistrado.
Airton Portela menciona ainda a Portaria Interministerial nº 60/2015, segundo a qual eventuais consultas aos povos indígenas deverão ser realizadas apenas no processo de licenciamento ambiental, caso se identifiquem impactos diretos às comunidades. Por esses fundamentos, o juiz disse não perceber, nas áreas ofertadas, a presença de tais populações e a consequente obrigação de que sejam ouvidas.
A 9ª Vara também discordou da alegada necessidade de realização de uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar na área. A decisão destaca que os blocos em oferta no edital foram objeto de manifestação conjunta do MME e do MMA, suprindo, assim, a exigência da AAAS. Acrescenta ainda que, sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 887/DF, estabeleceu que “a viabilidade ambiental de determinado empreendimento é atestada não ante a apresentação de estudos ambientais e da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), mas por meio do procedimento de licenciamento ambiental em que se aferem, de forma específica, aprofundada e minuciosa, os impactos e riscos ambientais da atividade a ser desenvolvida.”
“Por segurança jurídica, embora o ideal e desejável seja que já na oferta de blocos houvesse uma prévia e bem cuidada avaliação ambiental, assim diminuindo os riscos às próprias empresas adquirentes dos blocos, que certamente terão maior dificuldade para aprovação de projetos em áreas sensíveis, o fato é que o regramento da matéria não contém tal exigência, relegando-a para momento posterior a outorga e assinatura de contratos, quando da realização dos estudos de impacto ambiental”, conclui a decisão.
Fonte: Justiça Federal