O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líderes partidários da Câmara, a bancada feminina e o relator, deputado Pedro Campos (PSB-PE), fecharam um acordo para aumento gradual da licença-paternidade, com gastos custeados pelo Tesouro Nacional. A proposta é elevar a licença remunerada após o nascimento do filho para dez dias a partir de 2027.
O parecer do projeto de lei, ao qual a reportagem teve acesso com exclusividade, estabelece um cronograma para ampliação do benefício. A cada ano serão acrescidos cinco dias de licença, até chegar a 30 dias a partir de 2031. Atualmente, a legislação prevê que o pai terá direito a cinco dias corridos de licença remunerada do trabalho para cuidar do filho recém-nascido.
O custo, que hoje é bancado pela empresa, passará a ser pago pela Previdência Social com a ampliação da licença. A mudança visa evitar resistências por parte do setor privado e igualar esse direito às condições da licença-maternidade, que já é paga pelo governo federal.
A votação na Câmara busca atender à decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de que o benefício seja regulamentado pelo Congresso, o que está pendente desde 1988.
Segundo estimativas da consultoria da Câmara dos Deputados, o impacto será bilionário para os cofres públicos. Em 2027, primeiro ano da medida em vigor, caso aprovada, a despesa alcançaria R$ 4,34 bilhões. Em 2028, subiria para R$ 6,18 bilhões. A partir de 2031 chegaria a quase R$ 12 bilhões.
“Do ponto de vista fiscal, é algo razoável para o governo federal, que teria condições de ser absorvido dentro do Orçamento da União e dentro do orçamento do INSS”, diz Campos, acrescentando que os limites do arcabouço fiscal e da Lei de Responsabilidade Fiscal serão observados.
O gasto pode ser menor se houver mudança na atual política de valorização do salário mínimo (que eleva o valor do piso com base na inflação do ano anterior, mais o crescimento do PIB de dois anos antes, com um teto de 2,5%).
Se o salário mínimo for reajustado apenas pela inflação, o gasto cairia para R$ 2,4 bilhões em 2027, R$ 3,4 bilhões em 2028, R$ 4,5 bilhões em 2029, R$ 5,6 bilhões em 2030 e R$ 6,9 bilhões a partir de 2031.
O texto não apresenta nova fonte de custeio. Para tentar angariar mais apoio, o governo tentou vincular o custo à aprovação da MP (Medida Provisória) de aumento de impostos, que acabou derrubada na última quarta-feira (8).
Para evitar inconstitucionalidade, o projeto diz que o programa será bancado pela Previdência Social. Segundo Campos, o governo está empenhado em garantir uma fonte de receita para o benefício.
O projeto original da bancada feminina aumentava a licença-paternidade para 60 dias num prazo de cinco anos. O gasto, no entanto, poderia chegar a R$ 118,2 bilhões em uma década, segundo cálculo do governo revelado pela Folha em julho.
Por conta dos valores envolvidos e de uma resistência de parte da Câmara, Campos afirma que o acordo viável foi elevar a licença-paternidade para 30 dias. “É um relatório pronto para ter a maioria de votos da Câmara, dentro das visões distintas dentro da Casa. Esse é o texto que entendemos ser possível em diálogo com o governo e com a Câmara”, diz.
De acordo com o deputado, a licença de 30 dias para os pais de filhos recém-nascidos ou adotados vai equiparar o Brasil a países da Europa. “Ter um pai presente deve ser um direito e não um privilégio. A divisão justa do trabalho de cuidado deve ser buscada na nossa sociedade, que hoje sobrecarrega as mulheres”, afirma.
O período de licença pode ser maior, já que será mantido o Programa Empresa Cidadã, que concede benefícios fiscais para as companhias que dão mais 15 dias de folga remunerada para o pai o que, hoje, eleva o período de afastamento de cinco para 20 dias. Quando o projeto estiver totalmente implementado, portanto, o benefício poderá chegar a 45 dias.
O projeto permite que essa licença seja tirada de forma fracionada, com metade logo após o nascimento ou adoção e a outra metade em até 180 dias. Além disso, garante estabilidade de um mês no emprego após o retorno. O pai terá direito a prorrogação automática do benefício em caso de internação da mãe ou do bebê e a 120 dias de afastamento se a mãe falecer.
O projeto estabelece que um juiz pode determinar a suspensão do benefício quando houver violência doméstica ou abandono material comprovados.
Presidente da frente parlamentar pela licença-paternidade, a deputada Tabata Amaral (PSB-SP) diz que a pauta tem apoio da esquerda e da direita e “pode ter também o apoio do setor privado se a gente avançar de forma responsável”.
A frente une como coordenadoras a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) e a senadora Damares Alves (Republicanos-DF). Tabata diz estar confiante na aprovação do texto. Segundo ela, foi a construção possível com o Congresso e a sociedade civil para alcançar maioria.
“A gente está, desde a Constituição de 1988, sem regulamentar um dos pilares para as famílias brasileiras, que é a presença do pai. O projeto traz igualdade de oportunidades para homens e mulheres, mas a gente foi descobrindo também que, com a licença, as empresas são mais lucrativas, que os homens são menos agressivos, têm menos questões de saúde mental, e tudo isso favorece o desenvolvimento infantil”, diz.
O relator do projeto afirma que vai procurar o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para que coloque a proposta em votação no plenário o mais rápido possível e quer aproveitar a comemoração do Dia da Criança como força motriz para o avanço.