Idiana Tomazelli, Julia Chaib e Victoria Azevedo/Folhapress
Em uma importante vitória para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o plenário da Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do novo arcabouço fiscal na noite desta terça-feira (23) por 372 votos a 108.
O placar expressivo mostra uma ampla folga em relação ao mínimo de 257 votos que o governo precisava reunir para a aprovação de um projeto de lei complementar. Na semana passada, a votação da urgência já havia reunido 367 votos.
O novo arcabouço fiscal vai substituir o atual teto de gastos, regra que limita o crescimento das despesas à inflação e ainda está em vigor, embora tenha sido driblado nos últimos anos. Para a substituição ser efetivada, porém, o texto ainda depende de votação de destaques (mudanças no texto) na Câmara e precisa passar pelo Senado Federal.
A aprovação do texto-base do projeto ocorreu após modificações em seu conteúdo, mas ainda assim representa um feito relevante para o governo petista, que amargou derrota recente ao tentar mudar o Marco do Saneamento e enfrenta dificuldades para consolidar uma base de apoio no Congresso Nacional.
O avanço da proposta também é uma vitória para o ministro Fernando Haddad (Fazenda), que precisou enfrentar resistências dentro do próprio PT ao desenho da regra, que combina metas de resultado primário com um limite de crescimento para gastos.
Uma ala do partido defendia uma regra fiscal mais branda, ancorada apenas na meta de primário, mas Haddad fez prevalecer o entendimento de sua equipe sobre a necessidade de manter um teto para as despesas, ainda que mais flexível –com espaço para alta real de gastos, acima da inflação. Mesmo durante as discussões no Congresso, a sigla continuou fazendo críticas ao texto.
Agora, esse modelo é chancelado pela Câmara dos Deputados, com votos favoráveis do próprio PT e também de siglas de centro como PP, MDB e PSD. Duas legendas da base aliada, PSOL e Rede, orientaram contra o texto. Já o PL do ex-presidente Jair Bolsonaro liberou a bancada.
Pela regra proposta pelo governo, o crescimento do limite de gasto do ano seguinte deve equivaler a 70% da variação da receita em 12 meses acumulados até junho do ano anterior, já descontada a inflação, desde que respeitado o intervalo de 0,6% a 2,5%. Na prática, esses são o piso e o teto de avanço das despesas, independentemente do quadro econômico do país.
Além disso, o governo precisa buscar uma meta de resultado primário, que é obtida a partir da diferença entre receitas e despesas. O governo diz buscar um déficit de 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano e pretende alcançar superávit de 1% do PIB em 2026.
Caso a meta seja descumprida, a proporção de alta das despesas em relação à arrecadação cai a 50%, até a retomada da trajetória de resultados dentro do esperado.
As linhas gerais da proposta foram mantidas pela Câmara, mas os ajustes no texto seguiram até poucas horas antes da votação.
O relator, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), havia incluído na semana passada um dispositivo que fixava o crescimento das despesas em 2024 no teto de 2,5%, o que foi visto por economistas do mercado como uma manobra para gastar mais. Esta e outra mudança (focada na inflação usada para corrigir o limite) resultariam, juntas, em um espaço extra de até R$ 82 bilhões.
O número foi contestado por Haddad e Cajado, mas o ruído gerado levou o relator a ajustar o texto.
“Vamos fazer um mix entre o que estava no texto original e uma possibilidade. O texto original previa o crescimento de 1,12% pelos cálculos que o próprio governo forneceu”, disse Cajado após reunião com lideranças para selar o acordo.