Puba, novo espaço gastronômico dos chefs Thiago Castanho e Gustavo Rodrigues, na Cidade Velha, conecta ingrediente e outros sabores da Amazônia às influências do mundo
A combinação de ingredientes simples da culinária paraense, unidos com conceito e sofisticação. É com essa proposta que surge o Puba, no coração da Cidade Velha. Com origem no tupi, “puba” remete à fermentação da massa da mandioca, e dá nome ao novo espaço gastronômico dedicado à versatilidade desse ingrediente tão importante da cultura alimentar amazônida.
O antigo e o contemporâneo dividem o espaço no Puba, abrigado em um imóvel do início do século 20. A escolha faz sentido com a ideia de propor conexões entre aquela comida de casa dos nossos avós, remetendo ao gosto de infância, e o paladar e a riqueza da gastronomia amazônica servida de forma criativa, hoje exportado para o mundo.
O lugar é pequeno e acolhedor, com capacidade para 34 pessoas sentadas, oferecendo um cardápio com dez itens, além de 20 rótulos de vinhos. Durante todo este mês, está em soft opening, com reservas antecipadas. Na cozinha, os chefs Thiago Castanho e Gustavo Rodrigues – que já dividem o Sororoca, em São Paulo – apresentam um variado menu, unindo as trajetórias de ambos, com os temperos da Amazônia e da culinária paulista. O resultado dessa parceria se reflete em pratos repletos de sabores, cheiros e cores, tendo como referência a mandioca e seus subprodutos, tais como o tucupi, a farinha d’água, a farinha de macaxeira, carimã e a mandiocaba.
“Puba é a fermentação da mandioca. Então, aqui no Norte e no Nordeste do Brasil, a mandioca é colocada na água para fazer farinha d’água ou beijus ou ainda todas as farinhas que a gente tem aqui, e bolos no Nordeste. A gente pensou num nome simples que representasse muita coisa. A proposta é mostrar a versatilidade da mandioca, levando-a para o mundo. Outro ponto é que a fermentação está ligada às bebidas, com as cartelas de vinho, que servimos aqui e que foram escolhidas especialmente para o clima de Belém pelas sommelières Dani Bravin e a Cássia Campos”, detalha Thiago Castanho.
Dessa forma, insumos típicos da nossa região, como por exemplo, o tucupi e as nossas ervas aromáticas, se traduzem em pratos como melaço de mandioca, taco de porco assado, Nikuman de maniçoba, tortilla de mandioca ou ainda na mostarda de tucupi, fruto de viagens e do trabalho que Castanho já faz na sua cozinha.
“Os indígenas desenvolveram, à maneira deles, os usos da mandioca. E a gente vai mostrar agora, pelo que experienciamos em viagens, o que a gente também pode fazer com esse ingrediente sem ser o que a gente já consome todo dia, trazendo o potencial desse produto para além da nossa cultura”, diz o chef.
“Cada vez mais as cidades estão globais, então fomos atrás do que tem, por exemplo, em Nova Iorque, em Portugal, e em algumas cidades do Brasil como São Paulo, buscando coisas que são parecidas em pontos diferentes do mundo. Viajamos para vários lugares e, quando eu cheguei a Belém, sentia falta de um lugar desses, que é mais pequenininho, que tem um cardápio enxuto e constantemente reformulado”, explica Thiago Castanho.
SUSTENTABILIDADE
Gustavo Rodrigues e Thiago Castanho dividem anos de amizade, com muita troca e aprendizado. Gustavo foi subchefe de Castanho no restaurante Remanso do Bosque. Hoje, os dois são sócios no Sororoca, um bar de pescados e frutos do mar, em São Paulo. Formado em gastronomia, com especialização em História da Alimentação Brasileira, o chef paulista diz que sempre soube que seu maior interesse era pela cozinha brasileira.
]“Não tive dúvida, quando surgiu essa oportunidade de um projeto. Ainda mais em Belém, que é uma cidade muito importante da Amazônia, e em especial em ano de COP-30. Ainda com a oportunidade de a gente usar cada vez mais insumos tão ricos e valiosos que tem aqui nesse pedaço do Brasil. Então, a gente estruturou o nosso cardápio homenageando esse ingrediente tão importante que é a mandioca, celebrando esse ingrediente e respeitando muito a cultura local. É uma cozinha feita por brasileiro, mas olhando para o mundo”, define.
Gustavo Rodrigues acrescenta que a culinária amazônica, sendo considerada um patrimônio cultural do Brasil, é reconhecida pela sua diversidade, complexidade e sabores únicos. Com a aproximação da COP, o olhar de fora para o que é daqui tem intensificado.
“Hoje, já contamos com a introdução de peixes como o filhote no cardápio do Sororoca. Uma vez ou outra, o mapará. Além do tucupi e de tantos outros insumos típicos do Norte”, conta.
Outro destaque da nova jornada dos chefs é a valorização dos pequenos produtores que fortalecem a cadeia produtiva e o comércio local. “Um trabalho que a gente já faz, nesses mais de 20 anos de cozinha, é fomentar a produção local. Por exemplo, tem a ostra do Jairo, de São Caetano de Odivelas, que foi uma batalha que tivemos, de mostrar que nós temos ostras saborosas, seguras e que todo mundo quer. Com o tempo, essa ostra que veio de uma comunidade e é produzida de forma sustentável, passou a ganhar notoriedade. Outro produto é o chocolate da Dona Nena. Quando comecei, ela vendia 500 gramas de chocolate na feirinha de orgânicos e hoje ela recebe pessoas ilustres na casa dela, como Macron [Emmanuel Macron, presidente da França] e Lula”, destaca Castanho.
Um lugar também para contar histórias da Amazônia
Rosto que se tornou conhecido nacionalmente, por suas participações em programas de TV, como “Cozinheiros em Ação” (2013), “Fome de Luta” (2022) e “Fome de Medalha” (2024), Thiago Castanho vem apresentando, desde 2020, o programa “Sabores da Floresta”. A atração está na segunda temporada, em exibição no Canal Futura.
Mas em breve, o chef deve apresentar novidades também nesse campo do audiovisual voltado à gastronomia – ele adianta que está dialogando com alguns canais para apresentar novos projetos previstos ainda para este ano.
Além disso, mantém conteúdos sendo produzidos para o YouTube, cujas gravações estão ocorrendo, inclusive, no Puba. “A gente quer que aqui seja uma presença digital e ao mesmo tempo física. Inclusive temos dois pratos que estão no canal”, diz.
Essas experiências no audiovisual renderam ao chef paraense uma bagagem cultural, reconhecimento nas telas e também a amizade com o fotógrafo, documentarista e diretor de fotografia paraense Thiago Pelaes. O fotógrafo é um dos sócios do novo empreendimento e também traz ao projeto essa relação com uma identidade visual da Amazônia.
Em seu trabalho, Pelaes conta histórias já há mais de 15 anos na Amazônia, especialmente em Belém, no Pará. “Para mim, é muito gratificante viver dessa maneira a Cidade Velha. É uma forma encontrar esse pedacinho de história viva, que é essa casa, localizada nesse bairro que tem tantas histórias. E eu acho que é muito legal poder contribuir. Eu já vivo de contar histórias há muito tempo com a fotografia e com audiovisual. E de uma certa forma, agora a gente conta uma história de gastronomia, de comida, mas não deixa de ser uma história dentro dessa casa, que é uma casa que tem uma herança e uma história por trás. Agora a gente pode juntar isso e proporcionar diferentes experiências especiais para essas pessoas que vão vir visitar o nosso espaço”, diz ele.
O espaço está na Cidade Velha, dentro de área de tombamento histórico. Para Castanho, o local possui aquele ar de memória afetiva que eles procuravam.
Para chegar ao visual que queriam, e fazer o restauro do local, os três sócios buscaram o trabalho do Estúdio Bohho, que fez pequenas mudanças a partir de elementos mais modernos.
“A gente vive a Cidade Velha desde a infância e, quando viaja pelo mundo e vê centros históricos sendo valorizados como algo de importante na cidade, sonha com isso para a nossa cidade também. Eu e o Thiago Pelaes compramos essa casa em 2021, para fazer estúdio e gravar episódios do ‘Sabores da Floresta’. E ao longo desse restauro, pensamos em dar vida ao lugar para além de um estúdio. Assim, pensamos em trazer esta casa de 1916 para 2025. Assim, o projeto reuniu o Pelaes, do audiovisual, eu, e o Gustavo, que é um cara bom de gestão”, diz Castanho.
“Como contador de histórias que eu sou, na fotografia e no audiovisual, e tendo o privilégio de ter viajado muito pelo nosso estado, de conhecer muitas histórias, ao longo dos últimos anos eu entendi que a nossa identidade está na arquitetura. Ela está na nossa maneira de falar, na nossa comida, na nossa música, então é muito gratificante, agora, de uma certa forma, poder participar desse movimento também da alimentação, da nossa cultura, da nossa gastronomia. É quase que um desdobramento de tudo aquilo que eu vivi ao longo dos anos nessa nossa carreira”, afirma Thiago Pelaes.
Noite
Bar Puba Belém
Quando: O espaço está em soft opening até o fim deste mês, com funcionamento de terça a sábado, das 19h às 23h30.
Onde: Rua Veiga Cabral, 649, esquina com Ângelo Custódio – Cidade Velha, Belém – PA.
Informações:
(91) 99309-7025.