Aline Rodrigues
Na última semana, o governador Helder Barbalho sancionou a Lei N° 9.919, de 11 de maio de 2023. A partir de então, a obra criativa do Mestre Vieira, como músico e compositor, passou a ser reconhecida como Patrimônio Cultural e Imaterial do Estado do Pará. Um passo a mais para a salvaguarda desse legado que continua influenciando a música paraense.
“Todos nós ficamos felizes com a iniciativa. Mestre Vieira é um gigante da cultura paraense, criador da guitarrada, com reconhecimento nacional da Funarte, da Universidade Federal Fluminense, no Rio, e também pelo próprio Ministério da Cultura, em 2008, quando recebeu a Medalha de Honra ao Mérito cultural”, destaca a jornalista Luciana Medeiros, que há mais de 10 anos se dedica à organização, produção, difusão e agora, salvaguarda do legado do mestre.
“A iniciativa do Pará é válida, mesmo que tenha chegado somente agora, em tempo de ver esse movimento se fortalecer também em Barcarena, onde se comemora o Dia Municipal da Guitarrada, no dia do aniversário de nascimento do mestre, 29 de outubro. Mas além da festa realizada pela família, pelo menos até o ano passado esta não é uma data comemorada ativamente pela prefeitura”, lembra a jornalista, destacando que Mestre Vieira também vem sendo pesquisado nas universidades e já foi tema de alguns mestrados e agora de um doutorado.
A publicação da lei foi recebida com muita alegria pela família e pelos conterrâneos de Joaquim de Lima Vieira, o Mestre Vieira, que nasceu em 29 de outubro de 1934, em Barcarena, no Pará.
“[Estamos] Com muita alegria e felicidade em saber que o legado que nosso pai deixou foi reconhecido. Queremos continuar levando esse legado e buscar recursos para realização da Casa Memorial Mestre Vieira”, informa Wilson Vieira, um dos filhos do mestre.
O projeto prevê tornar a residência de Mestre Vieira em Barcarena em uma casa em sua memória, um espaço cultural e turístico para a cidade, pensado desde seu falecimento, em 2018. “Suas guitarras e instrumentos estão sob a guarda dos filhos, mas não possuem uma manutenção e logo podem se perder. O projeto está estagnado”, conta Luciana, que acredita que além de reconhecer a relevância da obra do Mestre, esta iniciativa também deve fortalecer a Guitarrada como movimento cultural.
“Embora o gênero também tenha sido decretado Patrimônio Cultural Imaterial do Estado em 2011, não vemos políticas públicas voltadas a essa vertente tão poderosa da música paraense. Então, espero que as duas iniciativas se fortaleçam”, pontua.
Para Waldo Possa, presidente da Associação dos Músicos de Barcarena e da Academia de Letras do município, o reconhecimento é um marco. “A gente, sendo aqui do berço da guitarrada, não podia sentir maior alegria, com esse patrimônio sendo reconhecido. Barcarena está em festa, é muito gratificante esse título, tenho certeza que Mestre Vieira gostaria de dizer isso em vida, mas a gente, como súdito dele, está muito feliz por esse reconhecimento do trabalho dele”, diz Waldo, que acredita ainda que esse reconhecimento vai influenciar diretamente os músicos que trabalham com o estilo musical.
“Tem grupos e músicos que vivem da guitarrada e isso vai influenciar muito, acredito que vai ser mais valorizada”, pontua Waldo, que foi vizinho do Mestre Vieira e acompanhou de perto a trajetória do artista.
“É como se a minha obra estivesse sendo reconhecida, fico muito alegre com tudo isso, era o sonho do Mestre e também o nosso sonho”, acrescentou Waldo, que também é cantor e compositor.
A notícia também foi celebrada por Dejacir Magno, vocalista de Vieira e seu Conjunto, o grupo com que o músico fez sucesso. “É um valor muito valioso, pena que ele já não está mais entre nós para participar desta alegria e reconhecimento. Fico muito feliz, pois junto com ele fiz parte deste legado”, diz Dejacir, que começou a ensaiar e tocar em 1969 com o Mestre, e se tornou compadre dele.
Vários projetos hoje já salvaguardam a obra de Vieira, criados e organizados por Luciana Medeiros. Como o DVD “Mestre Vieira – 50 Anos de Guitarrada”, realizado em 2012 no Theatro da Paz, com recursos captados via Lei Semear; e uma série de animação intitulada “Os Dinâmicos”, realizada com recursos do FSA/Ancine, com 13 episódios em que os músicos de Vieira e Seu Conjunto se transformam em heróis da Amazônia. “Fiz isso pensando em difundir o gênero e suas músicas junto ao público infantil”, conta.
Em 2022, saiu o Songbook de Mestre Vieira. “Traz toda a sua discografia, com fichas técnicas e textos sobre a história artística dele, além de suas origens portuguesas e 30 partituras. Esse trabalho foi realizado pelo projeto ‘Inventário Mestre Vieira’, que também tem site, e foi feito via Rumos Itaú Cultural”, destaca Luciana.
A jornalista também conta que que tem um documentário sobre a vida e obra de Mestre Vieira por finalizar. Ela espera que, com as leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2, o filme sobre possa ser concluído. “Será sem dúvida uma Bíblia audiovisual da guitarrada, pois registra, conta a história e dá voz ao maior nome da guitarrada, seu criador. Esse filme começou a ser feito em 2011, mas paramos diversas vezes por conta de outros projetos. Voltei a filmar em 2019, chegando até Fortaleza, para contar como se deu o sucesso estrondoso dele no Ceará, projetando-o nacionalmente. Quero muito lançar esse documentário até dezembro deste ano”, projeta.