Pryscila Soares
Fé, solidariedade e amor ao próximo. Todos os anos, o Círio de Nazaré é vivenciado de diferentes formas por milhares de pessoas que acompanham a procissão pelas ruas da capital paraense, no segundo domingo de outubro. Para além dos promesseiros e espectadores desta grande festa católica, vários grupos de voluntários se mobilizam neste período para participar ajudando quem está nessa caminhada.
Distribuição de água, de cestas básicas para o Centro Social de Nazaré, lanches e até kits de primeiros socorros entram na lista dessa corrente pelo bem. Há grupos que prestam apoio emocional, auxiliando os devotos que estão ali para pagar suas promessas na corda, assim como ajudam quem deseja somente fazer uma prece e tocar na corda que conduz a berlinda da imagem peregrina.
É o caso do grupo “Amigos da Corda”, que completará 23 anos de existência neste domingo, dia 8. Hoje composto por cerca de 40 pessoas, o grupo foi se formando de forma espontânea, reunindo amigos e pessoas que se conheceram durante a procissão. Fundador do grupo, o relações públicas Raphael Lima, 48, conta que eles estão presentes na procissão não somente para agradecer e pagar as próprias promessas. O intuito principal é ajudar o maior número de devotos a chegarem até o final do percurso e cumprirem suas promessas, assim como colaborar com o trabalho da Guarda de Nazaré e da Cruz Vermelha.
VOLUNTÁRIOS DA FÉ
Com o consentimento da Guarda, eles ajudam a abrir caminho para facilitar o atendimento dessas pessoas, além de permitirem a entrada na área da corda de romeiros que demonstram o desejo de ficar somente por alguns minutos perto deste grande símbolo de fé. “O grupo iniciou no ano 2000 entre amigos. Alguns se conhecem desde a infância e estavam ali como milhares de promesseiros para pagar suas respectivas promessas e agradecer a Deus por muitas graças alcançadas. Fomos chamando mais e mais pessoas. Naturalmente, estávamos na corda pagando promessa, agradecendo, mas também ajudando outros promesseiros”, destaca Raphael.
“A cada ano nos deparamos com novas demonstrações de fé. Não podemos medir a fé. Pode ser o simples fato de a pessoa querer apenas encostar a mão na corda e fazer uma oração. Mesmo quem não faz parte do grupo entende e afasta para a pessoa passar”, disse. “Ajudamos não só os guardas de Nazaré, mas a Cruz Vermelha e os bombeiros a fazerem o trabalho deles. A pessoa desmaiou, a gente tira dali, já chamamos o Corpo de Bombeiros e damos esse apoio”, acrescenta Raphael Lima.
O ponto de encontro do grupo é a casa de um dos membros da coordenação, o consultor de vendas Fernando Martins, 45. Os promesseiros se reúnem por volta das 4h para tomarem um café da manhã reforçado. De lá partem a pé para a procissão. A concentração ocorre sempre na Avenida Boulevard Castilhos França, onde a corda é atrelada à berlinda. No local, os participantes fazem um grande círculo e rezam o terço, como aquecimento.
O administrador Alexandre Monteiro, 45, conheceu Raphael na procissão por acaso. Ele sofreu um pequeno acidente, contou com o apoio do amigo e passou a fazer parte do grupo, cuja coordenação também inclui o empresário Junior Luiz, 45. “Foi nessas idas para o Círio que encontrei o Raphael. A gente realmente se lesiona na corda. No ano seguinte, estávamos no mesmo lugar e combinamos de estarmos sempre juntos. Nesse e em todos os anos, nosso sentimento é só gratidão”, declara Alexandre.
FILHOS DE MARIA
Outro grupo voluntário que sempre marca presença na procissão do Círio são os “Filhos de Maria”. Os participantes atuam distribuindo principalmente água mineral para os devotos, e, também, cestas básicas destinadas ao Centro Social de Nazaré, além lanches e kits de primeiros socorros. Em Círios passados, o grupo já chegou a distribuir mais de 60 mil copos de água. E para este ano a meta é alcançar 40 mil copos. O trabalho envolve mais de 100 voluntários.
A ideia de criar o grupo partiu do empresário Fernando Catarino, 34, que, juntamente com um primo, foi ao Círio há 15 anos para agradecer pela cura da mãe e da tia. “A gente foi para o Círio doando água especialmente aos promesseiros da corda. A gente queria de alguma forma participar, poder agradecer e doar. Começamos com alguns saquinhos de água. Éramos dez pessoas, da minha família, mas o grupo foi crescendo e hoje são cerca de 180 voluntários”, pontua.
Com o passar do tempo, o grupo foi recebendo o apoio de parceiros, que colaboram com doações e até mesmo com valores em dinheiro para a confecção das camisas, por exemplo. E, também, passou a ser procurado por muitas pessoas que encontraram na atividade a forma de agradecer por uma graça alcançada, conforme explica a irmã de Fernando e membro da coordenação do grupo, a advogada Ana Laura Catarino, 32. Na procissão, o grupo fica posicionado em frente ao Edifício Manoel Pinto, no cruzamento da Avenida Presidente Vargas com a Nazaré.
“O ponto maior é quando vem a corda, que tem que ter braços, por isso a gente chama os voluntários de formiguinhas, porque vamos passando os pacotes por cima para chegar na corda. Só que a gente percebeu, com o passar dos anos, que as pessoas passavam de joelhos desde 6h, às vezes ainda estava escuro. Elas vinham da catedral. Gente que precisava de uma água gelada, de um café. Então, todo ano a gente leva pão, alguns lanches e materiais de primeiros socorros”, relata Ana.
Pessoas de várias religiões se unem e reforçam o grupo. “A gente brinca que os ‘Filhos de Maria’ é o nosso Natal. A maioria é católico, mas têm muitos evangélicos, umbandistas, espíritas que ajudam e participam. A gente fala que o nosso lema é ajudar o próximo. É um momento que a gente tem para renovar a nossa fé”, diz Ana Laura.