Grande Belém

Orelhões passaram da necessidade para a memória

Belém, Pará, Brasil. Cidade. A memória de uso de orelhões. 17-08-2023. Foto-Wagner Santana/Diário do Pará.
Belém, Pará, Brasil. Cidade. A memória de uso de orelhões. 17-08-2023. Foto-Wagner Santana/Diário do Pará.

Cintia Magno

O tempo em que a população dependia de um telefone público por perto para se comunicar parece muito distante da realidade atual, em que é possível falar com qualquer parte do mundo ao alcance de um toque no celular, mas de acordo com o site da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), os antigos orelhões ainda são encontrados em diferentes cidades brasileiras e, alguns deles, em funcionamento.

De acordo com dados de julho de 2023 disponibilizados pela agência, existem 109.473 orelhões instalados pelo Brasil, mas apenas 56% deles, o equivalente a 61.291, estão em funcionamento. Entre todas as regiões do país, a Região Norte é a que concentra a menor quantidade desses telefones públicos, apenas 6,78% do total.

Já no Estado do Pará, a Anatel aponta que existem 2.803 telefones públicos, porém, a grande maioria deles, o equivalente a 84,62%, está em manutenção. Situação parecida na capital paraense, onde dos 397 orelhões instalados em diferentes bairros, apenas 2%, ou 8 aparelhos, estão disponíveis para o uso da população, de acordo com as estatísticas divulgadas pela agência.

A realidade evidenciada pelos números é facilmente constatada nas ruas. Encontrar um aparelho desses em funcionamento em Belém, hoje, é uma difícil missão. Na maioria das vezes, os orelhões que ainda são vistos em algumas calçadas guardam apenas a memória de um passado não muito distante, mas já é drasticamente diferente da realidade atual.

Quando o taxista Carlos José Medy, 71 anos, começou a trabalhar no ponto de táxi instalado ao lado da maternidade da Fundação Santa Casa de Misericórdia, em Belém, o orelhão era o principal meio de comunicação não apenas com os clientes que precisavam de um carro, mas da população em geral. Ele lembra que, naquela época, há 35 anos, o telefone público instalado ao lado do ponto de táxi era chamado frequentemente. “Funcionava direto aqui. Todo mundo ligava, os clientes que precisavam chamar um táxi e até mesmo a população. Ligava muita gente do interior pra falar com algum parente, ligava muita gente com um familiar que estava internado aí na Santa Casa. Naquela época ligavam bastante”, lembra, ao brincar com as mudanças que a evolução da tecnologia proporcionaram. “Hoje em dia isso é quase um objeto pré-histórico, só ficam as memórias mesmo”.

Também taxista, Aroldo da Silva Rodrigues, de 65 anos, lembra da época em que para conseguir se comunicar com algum familiar ou amigo, era preciso se dirigir até um telefone público. Por vezes, no meio da ligação, a ficha caía e a conversa era interrompida. A cena torna-se até cômica diante da facilidade que se tem hoje de fazer ligações para qualquer lugar. “O celular acabou com tudo, agora é tudo na palma da mão”, sorri, ao contar que não foi apenas o orelhão que se aposentou. “Aqui no poste tem essa caixinha que ficava o nosso telefone fixo da cooperativa. Ele também é outro que não funciona mais. Agora tudo é só celular”.

A aposentada Cleonice Lopes, 74 anos, tem saudades do celular fixo que mantinha em casa e que hoje, com o telefone celular, já nem usa mais. No passado, ela lembra que primeiro dependia dos orelhões para fazer e receber ligações, depois passou para o telefone fixo e, hoje, conta com o celular. “Quando eu não tinha linha em casa, as pessoas que precisavam falar ligavam para o orelhão que ficava perto de casa. Eu usava ele tanto para ligar, quanto para receber ligação de quem precisava falar comigo”, lembra. “Depois coloquei o fixo em casa e era bom porque, se a gente não tivesse em casa, pelo menos ficava o recado. Hoje a gente tem o celular, mas nem sempre a gente pode estar atender na rua”.

ORELHÕES

Brasil

Quantidade de aparelhos no país

Funcionam 24 horas: 73.130

Adaptados para cadeirantes: 6.256

Adaptados para deficientes auditivos e da fala: 4.586

Disponível: 61.291

Em manutenção: 48.182

Disponibilidade: 55.99%

Total: 109.473

Regiões

Quantidade de aparelhos por região

Sudeste – 47.823 aparelhos (80.21% em disponibilidade)

Nordeste – 30.521 (34.34% em disponibilidade)

Sul – 15.183 (37.31% em disponibilidade)

Centro-Oeste – 8.524 (51.34% em disponibilidade)

Norte – 7.422 (23.50% em disponibilidade)

Pará

Quantidade de aparelhos no estado

Funcionam 24 horas: 2.421 aparelhos

Adaptados para cadeirantes: 69

Adaptados para deficientes auditivos e da fala: 52

Disponível: 431

Em manutenção: 2.372

Disponibilidade: 15.38%

Total: 2.803

ORELHÕES EM FUNCIONAMENTO EM BELÉM

l Rodovia Augusto Montenegro, Mangueirão

l Avenida Nazaré, Nazaré

l Alameda Francisco Ribeiro, Umarizal

l Travessa São Francisco,

Batista Campos

l Rua Magalhães Barata, Centro – Distrito de Cotijuba

l Ilha do Maracujá, Centro – Povoado da Ilha do Maracujá

l Rua Principal, Centro – Ilha Grande

l Jussara, Centro- Povoado Jussara

Fonte: Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Dados atualizados em agosto de 2023.

Hoje, os orelhões só servem de “enfeite” nas ruas FOTOS: Wagner Santana
Cleonice passou dos orelhões para o celular
Os taxistas Carlos e Aroldo lembram do aparelho usado pelos clientes