Apesar de existirem garantias previstas no Estatuto do Idoso e no Código de Defesa do Consumidor, muitos idosos ainda encontram dificuldades para exercer seus direitos básicos. Isso acontece principalmente em áreas como atendimento prioritário, acesso à saúde, contratos bancários e serviços de telecomunicações.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população com 65 anos ou mais no Brasil já representa 10% do total, o que equivale a mais de 22 milhões de pessoas. Desde 2010, quando esse número era de aproximadamente 14 milhões e meio, essa faixa etária cresceu cerca de 57% ao longo de doze anos. Além disso, a população com 60 anos ou mais chegou a mais de 32 milhões, representando 15,6% da população. Em comparação com o Censo de 2010, esse grupo cresceu 56%, quando eram cerca de 20 milhões e meio (10,8%).
Com o envelhecimento acelerado da população brasileira, é importante informar e orientar as pessoas sobre os direitos da terceira idade e também cobrar que a lei seja cumprida. Pensando nisso, a reportagem conversou com a advogada especializada em direitos do consumidor, Kenia Soares, para entender quais são os principais direitos dos idosos, os problemas mais comuns que eles enfrentam e de que forma eles podem se proteger.
Kenia Soares explica que o Estatuto do Idoso, criado pela Lei nº 10.741/2003, garante vários direitos importantes para quem tem 60 anos ou mais. O objetivo é assegurar que essas pessoas tenham uma vida digna, segura e possam participar ativamente da sociedade.
Direitos garantidos
- Direito à Saúde:
Atendimento preferencial no Sistema Único de Saúde (SUS); acesso gratuito a medicamentos, próteses e tratamentos; Programas de prevenção e promoção da saúde do idoso. - Direito ao Transporte:
Gratuidade nos transportes públicos urbanos e semiurbanos; Em viagens interestaduais, duas vagas gratuitas por veículo e desconto de 50% nas demais; Assentos reservados e prioridade no embarque e desembarque. - Direito à Prioridade:
Atendimento prioritário em serviços públicos e privados (bancos, hospitais, etc.); Prioridade na tramitação de processos judiciais; Preferência em programas sociais e habitacionais do governo. - Direito à Liberdade e ao Respeito: Direito de ir e vir, de opinião e de crença; Respeito à dignidade, integridade física, psíquica e moral;
Proteção contra negligência, discriminação, violência e abuso. - Direito à Assistência Social:
Acesso a benefícios como o BPC-LOAS (um salário mínimo mensal para idosos sem renda e em situação de vulnerabilidade); Apoio à família e serviços de acolhimento, quando necessário. - Direito à Moradia:
Prioridade em programas de habitação popular; Adaptação das moradias às necessidades da idade. - Direito ao Trabalho e à Renda:
Proibição de discriminação por idade no ambiente de trabalho; Apoio à permanência ativa no mercado, conforme a capacidade do idoso. - Direito ao Lazer, Cultura e Educação: Acesso incentivado à leitura, cultura, cursos, atividades físicas e de lazer; Apoio à alfabetização e inclusão digital.
“Esses direitos têm como base a valorização do idoso como cidadão ativo, com autonomia, voz e proteção. Em caso de violação de direitos, denúncias podem ser feitas por meio do Disque 100, Ministério Público ou delegacias especializadas”, esclarece.
A advogada comenta quais são as situações mais frequentes de desrespeito aos direitos dos idosos que ela costuma perceber no dia a dia como profissional da área.
“No dia a dia como advogada, tenho percebido que muitas situações envolvendo os direitos dos idosos são marcadas por negligência, abusos financeiros e falta de informação sobre seus próprios direitos. Muitos idosos acabam sendo vítimas de empréstimos consignados que podem ser abusivos, muitas vezes feitos sem que eles entendam bem o que estão assinando ou até mesmo sem o seu consentimento. É comum também encontrarmos idosos que tiveram descontos indevidos nos benefícios do INSS e nem sabem o motivo disso”, explica.
Outro caso frequente que ela menciona é o abandono por parte da família, seja no aspecto afetivo ou material. “O Estatuto do Idoso estabelece que filhos e demais parentes têm a obrigação de cuidar dos pais na terceira idade. No entanto, infelizmente, ainda vemos muitos idosos vivendo em condições difíceis, isolados ou mesmo em instituições contra a sua vontade”, conta.
Kênia comenta que também são comuns casos de violência psicológica e física, muitas vezes acontecendo dentro do próprio lar, o que torna mais difícil para a vítima procurar ajuda. “Essas situações podem se manifestar por meio de humilhações, ameaças, agressões ou um controle excessivo sobre a vida do idoso”, explícita. Além disso, ela diz que muitos idosos ainda encontram dificuldades para acessar serviços essenciais, como filas em bancos, atendimentos médicos e transporte público, que deveriam ser acessíveis a eles com prioridade. “É muito importante que a sociedade esteja atenta a essas questões e ajude a garantir que os direitos dos idosos sejam respeitados”, pontua.
Soares explica que, quando um idoso se sente discriminado, negligenciado ou maltratado, ele tem tanto o direito e o dever de reagir, e a lei apoia essa atitude. O Estatuto do Idoso oferece proteção completa e recursos de denúncia justamente para enfrentar essas situações. Ela cita que as principais ações que ele pode tomar:
- Denunciar:
O idoso, ou qualquer pessoa que testemunhe uma situação de abuso, pode denunciar: Disque 100 – Central de Direitos Humanos do Governo Federal (funciona 24h, inclusive feriados); Delegacias comuns ou especializadas em atendimento à pessoa idosa (onde houver); Ministério Público – que atua na defesa dos direitos coletivos e individuais dos idosos; Conselhos Municipais ou Estaduais do Idoso; Defensoria Pública, se precisar de orientação jurídica gratuita. - Buscar apoio jurídico:
Se o idoso estiver sendo vítima de: Descontos indevidos em aposentadoria; Violência doméstica; Negligência familiar; Maus-tratos em instituições (como asilos); Ele pode procurar a Defensoria Pública ou um advogado de confiança para buscar reparação e proteção judicial. - Registrar Boletim de Ocorrência:
Em casos de violência física, abandono ou apropriação indevida de bens, o BO pode ser feito presencialmente ou, em muitos estados, online. - Exigir atendimento prioritário:
Se o direito à prioridade em serviços públicos ou privados for negado (em bancos, postos de saúde, transporte, etc.), o idoso pode reclamar no próprio local, registrar queixa no Procon ou procurar os órgãos citados acima. - Transporte Público Urbano (municipal ou intermunicipal dentro da mesma região)
Todo idoso a partir de 60 anos tem direito à gratuidade nos ônibus, metrôs, trens e demais meios de transporte coletivo urbano. Documentos exigidos: Documento oficial com foto que comprove a idade (RG, CNH, etc.);
Em alguns municípios, é necessário fazer um cadastro para obter um cartão do idoso (como o “Bilhete Único Especial”, em SP, ou o “Passe Fácil”, em outras cidades).
Importante:
Mesmo sem o cartão, o idoso não pode ser impedido de embarcar se apresentar o RG comprovando idade
- Transporte Interestadual (entre estados)
Idosos com 60 anos ou mais e com renda de até dois salários mínimos têm direito a: Duas passagens gratuitas por veículo (ônibus, trem ou barco); Após as duas vagas, desconto de no mínimo 50% no valor da passagem. Documentos exigidos: Documento com foto (RG, CNH, etc.); Comprovante de renda (Carteira de Trabalho, contracheque, extrato de pagamento do INSS ou declaração do próprio idoso);
É necessário solicitar a passagem com pelo menos 3 horas de antecedência e, se possível, com mais dias de antecedência, nas empresas que operam a linha.
A legislação brasileira garante aos idosos direitos específicos no atendimento à saúde e no acesso a medicamentos, muitos dos quais não são opcionais, mas obrigatórios por lei.
Serviços de saúde
Kênia explica que, segundo o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), as pessoas idosas têm prioridade no atendimento nos serviços de saúde, tanto públicos quanto privados. Elas têm direito a um cuidado completo com a saúde, que inclui ações de prevenção, promoção, proteção e recuperação. Além disso, os idosos têm prioridade para serem internados, realizarem cirurgias e exames, especialmente quando se trata de situações mais graves ou de urgência. “Deve ser atendido preferencialmente nas unidades do SUS e em programas de atenção domiciliar, quando for o caso”, disse.
Sobre o acesso a medicamentos gratuitos, Kênia diz que o idoso tem direito de receber esses remédios, principalmente para doenças que são mais comuns na terceira idade, através de um programa específico.