
Uma recente decisão judicial que determinou o pagamento de R$ 15 mil mensais da apresentadora Ana Hickmann ao ex-marido, Alexandre Correa, trouxe à tona um instituto ainda pouco conhecido, mas de grande relevância no Direito de Família: os alimentos compensatórios.
Apesar de frequentemente confundido com a pensão alimentícia tradicional, esse tipo de prestação possui finalidades distintas. Conforme explica a advogada paraense Kelly Garcia, os alimentos compensatórios “são valores pagos por um dos ex-cônjuges ao outro, com o objetivo de compensar o desequilíbrio financeiro decorrente da ruptura do casamento ou união estável. Eles não se destinam à subsistência, mas sim à manutenção do padrão de vida do cônjuge que ficou em desvantagem”.
Quando os alimentos compensatórios são cabíveis?
Segundo a especialista, os alimentos compensatórios são, em regra, concedidos em duas situações principais:
- Queda significativa do padrão de vida de um dos cônjuges após a separação;
- Administração exclusiva dos bens comuns por apenas um dos ex-cônjuges.
Além disso, uma situação recorrente que justifica a concessão é quando, durante a convivência, um dos cônjuges se dedicou exclusivamente à família — cuidando do lar e dos filhos — enquanto o outro investia em qualificação profissional e ascensão no mercado de trabalho. Nesses casos, o divórcio pode deixar aquele que se afastou da vida profissional em condição de desvantagem econômica, o que justifica a compensação.
Para que o pedido seja acolhido judicialmente, é necessário comprovar:
Desproporção financeira entre as partes após o divórcio;
Contribuição direta ou indireta para o sucesso profissional ou patrimonial do ex-cônjuge;
Duração significativa da relação conjugal, que normalmente gera vínculos de interdependência;
Dificuldade de reestruturação financeira por parte de quem pleiteia os alimentos compensatórios, especialmente quando ficou afastado do mercado de trabalho por anos.
“Importante destacar que os alimentos compensatórios podem ser concedidos independentemente do regime de bens adotado pelo casal ou mesmo nos casos de união estável”, ressalta Kelly Garcia.
O caso Ana Hickmann
De acordo com as informações veiculadas na imprensa já que o processo tramita em segredo de justiça, Alexandre Correa alegou ter contribuído significativamente para a carreira de Ana Hickmann e que, após o divórcio e o seu afastamento das empresas do casal (decorrente de medida protetiva deferida em favor da apresentadora), passou a enfrentar grave desequilíbrio financeiro. Em sede liminar, a Justiça arbitrou o pagamento de R$ 15 mil mensais até a partilha definitiva dos bens.
Decisão inédita no Pará: marco jurisprudencial
A advogada Kelly Garcia destaca que o Poder Judiciário do Estado do Pará também reconheceu, recentemente, o direito a alimentos compensatórios em um caso de dissolução de união estável com partilha de bens comuns, tramitado no Fórum Cível da Comarca de Belém.
“Obtivemos uma decisão inédita, proferida por juíza da vara cível, na qual foi arbitrado o pagamento de alimentos compensatórios em favor de minha cliente, até que se concretize a divisão patrimonial. A decisão não foi objeto de recurso pela parte contrária, o que reforça sua estabilidade e validade jurídica”, relata a advogada.
A decisão está em pleno alinhamento com a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reconhece o direito aos alimentos compensatórios como forma de mitigar o desequilíbrio econômico-financeiro após o término da relação conjugal, sempre que comprovados os requisitos legais.
Valor e duração: como são definidos?
Não há uma fórmula rígida para fixar o valor ou a duração dos alimentos compensatórios. Cada caso é analisado de forma individual, com base em critérios como:
Necessidade de quem pleiteia os alimentos;
Capacidade financeira de quem os paga;
Tempo de convivência conjugal;
E contexto socioeconômico que envolve a separação.
O objetivo é garantir o reequilíbrio patrimonial, com justiça e proporcionalidade.
E nos casos de infidelidade?
A infidelidade, embora possa ser considerada na análise da pensão alimentícia o STJ já decidiu que cônjuge infiel não tem direito a alimentos tradicionais, não afasta automaticamente o direito aos alimentos compensatórios. Isso porque estes têm caráter indenizatório, visando equilibrar a condição econômica entre os ex-parceiros, independentemente de culpa.
“Mesmo que um cônjuge tenha sido infiel, se ficar comprovado que houve contribuição para o sucesso do outro e que a separação resultou em desequilíbrio patrimonial, os alimentos compensatórios poderão ser devidos”, conclui Kelly Garcia.