Uma reunião mediada pelo Ministério Público Federal entre lideranças indígenas Warao que moram em Belém e a Fundação Papa João Paulo XXIII (Funpapa), entidade vinculada à prefeitura da capital paraense, realizada na última segunda-feira, 15, na sede do MPF no município, terminou com muitas queixas por parte dos indígenas, principalmente em relação às condições insalubres do abrigo situado no bairro do Tapanã que recebe os refugiados, e poucas soluções concretas por parte da entidade para resolver problemas tão urgentes – sob alegações que vão de questões burocráticas à falta de orçamento.
Freddy Cardona, que é liderança Warao e mora em Belém há vários anos, explicou durante a reunião que o abrigo municipal não tem mais condições de receber os membros da comunidade indígena. O espaço teria capacidade apenas para 100 ocupantes. “O banheiro é muito sujo e é usado por homens, mulheres, crianças, idosos. Precisamos de um espaço próprio, com autonomia, e precisamos ser consultados antes sobre para onde iremos. É nosso direito e exigimos respeito”, detalhou ele à reportagem do DIÁRIO.
A queixa maior tem a ver com o deslocamento de um grupo Warao recém-chegado de Parauapebas, no sul do estado, e que estava acampado na Praça da Bandeira. O representante da Funpapa presente à reunião no dia 15 contou que eles foram remanejados para o abrigo de forma conversada e consensual, enquanto que Freddy reclama que não houve diálogo com as lideranças.
“Nos foi dito que a Funpapa fez trabalho de articulação com aquele grupo Warao para levar para outro lugar, mas nós não sabíamos disso. O abrigo fica em frente ao cemitério do Tapanã, custa R$ 50 mil por mês de aluguel e não tem condições, está no limite. Precisamos ser consultados, porque nós temos a consulta na lei como indígena, queremos respeito sobre a construção, abrigamento”, complementou Cardona, que clamou ainda por atenção em saúde e educação, afirmando que os indígenas, até pela dificuldade com o idioma, acabam ignorados ou maltratados quando buscam algum tipo de apoio.
O procurador regional dos Direitos do Cidadão no Pará, Sadi Machado, entendeu que a situação demonstra falha da Funpapa em comunicar-se melhor com os Warao. Ele sugeriu que a Fundação amplie o diálogo com as lideranças em Belém detalhando melhor, por exemplo, quais são os fluxos de atendimento, acolhimento e acompanhamento oferecidos aos indígenas e evitando falhas de comunicação – seja via Comitê Municipal para Migrantes, Refugiados e Apátridas, criado para acolhimento deste público, seja via Conselho Warao Ojiduna, que conta com cerca de 30 conselheiros representantes de 12 comunidades e cerca de 800 indígenas Warao situados em Belém, Ananindeua, Benevides e Abaetetuba.
Machado alertou à equipe da Funpapa sobre a necessidade de que a tomada de decisão pelo poder público de qualquer medida que tenha impacto na vida dos Warao ocorra mediante Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) – obrigação do Estado brasileiro de perguntar, adequada e respeitosamente, aos povos indígenas sua posição sobre decisões administrativas e legislativas capazes de afetar suas vidas e seus direitos.
Por meio de nota, a Fundação Papa João XXIII (Funpapa) informou que todas as tratativas envolvendo os acolhidos do espaço institucional para indígenas venezuelanos da etnia Warao são dialogadas previamente com eles por meio de suas lideranças instituídas dentro do espaço e respeitadas pela coordenação e toda equipe técnica da fundação.
Sobre a mudança do grupo recém-chegado, relatou que a ida se deu de forma pacífica com a demonstração do grupo pelo acolhimento institucional após vários diálogos com a participação de servidores da Funpapa, líderes indígenas e representantes do sistema de garantia de direitos estiveram atuando em cooperação.
Sobre o abrigo, a informação passada pela Funpapa é que há um contrato vigente em processo de renovação para garantir espaço aos acolhidos, mas que a direção já dialoga internamente sobre uma possível mudança de espaço físico para melhor atender as necessidades que vêm sendo apresentadas. Na nota enviada não foram mencionados prazos ou datas para isso.
“(…) Para que isso ocorra, requer instrução do processo, localização e habilitação legal documental do novo local e prazo para tramitação, de acordo com a nova lei de licitação, além da viabilidade orçamentária”, justifica a Fundação.