Luiz Flávio
Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), apurada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo mostra que a proporção de brasileiros endividados teve novo recorde em março. O percentual de famílias que relataram ter dívidas a vencer alcançou 77,5% neste mês, a maior proporção já registrada nos 12 anos do levantamento. Há um ano, essa parcela era de 67,3%, 10,3 pontos percentuais abaixo do resultado atual. Em relação aos tipos de dívida, o cartão de crédito seguiu como destaque, representando 87% do total de dívidas das famílias no país.
O índice retornou ao maior percentual, com aumento de 0,5% em relação a fevereiro e de 6,7%. na comparação com março de 2021. Entre as famílias com ganhos acima de 10 salários mínimos, o uso do cartão de crédito apresentou o maior crescimento mensal, de 2,4%; e anual, de 8,1%, alcançando a proporção de 89,3% de famílias endividadas nessa faixa de rendimentos.
De acordo com a análise, os números apontam a tendência de alta do endividamento, apesar de os juros de mercado estarem mais elevados e encarecerem o crédito. Segundo dados recentes do Banco Central (Bacen), as taxas de juros médias nas linhas de crédito com recursos livres às pessoas físicas aumentaram de 39,4%, em janeiro de 2021, para 46,3%, em janeiro de 2022.
Na era da economia globalizada e das transações digitais, o cartão de crédito tornou-se uma ferramenta onipresente nas vidas financeiras dos consumidores. Qualquer pessoa com um celular na mão, consegue ter acesso a um cartão de crédito. A conveniência do uso do cartão de crédito é inegável, ele traz uma variedade de benefícios, desde programas de recompensas até facilidades de pagamento, o cartão de crédito se tornou um aliado indispensável para muitos.
No entanto, por trás dessa aparente praticidade, escondem-se armadilhas que podem levar os consumidores a um ciclo vicioso de endividamento e inadimplência. No mundo da psicologia econômica e do comportamento do consumidor, o cartão de crédito é um campo fértil para análise, podendo inclusive ser uma ferramenta prejudicial na vida financeira de quem não tem autocontrole.
“Pessoas sem autocontrole e consciência financeira acabam com altas dívidas, pois a facilidade no pagamento parcelado e a ilusão de dinheiro “fictício” levam os consumidores sem autocontrole, a tomarem decisões financeiras impulsivas, muitas vezes além de suas capacidades reais. O ato de deslizar o cartão ao invés de retirar o dinheiro da carteira, muitas vezes dissocia a sensação de gasto do impacto financeiro real, criando uma lacuna perigosa entre a percepção e a realidade financeira”, explica a economista Jaymara Tomiyoshi, especialista em planejamento financeiro pessoal e familiar.
Para se ter ideia do impacto negativo que o mau uso do cartão de crédito pode gerar, dados da Serasa mostram que em fevereiro de 2024, 29,37% da inadimplência registrada no Brasil era referente ao uso de cartão de crédito. “O pagamento do mínimo do cartão e a rolagem da dívida é um risco que merece atenção especial, as taxas de juros podem chegar até 28% ao mês, o que podia gerar uma bola de neve e um endividamento descontrolado”, alerta a especialista.
Recentemente a Lei nº 14.690, determinou que, a partir de 3 de janeiro de 2024, os juros e custos financeiros sobre a parte da fatura do cartão de crédito que não é paga ou parcelada com juros estão limitados a 100% do valor original que deixou de ser pago ou que foi parcelado. “Isso significa que, por exemplo, se você deixou de pagar R$1.000,00 ou parcelou com juros esse valor, os juros e outros custos do rotativo ou do parcelamento não poderão ser maiores que R$1.000,00. Em outras palavras é dizer que uma compra que custou R$1.000,00 pode chegar facilmente ao custo de R$2.000,00”, calcula a economista.
Ocorre que os cartões de crédito oferecem uma série de benefícios, incluindo programas de recompensas, proteção ao consumidor e a capacidade de realizar compras online de forma segura. E para aqueles que possuem dinheiro disponível e autocontrole é possível parcelar uma compra enquanto o dinheiro fica rendendo em uma aplicação financeira adequada.
“Diante desses desafios é crucial que os consumidores compreendam não apenas os benefícios, mas também as armadilhas do uso do cartão de crédito. A conscientização sobre os princípios de psicologia econômica e o comportamento do consumidor pode ajudar a evitar decisões financeiras prejudiciais e promover uma relação saudável com o dinheiro”.
Em resumo, o cartão de crédito é uma ferramenta poderosa que, quando utilizada com responsabilidade e conhecimento, pode proporcionar benefícios significativos. “No entanto, sem um entendimento adequado de seus riscos e limitações, pode se tornar uma fonte de estresse financeiro e dificuldades. Um planejador financeiro, pode te ajudar neste processo de autocontrole e desvendar os segredos do cartão de crédito, para você construir uma base sólida para uma vida financeira saudável e próspera”, aconselha Jaymara.
COMO EQUILIBRAR PLANEJAMENTO
É possível lidar com cartões de crédito sem cometer extremos e ter uma vida financeira equilibrada, tendo essa forma de pagamento como uma grande aliada no dia a dia. A palavra-chave é controle. A seguir veja algumas dicas para usar cartões de crédito com segurança a partir de orientações da Serasa:
Faça um planejamento financeiro
Organizar os gastos, sabendo o que é fixo e exclusivo do cartão de crédito, administrando os gastos que aparecem no cotidiano para não sobrecarregar a fatura do cartão.
Reduza o limite do cartão
Para não gastar mais do que o seu salário, o ideal é diminuir o limite para um valor que não comprometa toda sua renda para sempre fazer o pagamento integral da fatura. O limite do seu cartão não deve ultrapassar 30% do salário.
Pague o valor total da fatura
Não pagar o valor total da fatura obriga a entrada no rotativo do cartão de crédito que tem os juros mais altos, podendo chegar a 14% ao mês. Se reduzir o limite para um valor que pode ser pago, as chances de não se conseguir quitar o valor total da fatura é bem menor.
Controle o número de cartões
Impor limites é fundamental quando o assunto é cartão de crédito. O ideal é possuir, no máximo, dois cartões de bandeiras diferentes, favorecendo o controle para administrar a fatura e quanto se pode consumir em cada cartão. Uma dica importante é nunca pedir cartão de loja, onde juros são mais caros.
Defina data de vencimento próxima ao dia do salário
Colocar a data de vencimento do cartão de crédito para próximo da data de recebimento do salário evita possíveis atrasos e multas e favorece a organização para usar o dinheiro.