
A fila de espera por benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) voltou a subir na reta final de 2024 e encostou nos 2 milhões de requerimentos, o maior nível desde o início de 2020, no governo de Jair Bolsonaro (PL).
Dados divulgados pelo MPS (Ministério da Previdência Social) mostram que o número de pedidos em análise chegou a 1,985 milhão em novembro do ano passado, período mais recente disponível. O relatório de dezembro deve ser publicado nos próximos dias, segundo a pasta.
O boletim com informações sobre requerimentos e novas concessões de benefícios costuma ser divulgado em até 45 dias após o fim do mês de referência. Até o início desta semana, porém, o último documento disponível ainda era de setembro de 2024.
Especialistas de fora do governo têm ficado incomodados com a demora na publicação dos documentos e questionam se há, por trás disso, alguma tentativa do Executivo de protelar o reconhecimento de uma situação de piora na fila.
O MPS informou à reportagem que o atraso na divulgação “se deveu a inconsistências em dados enviados pela Dataprev”, mas não deu mais detalhes. Procurada, a Dataprev não se manifestou até a publicação deste texto.
O INSS foi procurado para comentar os dados e as ações para reverter a trajetória, mas não respondeu.
Embora represente uma fotografia do passado, a divulgação dos números ocorre em um momento de queda da popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que elencou a redução da fila do INSS como uma de suas promessas de campanha.
Pesquisa Datafolha divulgada na sexta-feira (14) mostra que a aprovação de Lula desabou em dois meses, de 35% para 24%, um patamar inédito para o petista em suas três passagens pelo Palácio do Planalto. A reprovação também é recorde, passando de 34% para 41%. Acham o governo regular 32%, ante 29% em dezembro passado, quando o Datafolha havia feito sua mais recente pesquisa sobre o tema.
A fila do INSS já havia interrompido a trajetória de queda em julho de 2024, voltando a subir sob o governo Lula. Entre julho e setembro, na esteira da greve de servidores do órgão, a alta havia sido de 445 mil requerimentos à espera de análise.
Em outubro e novembro, o estoque de pedidos se avolumou ainda mais. Em dois meses, o aumento foi de 186,2 mil.
Diante desse quadro, o tempo médio de concessão líquido (que desconta o tempo de espera por documentos do segurado) também subiu. De 34 dias em julho (menor valor dos últimos dois anos), o dado já havia escalado para 39 dias em setembro e se manteve neste patamar em novembro.
Essa média não é homogênea. Em algumas regiões, o tempo é menor, e em outras, bem maior. No Nordeste, por exemplo, o tempo médio de concessão líquido é de 66 dias.
Além dos efeitos da greve, integrantes do governo atribuem o crescimento da fila ao aumento no número de requerimentos, que tem exigido maiores esforços do Executivo para regularizar a situação.
Em 2024, cerca de 1,4 milhão de novos pedidos entram nos sistemas do INSS ao mês, bem acima da média de 2023, que estava abaixo de um milhão. Houve meses em que os novos pedidos ultrapassaram a marca de 1,6 milhão.
O governo tem feito um mapeamento de segurados que ingressam com pedidos de mais de um benefício ao mesmo tempo, ou recorrem de requerimentos indeferidos ao mesmo tempo em que fazem um novo pedido inicial para a mesma modalidade.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, o INSS vai rever regras operacionais e limitar a apresentação de requerimentos em algumas situações, numa tentativa de reverter essa escalada.
Segundo os dados de novembro, do total de pedidos, 1,6 milhão aguardam perícia médica ou análise administrativa do INSS. Outros 365,5 mil estão pendentes de algum documento a ser apresentado pelo segurado.
Na comparação com outubro, os pedidos que dependem de análise do órgão cresceram (eram 1,54 milhão), e os que aguardam informações do segurado caíram (eram 378,3 mil).
O governo Lula instituiu, em 2023, um bônus para servidores do INSS e peritos médicos federais para remunerar a análise extra de requerimentos uma prática que também já havia sido adotada em gestões anteriores. Em novembro do ano passado, o presidente editou uma MP (medida provisória) para prorrogar o programa, mas a data foi fixada em 31 de dezembro de 2024.
O crescimento da fila do INSS é um fator de preocupação para o governo não só pela percepção da população, mas também pela possibilidade de isso se traduzir em mais despesas no futuro.
Em 2024, as despesas com a Previdência Social terminaram o ano com R$ 29,9 bilhões a mais que o estimado inicialmente pelo governo na aprovação da LOA (Lei Orçamentária Anual).
Já no BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, o incremento foi de R$ 7,6 bilhões, segundo dados do Tesouro Nacional.
Juntas, as duas categorias tiveram um aumento de R$ 37,5 bilhões, o que representou um dos principais motivos por trás dos bloqueios nas demais despesas ao longo do ano passado.
Integrantes do governo Lula atribuíram parte do aumento dessas despesas justamente ao esforço de regularização da fila do INSS entre 2023 e o primeiro semestre de 2024. Por isso, o novo represamento pode ser indicativo de novas pressões no Orçamento no futuro.