Ana Laura Costa
O empreendedorismo na Amazônia que busca se conectar com as possibilidades por meio da bioeconomia, ajudam a destacar a importância da floresta em pé para superar desafios, reduzir dependências e agregar rentabilidade às comunidades locais com o uso da tecnologia.
Um bom exemplo disso é a startup ‘ParaOil’, fundada em 2019 no município do Acará, nordeste paraense, que atua na extração de óleos e manteigas naturais das sementes de andiroba, cupuaçu, pracaxi, babaçu, murumuru e açaí.
Com forte influência da cultura nipônica, a aquisição de manteigas e óleos vegetais, 100% puros e extravirgens, é fruto da parceria com comunidades locais, pequenos agricultores, além do incentivo e implantação de sistemas agroflorestais em áreas degradadas, que garante o fornecimento de matérias-primas de alta qualidade e origem controlada.
Nascida em uma família de pequenos agricultores, a ideia da startup surgiu a partir da necessidade de valorizar as comunidades locais que vivem de atividades agrícolas para a própria subsistência, explica Gilberto Nobumasa, CEO da startup e nissei (da segunda geração de família japonesa).
“Sentimos na pele a desvalorização dos produtos, como o cacau, que muitas vezes são vendidos para atravessadores que não pagam um valor justo, impedindo o desenvolvimento local. Meu avô também sempre buscou ajudar as comunidades locais, desde sua vinda ao Brasil em 1957. Ele sempre nos falava que precisávamos ser gratos por essa terra e ajudar o próximo. Temos uma riqueza imensurável nas mãos e precisamos usá-las para salvar vidas. Essa é nossa missão”, ressalta.
Partindo dessa premissa, valorizar os produtos da terra junto com os povos da Amazônia é o que move a startup. “Atualmente trabalhamos com quatro comunidades, sendo que cada uma tem em média 60 famílias. As comunidades têm papel fundamental na cadeia, pois são os guardiões da floresta, são as pessoas que mantêm a floresta em pé através da coleta sustentável das amêndoas oleaginosas”, reforça.
Nobumasa também explica que, a partir dos óleos extraídos, é possível produzir cremes para pele e cabelo, que trazem propriedades hidratantes, anti-inflamatórias e de rejuvenescimento. Segundo ele, as matérias-primas são fornecidas para empresas dos ramos de cosméticos e alimentos, que também ajudam nos projetos sociais, como é o caso do time de futebol local “Real Preserv”, onde atletas participam de atividades que promovem o reflorestamento em áreas degradadas.
“Atualmente temos 560 clientes, que são pequenas empresas de cosmética natural geridas em sua maioria por mulheres. Esse nicho de clientes nos permite potencializar todo o impacto positivos nas comunidades, pois muitas delas fazem questão de ajudar de alguma forma nos projetos sociais presentes nestas como, por exemplo, o grupo de jovens da comunidade Acará-Açu (@realpreserv) que fazem o reflorestamento de áreas e, em contrapartida, atuam no time de futebol local”, conta o empreendedor.
AMAPÁ
A partir do tratamento, que transforma a pele de peixe em couro para a produção de bolsas e acessórios de luxo, a startup Yara Couro, da CEO e fundadora amapaense Bruna Freitas, é inteiramente orientada a gerar emprego e renda para comunidades de pesca, frigoríficos e indígenas do Amapá. “Desenvolvemos uma tecnologia chamada “green leather” que faz o curtimento das peles com taninos 100% vegetais e livres de produtos tóxicos. Nossa ideia é conseguir gerar uma nova fonte de renda para essas comunidades e concentrar desenvolvimento para quem sobrevive da cadeia do pescado”, afirma.
Segundo a fundadora, auxiliar na gestão desses resíduos, evitando que rios e solos amazônicos sejam poluídos em regiões de cultura de pescado, é o propósito da marca além da rentabilidade local. “Temos a missão de desenvolver a Amazônia a partir de um produto que é a nossa cara e traduz nossa cultura”, ressalta.
Com sede no Amapá, a startup foi pré-acelerada em solo paraense pelo programa Amazônia UP 2022, do Centro de Empreendedorismo da Amazônia. A empresa trabalha com o fornecimento de peles de peixes de pescador com lamélulas de proteção da inserção da escama. O público alvo são indústrias de moda e revestimento.
“Priorizamos essas espécies que possuem grande volume de consumo e, por conseguinte, que têm grande geração de resíduo. Sabemos da nossa responsabilidade e por isso estamos muito comprometidos no desenvolvimento dessa solução para que ela seja pioneira e um exemplo da potência (e competência) amazônida no mundo inteiro”, destaca.
As parcerias também se destacam como a espinha dorsal do projeto, para que o trabalho desenvolvido pela marca alcance seu propósito humano e ambiental. Bruna Freitas frisa que a ‘Yara Couro’ é um projeto de muitas mãos, além disso reforça que não se faz um projeto de alto impacto sem investimento e a mobilização de parceiros essenciais na cadeia.
“Não teríamos evoluído tanto em tão pouco tempo se não tivéssemos parceiros tão comprometidos com a bioeconomia. Nosso projeto está sediado no Amapá, e tem parceiros por toda Amazônia, uma vez que esse é um projeto que diz muito sobre a região como um todo”, ressalta.
JORNADA
As duas startups fazem parte da ‘Jornada Amazônia’, uma iniciativa que visa o desenvolvimento de talentos e de empreendimentos de impacto socioambiental por meio da inovação. A iniciativa é executada pela Fundação CERTI e Instituto CERTI Amazônia e trabalha dois programas que apoiam negócios em momentos distintos. Um deles é o ‘Sinapse da Bioeconomia’, que transforma ideias inovadoras em negócios reais na região amazônica. O outro programa, ‘Sinergia’, já é voltado para os negócios em operação, com uma abordagem personalizada para cada empresa participante, visando fortalecer e potencializar o impacto positivo.
“O nosso papel é fomentar o ecossistema de inovação e negócios de impacto em toda a Amazônia Legal, visando aproximar atores para fortalecer ainda mais esses negócios. Um outro aspecto relevante da Jornada Amazônia é demonstrar que existem muitas oportunidades de empreender em bioeconomia, alinhando inovação, tecnologia e impacto positivo, de forma a que os negócios e empreendedores possam prosperar junto com a floresta em pé e que possam gerar renda e oportunidades”, afirma o coordenador de projetos na Fundação CERTI e na Jornada Amazônia, Victor Moreira.