Carol Menezes
Mesmo com todos os avanços relacionados aos vários tipos de tratamentos disponíveis, em estudo ou aprimoramento, poucos diagnósticos ainda causam tanto medo e insegurança como um diagnóstico de câncer – independente do estágio da doença, da idade do paciente. Ainda que o acompanhamento médico ocorra na rede pública de saúde, não são poucos os gastos paralelos, seja com medicações, alimentação, materiais de higiene, dentre outros, o que pode tornar tudo mais difícil e custoso, especialmente quando há necessidade de deslocamento do interior para a capital, situação extremamente comum de ser ver nos hospitais públicos de Belém considerados referência em oncologia.
Neste cenário acabam figurando como absolutamente indispensáveis as redes voluntárias de apoio aos pacientes – e seus familiares – que enfrentam a doença. Sejam pequenos grupos de pessoas, sejam organizações não governamentais (ONGs), essas frentes fazem uma enorme diferença no dia a dia de quem precisa lidar com uma rotina tão pesada, que pode durar meses, anos.
Além de acolhimento e palavras de conforto, momentos de descontração muitas vezes vêm exclusivamente do voluntariado a garantia das necessidades mínimas dos pacientes, como cestas básicas, roupas, kits de higiene e refeições diárias. Se levada em consideração a estimativa do Instituto Nacional de Câncer (Inca) para o triênio 2023-2025 de cerca de 704 mil novos casos no Brasil em cada um dos três anos, aí mesmo é que a importância dessas redes torna-se imensurável.
Entidade filantrópica das mais conhecidas e que desde 1999 presta assistência a quem realiza tratamento no Hospital Ophir Loyola, a Associação Voluntariado de Apoio à Oncologia (Avao) começou como um grupo de voluntárias que faziam visitas à enfermaria do HOL. Hoje atende diariamente, em sede própria, cerca de 140 pessoas com alimentação, oficinas e apoio social. A maioria delas mora no interior, tem condições financeiras precárias e pouco ou nenhum apoio familiar em Belém.
Atual presidente da Avao, Sandra Nascimento há 25 anos faz parte da Associação e conta ter aprendido ainda com a avó sobre a importância de ajudar os outros. Já tendo trabalhado na área da Saúde, ela integrou outras ações voluntárias antes.
“Minha vida é o voluntariado, eu amo o que faço. Vou de segunda a sexta para a Avao, saio realizada todos os dias por ter contribuído, mesmo que tão pouco, para uma associação tão fabulosa. Não sei expressar o que os pacientes sentem, mas posso dizer que eles nos dizem, chorando, que se não fosse a Avao, eles não sabem o que seria deles. Damos carinho, acolhemos, choramos juntos, nos preocupamos quando não aparecem. A gente aprende mais do que ajuda”, relata.
Voluntária também desde a criação da Avao, Ana Klautau presidiu a entidade por mais de 20 anos, deixando o cargo no ano passado. No mesmo ano em que a Avao foi criada ela acabou perdendo um filho em um acidente de trânsito, e a busca por um consolo, por algo que amenizasse o sofrimento, acabou levando-a a ajudar outras pessoas.
“Assim como para mim foi um chamado divino, a gente também vive à espera da ajuda daqueles que possuem vontade de ajudar quem necessita de apoio nesse momento tão difícil que é o tratamento contra o câncer. A Avao veio para amenizar minha dor, e faço isso cuidando de crianças e adultos junto de outros voluntários focados em doar seu melhor aos que precisam de tanta coisa, inclusive do sustento do dia a dia”, confirma.
Fundadores da ONG Grupo DOE, o casal Cristina Menezes e Elden Gomes perdeu, em 2014, o filho caçula Eike Menezes, de apenas quatro anos à época, para a Leucemia Linfóide Aguda (LLA) depois de um ano de tratamento no HOL. Durante toda a estadia da criança no hospital, os pais conheceram várias famílias do interior que, para acompanhar seus filhos em tratamento, enfrentavam todo tipo de dificuldade – falta de dinheiro, de lugar para ficar, de comida, de fraldas, etc.
“Fazia três meses que tínhamos perdido nosso filho, estávamos ainda em luto profundo, eu, meu marido, nossa filha mais velha, quando tive um sonho, e nesse sonho tinha uma mensagem de que eu deveria voltar ao Ophir Loyola para doar algumas coisas do Eike. Primeiro Elden disse que não queria de jeito nenhum, mas depois aceitou ir comigo. Quando passamos pelo setor de quimioterapia, encontrei amiguinhos e amiguinhas do Eike que fizeram tratamento com ele, e eles me chamaram, me abraçaram, disseram para eu não ficar triste, que o Eike estava bem. Eu saí dali fortalecida, decidida a fazer algo para ajudar aquelas crianças, aquelas mães”, conta Cristina.
Primeiro eles conseguiram aval para fazer visitas, momentos em que o casal se fantasiava de palhaço e promovia outras animações para os pequeninos em tratamento médico, além de levar doações diversas, uma palavra de esperança para os familiares. “Eu me dei conta de que esse foi o legado que meu filho deixou, foi o sentimento que ele deixou, e a gente conseguiu transformar dor em amor”, emociona-se a mãe. Não demorou para que os eventos fossem aumentando, e assim Elden e Cristina começaram a organizar celebrações de Páscoa, Natal e Dia das Crianças. Até conseguirem uma sede própria para a ONG Grupo DOE, o ponto de apoio era a própria casa deles, onde faziam reuniões e recebiam doações.
Na sede, que funciona em horário comercial de segunda a sábado nas imediações do HOL, são atendidas cerca de 300 crianças e adolescentes, que recebem café da manhã, almoço, lanche e podem descansar após administração de tratamento quimioterápico, além de apoio afetivo. Mensalmente eles recebem kits de cestas básicas e de higiene “Nossa filha mais velha hoje é voluntária, nos ajuda a conseguir doações, e a gente recebe tudo: mantimentos, cestas básicas, kits de higiene, proteínas, materiais de limpeza. Tem paciente que não tem onde ficar, porque vai para o HOL pelo carro do Tratamento Fora de Domicílio (TFD), e em vez de ficar ali pela frente do hospital, ou em uma praça próxima, vai lá para a casa tomar banho, almoçar, merendar. É como minha mulher disse: Deus transformou nossa dor em amor. Não é um projeto fácil, a gente sente saudade do nosso filho todos os dias, mas já são dez anos, o que prova que deu certo”, avalia Elden.
Fundada em 2014, a ONG Instituto Áster também dá assistência voluntária a crianças e adolescentes em tratamento contra o câncer. Dependente de doações, a entidade realiza eventos o ano inteiro para arrecadar todo tipo de ajuda, principalmente para composição de cestas básicas. “Quando a gente vê que o outro precisa da gente, a gente ergue as mangas e vai trabalhar. Eu sou do Instituto desde 2015 e, apesar de eu ser um dos coordenadores, aqui todo mundo é voluntário. A importância é extrema, né? A gente assiste famílias que dependem, tem somente o Áster como ajuda aqui em Belém. Noventa por cento das famílias são do interior. Naquele momento ali, que você mais precisa de alguém que lhe dê um apoio nós nos tornamos esse apoio”, finaliza Dênis Souza, que integra a coordenação do Áster.
Serviço:
– A Avao (instagram.com/avao_associacao
– A ONG Grupo DOE (instagram.com/ong.grupo.doe) fica na Trav. 14 de Abril, 1570, entre Gentil Bittencourt e Magalhães Barata. Atende pelo telefone 91-98386-9719 (o número também é pix e aceita doações e funciona de segunda a sábado, em horário comercial. Não possuem vinculação com nenhuma esfera de governo e se mantêm apenas de doações.
– O Instituto Áster funciona na Trav. Castelo Branco, 720, entre Magalhães Barata e Governador José Malcher. Aceita doações pela chave pix [email protected] e também pela conta no Mercado Pago de CNPJ 24.697.988/0001-58, banco 323, agência sem número, conta 4269341854-3 (conta de pagamento). O contato é 91-99164-7374 (Dênis Souza).