Pryscila Soares
Seja nos ambientes físico ou digital, o cenário das Eleições 2022 trouxe à tona uma acirrada disputa pela defesa de posicionamentos políticos e ideológicos. A chamada polarização evidenciou narrativas, que geraram uma visível divisão na sociedade, entre os grupos de esquerda e direita.
Com os ânimos exaltados, não há dúvidas de que os relacionamentos interpessoais foram testados. E há casos em que os conflitos avançaram para além do debate político, inclusive, afetando relações de amizade e com familiares.
Mas até que ponto um alto grau de envolvimento nesse debate pode ser prejudicial para as relações e para a saúde emocional dos indivíduos? Para o psicólogo, mestre em Saúde Pública e professor baiano, Tiago Jordão, a rivalidade entre os grupos não ocorre por uma simples opinião ou posicionamento declarados. Segundo ele, existe uma causa social, que levou ao acirramento entre os polos partidários do Brasil.
“Houve o surgimento de um fenômeno muito popular, que foi o bolsonarismo e o lulismo. São duas ideologias bem diferentes, que se tornaram adversárias sem nenhum ponto de conciliação. Os dois lados apelaram por questões de valores, que nem sempre estão ligados a condutas políticas, mas sim de comportamento dos sujeitos, questões ideológicas e religiosas, primeiramente pelo bolsonarismo e agora, nessa reta final, também com o lulismo”, disse.
“Os candidatos falaram pouquíssimo de economia. Por outro lado, se discutiu pautas comportamentais. Os dois alegando que são cristãos e a questão do patriotismo. Outros temas ficaram em segundo plano”, reforçou Jordão.
REFLEXÃO
De acordo com o psicólogo, naturalmente, as pessoas acabam se envolvendo emocionalmente com pautas comportamentais, o que pode levar aos conflitos. Contudo, para o especialista, se afastar ou até mesmo romper laços com pessoas próximas que pensam diferente pode ser prejudicial.
“A gente vive em sociedade nas nossas redes de relações. Precisamos dessas pessoas, com as quais convivemos no dia a dia, que se tornam importantes, que gostam de nós, de quem vamos lembrar na hora de compartilhar algum tipo de vitória ou até sentar para conversar. Se a gente corta essa relação, não conseguimos formar substitutos tão facilmente. Perder pessoas é o primeiro prejuízo”, pontuou.
Outro ponto que precisa ser observado, segundo o especialista, é o fato do período eleitoral ser um momento passageiro e a vida de cada um não se resume aos embates travados durante esse período.
“Eleição é um evento pontual e a sua vida não é apenas a luta que você empreendeu nesse período. Há coisas mais urgentes como o trabalho, família, saúde e obrigações. Tudo isso vai continuar acontecendo, independente se você está do lado que perdeu ou ganhou. Vale a pena refletir também que a política muda muito. O afastamento momentâneo pode ser útil, como forma de proteção para os envolvidos, agora rompimento hostil, brigas e afastamento definitivo não vão resolver. Na verdade, vai criar um problema novo”, ponderou.
Passado o período eleitoral, o país vai vivenciar outros momentos como a Copa do Mundo e, depois, as confraternizações e festas de final de ano. Por isso, o especialista explica que vale a pena fazer uma reflexão sobre a forma de lidar com as divergências políticas.
“Para resolver um conflito com alguém do seu convívio pode ser muito mais difícil do que para dois políticos adversários. O resultado das urnas precisa ser respeitado e a vida segue. Isso não significa que você não vai mais falar com as pessoas. Primeiro deixe a emoção baixar um pouco e talvez não valha a pena voltar a falar sobre política. Procure algo em comum que deve aproximar do outro”, orienta o psicólogo, ao falar sobre como retomar as relações pós-período eleitoral.