SINAIS DE ALERTA!

Sinais podem salvar a vida das mulheres

No Brasil, o “X” vermelho na palma da mão também virou símbolo de alerta, mas, segundo ela, ainda são mecanismos pouco difundidos.

Sinais que podem ser utilizados por mulheres em caso de violências.
Sinais que podem ser utilizados por mulheres em caso de violências. LUANA PETTINATE. Foto: Celso Rodrigues/ Diário do Pará.

Pará - Uma adolescente voltava da escola quando foi surpreendida por um homem desconhecido que passou a mão por suas costas e ombros, na BR-316, em Ananindeua. No meio da calçada, o pedido de ajuda quase imperceptível foi suficiente para salvá-la de uma ameaça de morte. Sem gritar, ela apenas articulou os lábios: “me ajuda, por favor, me ajuda”. A reação rápida de dois motociclistas, que entenderam o sinal, impediu que o pior acontecesse. 

O homem, oferecendo capinhas de celular enquanto ela caminhava de volta para casa ao sair na escola, pediu o celular dela, que foi entregue. Segundo a própria, após pedir ajuda, o assaltante percebeu e começou a beliscá-la mais forte. Foi aí que começaram as ameaças, inclusive de morte. O caso, registrado por câmeras de segurança, escancarou mais uma vez a urgência de se discutir os sinais silenciosos que mulheres utilizam – e podem utilizar – para pedir socorro, e a responsabilidade coletiva em reconhecer esses sinais e agir.

A advogada Gabrielle Maués, especialista em gênero e direito das mulheres, destaca que há iniciativas importantes, como o gesto de mostrar a palma da mão e fechar os dedos sobre o polegar – criado pela Canadian Women’s Foundation (Fundação de Mulheres Canadenses, em português) – ou o uso de um “drink-código” em bares para solicitar ajuda discretamente, pedindo um drink “x” no balcão. 

No Brasil, o “X” vermelho na palma da mão também virou símbolo de alerta, mas, segundo ela, ainda são mecanismos pouco difundidos. “A grande realidade é que esse gesto ainda é muito desconhecido. Algumas pessoas nunca ouviram falar. Infelizmente, ainda não são ferramentas que as pessoas usam com frequência para pedir ajuda”, afirma.

Gabrielle chama atenção para algo mais profundo: a normalização da violência contra a mulher. “Desde menina você já é educada para se defender de possíveis importunações sexuais na rua: ‘não anda com essa roupa, não anda nesse lugar, não anda essa hora’. Assim como somos treinadas, a sociedade também é moldada para dizer que é exagero, que ‘não é para tanto’. Tendem a culpabilizar as mulheres pelo que é sofrido”, pontua. Para ela, a violência não é um fato isolado, mas o reflexo da desigualdade de poder entre homens e mulheres.

Segundo a advogada, em situações de perigo, o ideal é que as pessoas ao redor estejam atentas e ajam com responsabilidade. “Em situações de emergência, é preciso acionar a polícia pelo 190, que são os profissionais treinados para isso. Mas também é fundamental que ambientes como shoppings, supermercados e bares se envolvam nessa rede de proteção, com equipes de apoio à mulher. A sociedade precisa deixar de tratar essas situações como ‘brigas de casal’ e naturalizar a violência”, completa.

Além da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), voltada à violência doméstica e familiar, a especialista lembra que o Brasil possui o crime de importunação sexual, tipificado pela Lei nº 13.718/2018, aplicável também a situações vividas nas ruas. Em vigor também está o protocolo “Não se Cale”, que obriga estabelecimentos a adotarem medidas de acolhimento e prevenção à violência contra mulheres.

SINAIS

Nas ruas de Belém, o desconhecimento dos sinais foi uma constante. Ester Costa, 52 anos, vigilante, afirmou nunca ter ouvido falar dos gestos silenciosos, mas destacou a sensação de alerta constante com a qual vive. “Nós mulheres passamos todos os dias por algum tipo de violência, seja física ou verbal. Eu sou muito atenta, já fui chamada de paranoica, mas é assim que eu sobrevivo. Infelizmente, eu não conhecia esse tipo de sinal. O único que conheço é o grito mesmo”, contou.

ESTER COSTA – VIGILANTE. Foto: Celso Rodrigues/ Diário do Pará.

Para Luana Silva, de 25 anos, estudante de engenharia da computação, é urgente que mais pessoas – especialmente os homens – conheçam esses códigos. “Conheço o gesto principalmente pelas redes sociais, mas nunca precisei usar. Já vi casos de pessoas que fizeram o sinal e não foram atendidas, porque as pessoas não sabiam o que aquilo significava. Se até em casos explícitos já ignoram, imagina em sinais silenciosos”, disse. Sobre os gestos, ela lembra: “o que mais vejo na internet é o da mão fechando sobre o polegar. Acho mais rápido do que o X na palma, que eu nem conhecia”.

Clara Cavalheiro, 20 anos, estudante de ciência da computação, lembra de uma discussão entre um casal presenciada recentemente por ela em um aeroporto. “O homem começou a jogar objetos no chão e ninguém fez nada. Só quando começaram a discutir de fato que os seguranças intervieram. Acho que a primeira ação já deveria ter sido o sinal de alerta. Muitas pessoas não ajudam por medo de também serem agredidas, mas vi alguns funcionários do local acolhendo a mulher depois”, relatou. Ela reconhece a importância de dar visibilidade a esses sinais. “Muitas mulheres nem sabem que existem. Eu mesma só conhecia o do X na mão”.

Sinais que podem ser utilizados por mulheres em caso de violências. CLARA CAVALHEIRO. Foto: Celso Rodrigues/ Diário do Pará.

Já para Júlio Oliveira, de 22 anos, estudante de engenharia biomédica, o conhecimento dos sinais serve como ferramenta objetiva para agir o quanto antes. “Eu já conhecia os dois sinais pela internet. Acho que é muito importante, porque assim você tem certeza de que pode intervir. Isso protege tanto a mulher quanto quem vai ajudá-la. Se tivesse mais pessoas do local, o ideal é mobilizar; porque a força coletiva é muito maior. Pedir ajuda e tentar intervir, se for possível”.

SERVIÇO

No Pará, o governo Estadual implementou, por meio de diversas Secretarias, o protocolo “Não se cale” como uma política pública para enfrentar a violência contra as mulheres em bares, restaurantes, casas noturnas e similares. Criado para regulamentar a Lei Estadual nº 9.238/2021 complementarmente às disposições do Decreto nº 3.643/2024, institui o protocolo as obrigações de bares e similares de adotar medidas para auxiliar as mulheres, independente de orientação sexual, que se sintam em situação de risco, nas dependências de estabelecimentos, no âmbito do Estado do Pará.

LEIS

• Lei Estadual nº 9.238/2021 – dispõe sobre a obrigação de bares e restaurantes e casas noturnas de adotar medidas de auxílio e segurança a mulher que se sinta em situação de risco em suas dependências.

• Decreto Estadual nº 3.643/2024 – regulamenta a obrigação de bares e restaurante e casas noturnas de adotar medidas de auxílio e segurança a mulher que se sinta em situação de risco em suas dependências.

• Portaria Conjunta Nº 18 de 04 de fevereiro de 2025 – SEMU/SEGUP/PROCON-SEJU/DPA-DAV- POLÍCIA CIVIL.

• Lei 14.786/2023 – Cria o Protocolo “Não é Não” para a prevenção ao constrangimento e a violência contra a mulher e para a proteção à vítima.

• Lei 11.340/2006 – cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

• Lei 13.718/2018 – Altera o decreto 2.848/1940 “Código penal” para tipificar os crimes de importunação sexual e divulgação de cena de estupro.

PEÇA AJUDA

As mulheres vítimas de violência, assédio, abuso ou importunação podem acionar a rede de proteção a qualquer momento, através dos seguintes contatos:

Polícia Militar: 190

SAMU: 192

Disque Denúncia: 181

Atendente Virtual do Disque Denúncia “Iara”: (91) 8115-9181

Delegacia Virtual: www.pc.pa.gov.br

e Central de Atendimento à Mulher: Ligue 180