Pará

Postagens "ostentação" de influenciadores turbinam jogos de azar

Operação da Polícia Civil investiga o papel de influenciadores digitais na divulgação de atividades econômicas ilegais, que fez muita gente perder dinheiro em apostas em programas como “jogo do tigrinho”
Operação da Polícia Civil investiga o papel de influenciadores digitais na divulgação de atividades econômicas ilegais, que fez muita gente perder dinheiro em apostas em programas como “jogo do tigrinho”

Carol Menezes

Após denúncias relacionadas ao envolvimento de influenciadores digitais em divulgação de jogos de azar, que inclusive resultaram na prisão de oito deles pela Polícia Civil do Estado do Pará (PCPA) na operação “Truque de mestre” durante a semana, diversas figurinhas conhecidas da internet ou saíram apagando publicações desse tipo de divulgação, temendo que sobrasse para eles, ou gravaram vídeos tentando justificar o que, de acordo com o Código Penal, é crime.

A PCPA iniciou há quatro meses as investigações que renderam 12 mandados de prisão – dos quais foram cumpridos oito até o momento, sendo que sete presos já foram liberados pela Justiça para responder em liberdade – e, de acordo com o delegado-geral da corporação, Walter Resende, é absolutamente diferencial o papel dos influenciadores para a expansão desse tipo de prática ilegal.

Ele começa explicando que sim, a atividade é ilícita por se enquadrar às moldagens do Artigo 50 da Lei das Contravenções Penais: “estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante o pagamento de entrada ou sem ele”, com pena inicial de prisão simples, de três meses a um ano, e multa. Ainda de acordo com a mesma legislação, são considerados jogos de azar aqueles cujos resultados, bons ou ruins, dependem exclusivamente da sorte.

“Nesta modalidade os jogos são virtuais, e normalmente quem ganha são os que promovem a pirâmide criminosa, até porque os resultados podem ser manipulados”, justifica o DG. “A engenharia criminosa está se difundindo em todo o país com apoio da atuação dos influenciadores, pessoas que conseguem, por meio de redes sociais, atrair muitos seguidores, milhares, centenas. Quem comete esse tipo de crime encontrou neste segmento de influência digital um canal muito rápido para captar vítimas no Brasil todo”, avalia a autoridade policial.

Cronograma

Segundo Resende, os influenciadores recebem valores/pagamentos conforme a captação das vítimas, que são induzidas justamente pelas postagens “ostentação” feitas pelos “influencers”.

“O influenciador posta foto e vídeo de carros, viagens e divulgam as plataformas dos jogos, inclusive eles postam fazendo o jogo e sempre ganhando. Isso incentiva o seguidor a fazer o mesmo, acreditando que ele também vai poder ter como bancar aqueles luxos. Aí diz ‘investi R$ 5 e ganhei R$ 400’, tudo no intento de captar. E quanto mais os influenciadores captam, mas eles ganham de quem banca todo esse esquema”, detalha.

As investigações mostraram à Polícia Civil que, inicialmente, o apostador chega a ganhar alguma coisa, principalmente se faz um investimento significativo. Só que já nas apostas seguintes começa a perder, e aí tem início um círculo vicioso sem volta.

“A pessoa ganha um pouco, mas aí o jogo é manipulado e então ela passa a perder, e devolve não só o que ganhou, mas passa a investir do próprio patrimônio para seguir naquela busca por dinheiro fácil. Temos caso de gente que perdeu todo o dinheiro que ia dar de entrada na casa própria, porque apostou achando que conseguiria mais dinheiro para dar uma entrada maior. De gente que está nas mãos de agiotas”, lamenta Walter Resende.

Polícia mira agora os ‘cabeças’

O delegado-geral acredita que na próxima fase de investigações da “Truque de mestre” conseguirá identificar os “cabeças” do esquema criminoso, e que em seu entendimento, não moram no Pará. “É uma engenharia de muitos desdobramentos, e vamos alcançá-la porque além do estelionato, tem ainda lavagem de dinheiro, ocultação de capital, associação criminosa complexa e grande”, antecipa. Resende não descarta a conexão desse tipo de esquema com crimes maiores, como tráfico de drogas e de armas.

O delegado-geral acredita que na próxima fase de investigações da “Truque de mestre” conseguirá identificar os “cabeças” do esquema criminoso, e que em seu entendimento, não moram no Pará.

Quando a esmola é muita…

Ele reconhece o papel decisivo das postagens dos influenciadores digitais na captação de novas vítimas, quase sempre atraídas pela promessa de dinheiro fácil. “Até por isso a vítima por vezes demora a perceber que caiu em um golpe”, relata. Fato curioso que o DG revela é que o excesso de exposição desses influenciadores nas redes sociais contribuiu enormemente não apenas para as investigações, mas também para, com os mandados de prisão expedidos, achar os citados.

“Para não cair nesse tipo de crime, as pessoas precisam entender, desconfiar que não existe fonte de dinheiro fácil. Dinheiro é algo que se obtém com trabalho honesto. É muito fácil vender sonhos, ilusões, mas na prática real é diferente”, orienta.