Pará

Pará tem aumento em casos de violência doméstica

Lançada neste sábado (25), iniciativa do Ministério das Mulheres integra as ações dos 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres
Foto: Paulo H. Carvalho/Agência Brasília
Lançada neste sábado (25), iniciativa do Ministério das Mulheres integra as ações dos 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres Foto: Paulo H. Carvalho/Agência Brasília

Luiz Flávio

Apesar da recorrência, os casos de feminicídio tiveram redução no Estado do Pará na ordem de 8%. Nos 10 primeiros meses de 2022 (janeiro a outubro) houve o registro de 48 casos, que caíram para 44 casos no mesmo período deste ano. Por outro lado, os casos de violência doméstica (lesão corporal), onde ocorrem boa parte dos feminicídios, aumentaram no período: foram 8.294 casos de janeiro a outubro de 2022, contra 9.135 ocorrências registradas neste ano até o mês passado, o que representa um aumento de cerca de 9% nas ocorrências.

Em todo o ano de 2022. foram computados 12.194 casos de violência doméstica. Os dados são da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup).

A violência contra a mulher, que ainda é muito subnotificada e acaba não entrando oficialmente para as estatísticas, ocorre tanto dentro como fora do lar, de diversas formas, passando pela ameaça verbal até chegar à morte violenta da vítima. Ainda segundo a secretaria, 30 mulheres, em média, procuraram a polícia diariamente para fazer uma denúncia de violência por lesão corporal nos 10 primeiros meses deste ano. A denúncia é fundamental para interromper esse ciclo de violência.

Levantamento do Tribunal de Justiça do Estado aponta que de janeiro a outubro de 2022 o poder judiciário estadual já havia concedido 12.982 medidas protetivas para mulheres em todo o Estado, número que subiu para 18.995 nos 10 primeiros meses deste ano, o que representa um aumento de 46,30%.

A agressão contra mulheres entrou novamente em debate quando a apresentadora Ana Hickmann foi agredida pelo marido, o empresário Alexandre Correa, na tarde do sábado (11), na casa do casal em Itu, no interior de São Paulo. O Boletim de Ocorrência feito pela apresentadora informa que ela conversava com o filho na cozinha quando o marido ouviu e não gostou do conteúdo. A discussão assustou o menino, que deixou o local. Alexandre teria empurrado Ana contra a parede e ameaçado dar cabeçadas.

Na tentativa de se desvencilhar do marido, a apresentadora buscou pegar o celular em cima da mesa para pedir a ajuda. O empresário fechou a porta da cozinha, atingindo o braço de Ana, que acabou trancando o marido para fora do cômodo e chamou a polícia.

Quando a Polícia Militar chegou, o empresário não estava mais em casa. A apresentadora negou medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha. Ana Hickmann procurou por conta própria o hospital e foi atendida por um ortopedista. O braço esquerdo foi imobilizado por uma contusão no cotovelo.

Debate voltou aos holofotes com o caso da apresentadora Ana Hickmann

Em Belém, ainda no final de semana passado, outro caso gerou repercussão: o jogador de futebol Douglas Santos do Amazonas Futebol Clube foi acusado de tentativa de feminicídio contra a cametaense Lígia Silva, que estava em capital para um treinamento profissional. A agressão teria ocorrido durante um encontro na residência de uma amiga de Lígia, onde o jogador, acompanhado de amigos, teria tentado paquerá-la. Ao recusar, a jovem foi agredida.

Douglas teria arrombado a porta do banheiro onde a vítima havia se trancado, e desferido golpes que resultaram na perda de parte do cabelo e uma unha da mão de Lígia, além de causar lesões graves na boca decorrente de socos. O jogador também a teria ameaçado de morte. A vítima registrou um boletim de ocorrência, passou por exames de corpo de delito e recebeu atendimento na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Cametá.

Outro caso de violência extrema contra a mulher foi registrado no município de Mãe do Rio, quando câmeras flagraram um homem desferindo vários chutes, socos e puxões de cabelo contra sua esposa, que estava sentada numa calçada, com um bebê no colo na noite do dia 10 de novembro. Sem reação, a vítima tenta apenas proteger a criança, que seria seu filho. O agressor ainda usa uma garrafa de vidro e um pedaço de pau para ameaçar a vítima. Ele foi preso em flagrante pelos crimes de lesão corporal dolosa e ameaça em contexto doméstico e familiar.

Em Ananindeua outro caso chocante: um homem tacou fogo no corpo da própria esposa, com quem vivia há 8 anos, atingindo com gravidade seu colo e braços. O caso está sendo investigado pela Delegacia Especializada Atendimento à Mulher do município.

A Segup informa que o Estado criou o sistema “Alerta Pará Mulher”, o aplicativo SOS Maria da Penha e o Programa Pró-Mulher Pará, aumentando as medidas de combate à violência contra a mulher. Houve ainda a entrega da Delegacia Especializada em Feminicídio e Outras Mortes Violentas contra Gênero (Defem) e a ampliação do atendimento para 24 horas de algumas unidades policiais no estado.

 

No Brasil, violência atinge 35 mulheres por minuto

A Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Pará (OAB-PA) atua institucionalmente na questão, integrando a rede estadual de enfrentamento. Nesse contexto, recentemente passou a compor a Câmara Técnica Interinstitucional da Secretaria Estadual das Mulheres, que possui como uma de suas competências elaborar as diretrizes para a realização do Pacto Estadual de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres.

Além disso, a Comissão das Mulheres Advogadas da ordem promove campanhas e palestras de conscientização sobre o tema, bem como fornece orientação sobre quais procedimentos podem ser adotados, realizando encaminhamento aos órgãos competentes e acompanhando a prestação dos serviços existentes.

“Recentemente o Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou levantamento do último semestre deste ano sobre feminicídio, homicídios femininos e estupros e estupros de vulnerável de meninas e mulheres. O anuário de julho do fórum apontou o aumento de todas as formas de violência contra a mulher no país em 2022”, destaca a advogada Gabrielle Maués, que integra a Comissão das Mulheres e Advogadas da OAB-PA,

Ela diz que a violência doméstica ainda é rotineira, alcançando 35 mulheres por minuto no Brasil, segundo o FBSP, se desdobrando em diversas formas. “A física e a sexual são as mais evidentes, pois tendem a deixar marcas, mas as demais formas, especialmente as que não têm natureza física, acabam sendo invisibilizadas”, diz.

É o caso da violência moral, que está relacionada às ofensas à imagem, à reputação da mulher, ou a acusação falsa de crimes; e também da violência psicológica, “que envolve condutas que perturbam a saúde psíquica da mulher ou impedem seu desenvolvimento emocional, como manter controle emocional e impedir o contato com familiares e amigos, por exemplo”, diz.

Gabrielle Maués lembra que as mulheres sofrem diversos tipos de violência FOTO: DIVULGAÇÃO

Há ainda a violência patrimonial, que guarda relação com atos de destruição ou inutilização de documentos pessoais, instrumentos de trabalho (um computador, por exemplo) “ou que prejudiquem ou impeçam a autonomia financeira da mulher, como se apropriar de seu salário”, explica.

Ela ressalta a importância de se ter conhecimento sobre o ciclo da violência, uma construção científica da psicóloga norte-americana Lenore Walker, que demonstra que a violência ocorre de forma cíclica, compreendo as fases de da tensão, da agressão e a chamada lua de mel.

“É difícil para a mulher se reconhecer na condição de vítima, por conta da manipulação emocional envolvida. Então, ter uma rede de apoio é fundamental. Isso é relevante porque é delicado colocar sobre a mulher a responsabilidade de evitar a violência. Precisamos falar sobre a mudança cultural e estrutural da sociedade, sobretudo a mudança do paradigma social de superioridade masculina em detrimento da submissão feminina. É crucial lidar com os homens, para que entendam seu papel nessas construções sociais”, detalha Gabrielle.

 

COMO DENUNCIAR ?

Para denunciar, em caso de agressão a uma mulher que está ocorrendo, de forma urgente, o número para denúncia é o 190. Se não for uma situação de emergência, número é o 180; além da Delegacia da Mulher (se não houver, qualquer delegacia), buscar o Ministério Público ou a Defensoria, bem como por meio de advogado particular.