
O anúncio da escolha do americano Robert Francis Prevost, de 69 anos, como sucessor do papa Francisco, pegou muitos de surpresa. Por não constar na lista dos ditos “favoritos” ao posto, por ser o primeiro pontífice nascido nos Estados Unidos (EUA) – embora tenha uma atuação marcante na América Latina, a ponto de ter cidadania peruana -, dentre outras peculiaridades, agora são muitas as expectativas para uma liderança da igreja católica que começa com uma postura indicando que Leão XIV, nome escolhido por ele para exercer o papado, pretende seguir uma linha semelhante a do argentino falecido em 21 de abril.
José Antonio Mangoni, professor do curso de Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará (Uepa) avalia que esta eleição ganhou um aspecto de maior relevância devido ao contexto interno e externo à Igreja Católica.
“Internamente muitos problemas vieram à tona: pedofilia, corrupção no banco Ambrosiano, diminuição de fiéis, em particular na América Latina, e um crescimento de grupos, movimentos internos à igreja de tendência reacionária, moralista e excludente, apoiando inclusive grupos autoritários no campo da política. Para fora, temos uma sociedade global, fragmentada, que dá origem a movimentos intolerantes, violentos, voltados a fazer crescer o autoritarismo. Talvez a palavra polarização possa ajudar a compreender isso”, analisa o estudioso.
Leão XIV é visto como reformista e com opções muito próximas do papa Francisco: compromisso com os pobres, com os migrantes. Como pertencente à Congregação dos Agostinianos, tem seis valores fundamentais: interioridade, verdade, liberdade, amizade, comunidade e justiça solidária. E um outro detalhe pode ajudar a entender o tipo de papa que quer ser.
Segundo Mangoni, o nome escolhido pelos papas revela suas primeiras intenções enquanto governante da Igreja, pois simbolicamente diz que seguirá a trajetória de quem escolheu por nome.
Problemáticas sociais como inspiração
Neste contexto, vale rememorar que Leão XIII foi um papa que governou a Igreja Católica entre 1878 e 1903. Um período turbulento na Europa devido à revolução industrial, a miséria crescente, pobreza e a consequente imigração de milhares de europeus, inclusive para o Brasil. Um período também de intensos conflitos. Dialogou com Alemanha, França, Suíça, Prussia. Renovou o diálogo com não católicos e manifestou muito respeito pelas tradições orientais.
Suas Encíclicas – cartas papais, documentos oficiais do Papa destinados a toda a Igreja Católica, com o objetivo de orientar sobre questões de doutrina, moral ou disciplina – despertaram interesse universal, por tocar em problemas sociais. “Em maio de 1888, em uma Encíclica dirigida de modo particular aos Bispos do Brasil, pede a abolição da escravidão”, relata o professor.
Em 1891, com a Encíclica Rerum Novarum (das coisas novas), inaugura a “Doutrina Social da Igreja”. Nela, denuncia a concentração de capital e os excessos do capitalismo, e apoia os trabalhadores que exigem salários mais justos.
Manifestou interesse pelo progresso da ciência, o que de certa maneira foi cimentando o Concílio Vaticano II, de 1962, e convocado pelo então papa João Paulo XXIII, que tomaria a decisão de renovação e de diálogo com a sociedade moderna.
“Olhando Leão XIII e os desafios de seu tempo, e olhando para Leão XIV, percebe-se essa proximidade de contextos. E a forma com que Leão XIII respondeu aos desafios de seu tempo talvez encontre em Leão XIV eco diante dos atuais desafios”, sugere Mangoni.