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Mudanças climáticas podem aumentar a fome no mundo

Especialistas debateram formas de mitigar os problemas relacionados entre o clima e a pobreza extrema no mundo para proteger populações vulneráveis. Saiba como esse assunto deve ser tratado na COP 30

Mudanças climáticas podem aumentar a fome no mundo

Dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) alertam que uma em cada 11 pessoas podem ter passado fome no mundo somente no ano de 2023 e esse cenário pode ser ainda mais grave se considerada a intensificação dos efeitos das mudanças climáticas e o aumento da ocorrência de eventos extremos em diferentes partes do globo.

A relação entre a fome, a extrema pobreza e as mudanças climáticas foi tema de discussões do painel “Como potencializar o enfrentamento conjunto das mudanças climáticas, da fome e da pobreza?”, organizado pelo Governo Federal, em parceria com o Instituto Clima e Sociedade (iCS) e com o Instituto Ibirapitanga. O evento “Perspectivas de ação climática para a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza”, realizado há duas semanas, no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, reuniu representantes da sociedade civil, da academia, de instituições financeiras, além do próprio Governo, para discutir maneiras de unir esforços para combater tais problemas.

Uma das participantes do painel, a secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Ana Toni, destacou que já está muito claro que a mudança do clima é o maior acelerador de pobreza, de desigualdade e de insegurança alimentar e que, portanto, é necessário tratar os temas de forma transversal. “Teve um momento no mundo que a gente ainda tinha aquela percepção de que havia a segurança alimentar de um lado e clima do outro, mas agora a gente entende que esses temas estão muito juntos e um é causa e efeito do outro”, avaliou. “Por isso, combater a mudança climática é um tema transversal dentro do Governo”.

Citando as cheias registradas no Rio Grande do Sul, quase ao mesmo tempo em que se observa a ocorrência de incêndios em diferentes pontos do país e de seca na Amazônia, a secretária destacou que quem está na linha de frente dessas consequências é a população mais vulnerabilizada. “Não é que a mudança do clima vai, no futuro, comprometer a insegurança alimentar, ela já está comprometendo”, ressaltando o papel que o Brasil precisa ter diante deste cenário. “Nós temos uma COP 30 chegando e é determinação do presidente Lula que a gente lidere pelo exemplo, o que significa fazer o nosso dever de casa tanto em mitigação, quanto em adaptação”.

Dentro da perspectiva do protagonismo que o Brasil pode ter na agenda climática, a presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Elisabetta Recine, destacou o papel fundamental que a participação social apresenta, assim como a articulação das ações. “Nenhum dos problemas contemporâneos atuais pode ser resolvido com uma boa ação ou com uma excelente ação. Nós precisamos de articulação, nós precisamos de coordenação e essa coordenação se dá a nível técnico, se dá a nível político e, principalmente, se dá a nível da governança da segurança alimentar mundial ou da governança dos sistemas alimentares”, considerou.

“E essa governança precisa ter transversalmente a legitimidade da participação social porque é quem realmente tem soluções aos problemas que nós enfrentamos hoje. As transformações precisam ser a partir dessa força, a força de quem sofre os problemas, de quem vive cotidianamente as piores consequências das desigualdades da fome e da crise climática. São essas comunidades, são esses grupos que têm as verdadeiras soluções”.

A participação da sociedade civil também foi destacada pelo secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, embaixador André Corrêa do Lago. Na perspectiva internacional, ele considera que os olhos do mundo estão voltados para o Brasil tanto em decorrência da Presidência do G20, quanto também da COP 30, e que, portanto, o Governo brasileiro está atento a ouvir o que a sociedade civil tem a dizer.

Segundo o embaixador, dentro da COP 30 e do Acordo de Paris, a questão da agricultura está inserida sempre num contexto de segurança alimentar pela vulnerabilidade da agricultura à mudança do clima. “O Brasil não pensa em combate de mudanças do clima sem levar em consideração a dimensão social, sem levar em consideração a dimensão da fome e da pobreza, tanto no G20, como será também na COP 30”.

Entre os assuntos ligados ao tema que são importantes de se trabalhar para a COP 30, o embaixador destacou a necessidade de desenvolver ainda mais a ciência de contabilidade e monitoramento das emissões ligadas ao uso do solo e outras emissões ligadas à cadeia agroalimentar; além da necessidade de se ter cada vez mais artigos e trabalhos que apresentem uma perspectiva a partir do mundo tropical. “Nós já temos uma mega agricultura e um potencial de ser ainda maior, então, nós temos que contribuir significativamente para isso”.

Além deste, outro painel realizado durante a programação teve como objetivo discutir os caminhos, instrumentos e soluções financeiras para viabilizar as iniciativas de combate à fome e à pobreza. Responsável por fazer a mediação das mesas, a diretora executiva do iCS, Maria Netto, reforçou a necessidade de se tratar a agenda do combate à fome e à pobreza, além do combate às mudanças climáticas, de maneira transversal e contando com a participação de diferentes atores. “Do lado do iCS eu quero deixar o compromisso muito importante que a gente tem com todo o nosso ecossistema de donatários para continuar trabalhando nessa agenda e também de trabalhar em comum acordo com sociedade civil, mas também com os bancos, com outras filantropias, com a academia e também com o Governo e o setor privado. Como a gente falou, não dá para tratar esse tema de forma muito isolada e a gente está aqui para isso”.

Também participaram da programação a Secretária Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Lilian Rahal; o Coordenador-geral de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério das Relações Exteriores e co-coordenador da Força-Tarefa do G20 para a criação da Aliança Global, Saulo Ceolin; a Diretora Socioambiental do BNDES, Tereza Campello; o Diretor-presidente do Instituto Ibirapitanga e membro da Global Alliance for the Future of Food, Andre Degenszajn; o Diretor de Engajamento Global, Parcerias e Mobilização de Recursos do International Fund for Agricultural Development, Ron Hartman; e o professor titular da Cátedra Josué de Castro da Faculdade de Saúde Pública da USP, Ricardo Abramovay.