GUARDIÕES

Mucuras e roedores: Os heróis invisíveis da floresta

Pesando poucas gramas, os pequenos mamíferos não voadores presentes na floresta amazônica podem até passar despercebidos.

Pesando poucas gramas, os pequenos mamíferos não voadores presentes na floresta amazônica podem até passar despercebidos,
Pesando poucas gramas, os pequenos mamíferos não voadores presentes na floresta amazônica podem até passar despercebidos. Foto: Divulgação

Pesando poucas gramas, os pequenos mamíferos não voadores presentes na floresta amazônica podem até passar despercebidos, mas os efeitos dos serviços ambientais prestados por eles não. Fundamentais para a conservação da Amazônia, contribuindo diretamente para sua preservação e regeneração natural, as mucuras e pequenos roedores são verdadeiros guardiões da floresta.

A atuação desses animais para a manutenção do equilíbrio ecológico na Amazônia brasileira foi o foco da tese de doutorado apresentada pela pesquisadora Simone Almeida ao Programa de Pós-Graduação em Ecologia (PPGECO), da Universidade Federal do Pará (UFPA). Intitulada ‘Ecologia e Conservação de Pequenos Mamíferos Não Voadores da Amazônia Brasileira’, a tese buscou identificar não apenas como esses animais atuam, como também onde eles estão localizados dentro da Amazônia brasileira e a importância deles para o equilíbrio ecológico.

A autora da tese, Simone Almeida, explica que os pequenos mamíferos não voadores são animais de até 1 kg, como é o caso dos marsupiais popularmente conhecidos como ‘mucuras’ e de alguns roedores silvestres. “Esses animais são extremamente importantes para a composição da fauna e da flora porque algumas espécies são predadoras e dispersoras de sementes; outras espécies servem de alimento para espécies maiores, tanto de mamíferos, como outros animais; eles também fazem o controle sobre pragas, sobre bichos que estão superpopulosos em determinada região dentro do ecossistema e eles vão lá e se alimentam desses bichos, então, eles fazem um controle totalmente biológico dentro da floresta, principalmente de vertebrados e pequenos invertebrados”.

Para entender a atuação deles na floresta, a autora explica que a pesquisa se dedicou, inicialmente, a fazer um compilado de tudo o que estava sendo estudado, analisado e pesquisado sobre esses indivíduos. E o que se observou é que muitos trabalhos realizados sobre eles, hoje, não são voltados para a Amazônia, mas em grande parte para o Sul e Sudeste do país.

mucuras e pequenos roedores são verdadeiros guardiões da floresta.
As mucuras e pequenos roedores são verdadeiros guardiões da floresta.

Já em um segundo momento da pesquisa, Simone buscou fazer uma modelagem de distribuição de espécies, quando foi possível gerar mapas para saber como essas espécies estão distribuídas dentro da Amazônia brasileira. “A gente observou que a maior concentração dessas espécies está dentro do Arco de Desmatamento, que é uma área que vem sendo há muitos anos devastada por causa da agricultura e esses ambientes estão perdendo área principalmente por causa da soja e da exploração ilegal de madeira. Então, a gente queria entender por que esses animais estão distribuídos lá?”, explica.

“Foi quando a gente descobriu que lá estão as maiores áreas prioritárias para conservação de espécies. As maiores áreas de conservação dentro da Amazônia brasileira estão nesses ambientes. Então, a gente queria prever qual eram as áreas prioritárias para conservação e também dizer que as terras indígenas são de suma importância para salvaguardar essas espécies porque as unidades de conservação, por si só, não conseguem manter a biodiversidade dentro da Amazônia”.

Roedores e a descoberta de novas espécies

No que se refere aos marsupiais, por exemplo, a pesquisadora aponta que existe um volume considerável de estudos sobre eles, porém, o mesmo não ocorre com os roedores. Exatamente por isso, quando se vai a campo fazer uma pesquisa sobre a presença desses animais, não é raro identificar novas espécies ainda não conhecidas.

“Os roedores são um grupo muito crítico porque muitas espécies são muito parecidas e a gente só consegue identificar, a nível de espécie, quando a gente faz um trabalho com morfologia, com análise do crânio, análise da dentição, porque as espécies são muito próximas. Então, todas as vezes que a gente vai fazer um trabalho de campo, a gente sempre descobre uma espécie nova. Então, pouco se sabe sobre as espécies e a gente deveria conhecer mais esses animais porque esses bichos são extremamente importantes”.

A relação entre mucuras, chuvas e a população urbana

É na época mais chuvosa na Amazônia, por exemplo, que esses bichos estão em reprodução. Isso faz com que eles acabam se deslocando muito, principalmente as mucuras. Por isso que, nesta época do ano, não é incomum avistar mucuras andando pelas cidades, carregando os filhotes e até mesmo mexendo em lixo. Apesar desses animais também contribuírem com o controle biológico até mesmo nas cidades, a falta de conhecimento e informação sobre eles acaba fazendo com que, muitas vezes, eles sejam mortos pelo homem.

“Com medo e não conhecendo o animal, as pessoas acabam matando o bicho, fazendo atrocidades. Então, as pessoas deveriam conhecer melhor esses animais porque eles fazem o controle biológico até dentro da área urbana, eles se alimentam de baratas, escorpiões. Imagina um bicho que consegue suportar até mesmo a dor da picada de um escorpião? Então, eles fazem controle biológico até mesmo dentro da área urbana e as pessoas não dão o devido valor a esses animais”, explica Simone. “Ao ver um bicho desses, as pessoas não devem matar. O que elas podem fazer é chamar o órgão ambiental ou tentar afugentar que ele simplesmente vai embora. Ele não vai te morder quando você passar, ele não é um bicho agressivo”.