A HISTÓRIA DO PRÉDIO ICÔNICO

Manoel Pinto da Silva: A história vivenciada entre corredores, terraços e janelas

Apesar de toda a mudança ocorrida no cenário urbano da cidade desde então, o Manoel Pinto segue emblemático e abriga dezenas de moradores que guardam muitas histórias.

O Manoel Pinto da Silva não é apenas o prédio mais conhecido e um dos mais antigos de Belém, mas o local onde os moradores aproveitam o privilégio de estar alí, além de ser um lugar de encontro e lembranças  Foto: Irene Almeida/Diário do Pará.
O Manoel Pinto da Silva não é apenas o prédio mais conhecido e um dos mais antigos de Belém, mas o local onde os moradores aproveitam o privilégio de estar alí, além de ser um lugar de encontro e lembranças Foto: Irene Almeida/Diário do Pará.

A partir da década de 1940, Belém começa a vivenciar uma intensificação do processo de verticalização, fazendo com que a cidade passasse a ter o seu cenário modificado pela construção dos chamados arranha-céus.

Dentre os edifícios que surgiram na cidade naquele período, um em especial, inaugurado na década de 50, fez história por ter sido por muitos anos o prédio mais alto de toda a Amazônia, o Edifício Manoel Pinto da Silva. Apesar de toda a mudança ocorrida no cenário urbano da cidade desde então, o Manoel Pinto segue emblemático e abriga dezenas de moradores que guardam muitas histórias.

As memórias da fotógrafa Tereza Maciel com o edifício foram cultivadas ao longo dos 30 anos que ela morou no prédio. Hoje, mesmo já não morando no local, permanecem nela as lembranças. “Como moradora do Manoel Pinto, eu posso te dizer que eu tenho memórias afetivas maravilhosas pelos corredores do prédio, brincadeiras de boneca, brincadeiras de elástico. O Manoel Pinto, naquela altura, era como se fosse uma vila porque eu cresci com amigos que fiz no prédio, nós íamos e voltávamos do colégio andando juntos, eu sempre mantive relações de amizade com os funcionários do prédio, que são pessoas que trabalharam a vida toda lá”, recorda.

Foi apenas mais tarde, já na adolescência, que Tereza foi tomando consciência do quanto a arquitetura, a estrutura e a própria existência do Manoel Pinto eram importantes para a cidade de Belém. “Ele foi o primeiro arranha-céu da Amazônia, então, eu fiquei durante muito tempo muito encantada com o fato de morar no Manoel Pinto, de conhecer aqueles corredores, os seus ângulos, de conhecer suas histórias, até suas histórias trágicas”.

“Na faculdade foi quando eu percebia as pessoas mais curiosas em relação ao Manoel Pinto. Me perguntavam se eu via assombração, fantasma, tinha muito essa curiosidade do fantasmagórico, das lendas urbanas”, lembra. “A curiosidade girava em torno disso, mas o fato de eu ter morado lá, engraçado, não significa exatamente que eu entrei em contato com essas histórias mais do imaginário do terror e do fantástico. As minhas histórias são muito permeadas pela poesia do papel picado que nós jogávamos na imagem de Nossa Senhora de Nazaré no Círio, pela poesia das risadas enquanto crianças que brincavam no corredor”.

A descoberta da Isabela Canto e de sua família com o Manoel Pinto da Silva se deu já na fase adulta, em meados de 2018. Ela conta que o pai procurava um local em que pudesse assistir a passagem do Círio de Nazaré e, dessa vontade, Isabela acabou fundando um café que hoje possibilita que outras pessoas matem a curiosidade de estar dentro de um apartamento, o Canto Café. “A gente chegou aqui porque o meu pai é muito devoto de Nossa Senhora de Nazaré. Eles tinham em mente uma outra casa aqui pela avenida Nazaré, mas quando eles viram o anúncio de que esse apartamento estava para vender, era a família do Manoel Pinto que estava vendendo”, conta Isabela, ao explicar que o apartamento onde está instalado o seu empreendimento foi simplesmente a moradia do personagem histórico que dá nome ao edifício até hoje.

À época, Isabela conta que morava em Portugal há cinco anos, mas retornou a Belém para participar do Círio pela primeira vez. Foi naquele Círio que ela decidiu ficar. “Na época, em 2018, o meu pai ia fazer a empresa dele aqui e eu pensei em ficar em Belém com a ideia de que esse espaço tinha que ser aberto ao público. Aqui no Canto a gente fez questão de manter alguns elementos originais. Por exemplo, esse painel do Raio que o Parta é todo original dos anos 60 e 70, e é um símbolo do modernismo amazônico, assim como o Manoel Pinto como um todo é um símbolo do modernismo”.

A descoberta da Isabela Canto e de sua família com o Manoel Pinto da Silva se deu já na fase adulta, em meados de 2018.. Foto: Irene Almeida/Diário do Pará.

Em funcionamento desde 2019, logo de início o café recebeu visitantes interessados não somente em degustar os itens comercializados, mas também em se alimentar da história que o prédio detém. “Logo quando a gente abriu aqui, a gente recebeu uma professora de arquitetura que tinha feito toda a planta desse apartamento sem nunca ter entrado nele. Então, foi muito emocionante. Ela veio aqui e trouxe os alunos dela para mostrar que tinha dado tudo certo”, lembra.

“Eu já recebi pessoas que diziam que eram amigas da família do Manoel Pinto, que um dos filhos dele era professor de Direito e vinham para cá estudar, uma pessoa dizia que vinha brincar com uma coleguinha que morava aqui. O Canto está aberto para isso também, é um espaço que todo mundo pode entrar e conhecer esse ponto de Belém que está bem no meio de tudo. É onde o Círio passa, o Theatro da Paz está aqui, o Olympia, a própria Praça da República. Então, a gente está bem no meio de tudo”.

Luiz Affonso Aires, 32 anos, engenheiro agrônomo e Lucas Ramos, 29 anos, gerente comercial. Foto: Irene Almeida/Diário do Pará.

A bela vista do centenário Theatro da Paz é a primeira coisa que chama a atenção quando se entra na casa do engenheiro agrônomo Luiz Affonso Aires, 32 anos, e do gerente comercial Lucas Ramos, 29 anos. Há cinco meses o casal tem como endereço o Manoel Pinto da Silva e dentre os fatores que foram decisivos para que eles mudassem para lá foi, sem dúvidas, a vista privilegiada que o apartamento proporciona da cidade. “Na hora que eu entrei na porta e vi a vista, eu falei ‘é aqui’”, lembra Luiz Affonso.

A história que envolve a mudança para o prédio icônico de Belém iniciou quase por acaso, quando Lucas decidiu fazer uma pesquisa na internet. “A gente nem planejou se mudar para cá. A gente morava, antes, lá no Marex e a gente fazia academia no shopping e um dia a gente acordou e a academia tinha saído do aplicativo que a gente usava e não tinha nenhuma outra no entorno de onde a gente morava”, conta Luiz Affonso. “A gente entrou no carro de aplicativo e, no caminho, o meu namorado perguntou: “quer se mudar?”. Ele entrou na internet e viu que tinha um apartamento no Manoel Pinto”.

Foto: Irene Almeida/Diário do Pará.

Mesmo que a mudança tenha sido inesperada, os cinco meses morando no prédio e apreciando a vista privilegiada já fazem o casal não querer mais mudar de endereço. “Ele está em um ponto estratégico da cidade, está aos pés do Theatro da Paz, aos pés da Baía, a gente tem essa vista que é permanente porque não vai ter outra construção aqui no lugar do Theatro. Além da representatividade histórica”, considera Lucas Ramos. “A gente olha para a sacada e vê a chuva chegando, a gente vê o sol se pondo. Então, essa vista realmente foi decisiva pra gente querer ficar”.