Luiza Mello
As licenças para obtenção de armas de fogo aumentaram quase sete vezes durante o governo de Jair Bolsonaro. Em 2018, antes de Bolsonaro assumir, o número de pessoas com registros CAC (caçador, atirador ou colecionador) era de 117,5 mil. Ou seja, 56 brasileiros a cada 100 mil possuíam licença para armas. No ano passado, esses registros chegaram a 783,4 mil, o que significa que, a cada grupo de 100 mil pessoas, 386 têm a autorização. Na comparação de 2021 com o ano passado, houve uma alta de 37% de pessoas com registros. Os números mostram que o Brasil ganhou mais de 211 mil certificados de registros de armas em apenas um ano.
Um levantamento feito pelo Instituto Igarapé com colaboração técnica da Open Knowledge Brasil mostra que os sistemas de segurança dos estados e do Distrito Federal desconhecem a realidade sobre o número de armas em circulação na região de jurisdição, ou seja, nem mesmo as autoridades policiais locais conhecem o número exato de armas em posse da população.
O Ranking de transparência de dados sobre armas no Brasil aponta falta de transparência entre os órgãos de segurança pública do país. O Ranking mostra melhorias consideráveis em alguns estados, de um ano para outro, em relação à transparência das informações enviadas. Minas Gerais teve o melhor desempenho em 2022, seguido pelo Pará, que subiu do 19º para o 4º lugar, destacado com melhor qualidade de informações sobre o controle de armas e munições. A Polícia Científica do Pará (PCEPA) foi classificada como a segunda melhor do Brasil em transparência das informações, e recebeu o conceito de “Alto Nível” de qualidade nos dados fornecidos.
Os pesquisadores do Instituto Igarapé encaminharam pedidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) à Polícia Civil, à Polícia Militar e ao Departamento de Polícia Técnico-Científica dos 27 estados e para o Distrito Federal nos últimos dois anos (2021 e 2022).
Desse total, 75% dos pedidos de informações feitos em 2021 e 74% em 2022 foram negados ou não respondidos pelas autoridades. O Pará recebeu destaque dos pesquisadores e está entre os 5 estados brasileiros com melhor qualidade de informações sobre o controle de armas e munições.
Para os especialistas que atuam na área, a falta de informações e transparência de dados sobre armas verificado na maioria dos estados brasileiros e no Distrito Federal expõe lei do silêncio na segurança pública dos estados que não responderam aos questionários encaminhados pelo Instituto Igarapé em parceria com o Open Knowledge Brasil.
Dados divulgados na última quinta (20), pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram que o Pará tinha 35.843 registros de arma de fogo ativos em 2021. Em 2022 esse número chegou a 43.560 registros. No Brasil, de acordo com o Anuário, o registro de armas de fogo ativos no SINARM/Polícia Federal passou de 1.994.891 em 2021 para 2.300.178 em 2022. Em 2017, o número era de 637.972, o que representa um aumento de mais de 350% nos últimos cinco anos.
O certificado de registro ativos para as atividades de caçador, atirador esportivo e colecionador (CAC) subiu para 783.385. Entre 2018 e 2022, foi observado um crescimento de 665.918 certificados, visto que em 2018, o Brasil tinha 117.467 CACs ativos.
As armas de fogo seguem como o principal instrumento utilizado para matar no Brasil. Segundo o documento, 76,5% dos homicídios foram praticados com uso de revólver.
TRANSPARÊNCIA
O sistema de segurança pública do Pará cresceu 36 pontos em relação à avaliação anterior, realizada em 2021, conforme o conceito estabelecido pelo Ranking. As informações foram solicitadas aos três órgãos responsáveis por responder e investigar ocorrências envolvendo armas de fogo, efetuar apreensões e investigar a origem das armas: a Polícia Militar (PM), a Polícia Civil (PC) e o Departamento de Polícia Técnico-Científica (DPTC).
Entre os estados que não responderam ao Ranking, as alegações de sigilo foram de 18% em 2021 para mais do que o dobro em 2022 (38%). Mais da metade (51%) das informações solicitadas em 2021 tiveram acesso negado. Em 2022, esse número caiu para 37%, mas o percentual de solicitações ignoradas subiu de 24% para 37%. As polícias civis dos demais estados que não forneceram informações foram os órgãos com pior desempenho nacionalmente em ambos os anos, com 79% das solicitações não respondidas.
Os responsáveis pelo levantamento destacam que a categoria de perguntas menos respondidas se refere à investigação da origem de armas e munições apreendidas, o que “levanta preocupações sobre a capacidade de rastreamento e controle desses armamentos pelas autoridades”.
Na avaliação do Instituto Igarapé, a pesquisa revela uma cultura do sigilo entre os órgãos estaduais de segurança pública em relação à circulação de armas no país. “O controle de armas e munições é central para a redução da violência armada e para isso, informação de qualidade é essencial”, afirma a diretora de pesquisa da entidade, Melina Risso. “Por um lado, a pesquisa revela a falta de atenção dada ao controle de armas pelas polícias estaduais, e por outro, a persistente opacidade dos órgãos de segurança pública”, completa.
Entre as recomendações trazidas na nota técnica do estudo está a facilitação do acesso e compartilhamento de dados entre os sistemas federais e estaduais de controle; a ampliação da cooperação entre órgãos da segurança pública estadual, organizações da sociedade civil e instituições de ensino; o compartilhamento ativo de dados em alto nível de agregação com a sociedade; e a valorização da produção e análise de dados pelos órgãos de segurança pública.