VAI SER DEMITIDO?

Entenda o que pode ocorrer com agente do Detran afastado por cobrança de propina em Belém

O governador Helder Barbalho (MDB) anunciou no domingo mesmo que havia pedido o afastamento preventivo do servidor de suas funções.

O incidente ocorreu na passagem Olinto Meira, no bairro da Guanabara, em Belém, e gerou grande repercussão nas redes sociais e na comunidade local.
O incidente ocorreu na passagem Olinto Meira, no bairro da Guanabara, em Belém, e gerou grande repercussão nas redes sociais e na comunidade local.

Apesar de existir registro em vídeo do momento em que um agente do Departamento de Trânsito do Estado do Pará (Detran-PA) aparece usando uma viatura do próprio órgão para bater contra o veículo de uma condutora com IPVA vencido que teria se recusado a pagar propina, situação ocorrida no bairro da Guanabara, em Belém, no último domingo, 9, o servidor em questão não pode ser imediatamente demitido.

Por ter sido admitido por concurso público e ter estabilidade no cargo, a tramitação prevê afastamento das atividades, e em paralelo, abertura de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), que após garantido o direito à ampla defesa do acusado, poderá culminar ou não em sua demissão.

Quem explica isso é Klewerton Cunha, advogado e professor de Direito Público, citando que a reação nas redes sociais questionando porque não houve a exoneração do agente diante das cenas é, de acordo com a legislação vigente, descabida.

“O servidor cometeu uma infração gravíssima que pode levar a uma demissão. A exoneração é diferente, pois trata-se da saída sem penalidade, e ocorre quando o próprio servidor solicita sua saída, ou quando não passa no estágio probatório, e em algumas outras situações específicas prevista da Constituição Federal de 1988. Não possui caráter punitivo”, informa.

Klewerton confirma que, nesta situação, o caminho é mesmo a abertura de um PAD e a pena máxima seria demissão. “Só que, na administração pública, a demissão não é imediata, não se usa a ‘verdade sabida’. Mesmo que haja evidências, o servidor tem amplo direito à defesa e a responder o processo”, justifica.

O governador Helder Barbalho (MDB) anunciou no domingo mesmo que havia pedido o afastamento preventivo do servidor de suas funções, e segundo o advogado, isso ocorre para que a pessoa investigada não tenha meios de influenciar na produção de provas ou mesmo no andamento do processo como um todo. Esse período longe das atividades pode ser de até 60 dias, com possibilidade de prorrogação por igual período.

“Finalizado o prazo, que pode ser de até 120 dias, o servidor retorna ao serviço – caso não tenha sido julgado e demitido. Nesse período de afastamento, ele continua recebendo os valores fixos de sua remuneração – vencimentos, gratificação por escolaridade, etc. Mas perde os adicionais relacionados ao dia a dia da função, como plantões, por exemplo”, explica Klewerton. “

Quando todas as etapas do processo – instauração, instrução e julgamento – são concluídas, a mesma comissão aberta lá no início do PAD elabora relatório com parecer e encaminha ao governador, única autoridade competente a demitir um funcionário público, ou a alguma outra autoridade incumbida pelo chefe do Executivo estadual a fazê-lo. A partir daí começa a correr o prazo de 20 dias para que seja definido o destino do servidor.

“Digamos que se encerra o prazo de afastamento e o julgamento não ocorre: aí o servidor retoma suas atividades e aguarda até que o governador emita sua decisão. Mas se tudo ocorrer dentro desse período, se houver julgamento e pena máxima, então o agente em questão nem retorna ao trabalho”, enfatiza o advogado.

Outras implicações

Independente da conclusão do PAD, ou seja, da tramitação na esfera administrativa, Klewerton Cunha afirma que pode haver punições também nas esferas criminal e penal.

“Na criminal, o agente cometeu crime de corrupção passiva ao solicitar vantagem indevida, então ele pode ser responsabilizado por isso. Mesmo que não ocorra a demissão administrativa, ele pode perder o cargo por sentença judicial”, elucida.

“Já na esfera cível há uma responsabilidade automática do Estado para com a vítima, que teve o carro batido, danificado. A condutora pode ingressar em ação contra o Estado, mas não há a opção de ingressar contra o servidor, porque isso já foi pacificado no entendimento do Judiciário brasileiro. Aí o Estado tem responsabilidade objetiva, pois foi um dano causado por um de seus servidores”, complementa o professor de Direito Público.

Ficando comprovada a ação dolosa ou culposa, o Estado pode inclusive cobrar do servidor esses valores que terá de pagar à vítima. “Se não ocorrer a demissão, ele pode ter os valores descontados da remuneração. Se for demitido, terá nome inscrito na Dívida Ativa e vai ser processado pelo Estado a pagar a indenização que o Estado tiver de pagar à vítima”, expõe. Na esfera criminal, a consequência pode ser de reclusão junto ao sistema prisional do estado. Outros impedimentos incluem a não possibilidade de retorno a um novo cargo público por pelo menos cinco anos.