Luiz Flávio
Problemas de gestão aliados à falta de comunicação crônica e de investimentos efetivos são os principais problemas enfrentados por despachantes, transportadores e empresas de importação e exportação que operam no porto de Vila do Conde, em Barcarena, que vive um caos administrativo nas últimas semanas. A responsável é a empresa Santos Brasil, que há 15 anos arrendou a movimentação e contêineres no porto.
Cerca de 60 representantes dessas categorias participaram, na tarde de ontem (14), de uma reunião de trabalho convocada pela Federação das Indústrias do Estado do Pará (Fiepa) na sede da entidade, em Belém. As categorias reclamaram, principalmente, da demora excessiva na liberação e cargas que vem deixando inúmeros importadores e exportadores na mão.
Empresas de grande porte deixaram claro na reunião que podem suspender suas operações de importação e exportação do porto – o maior em operação no Pará – e transferi-los para o Porto de Santana, em Macapá, por conta dos inúmeros prejuízos econômicos que vêm sofrendo nos últimos meses em razão dos problemas, o que acarretaria prejuízos consideráveis tanto à economia de Barcarena como a do Estado no que se refere à arrecadação e impostos. Após ouvir as dezenas de demandas e reclamações, Roberto Teller, Diretor de Operações da Santos Brasil, garantiu que a situação estará normalizada até o final do mês de outubro.
Renato Jacques, proprietário de uma empresa especialista em comércio exterior e com 25 anos de atuação no mercado, afirma que a Santos Brasil não se preparou para o crescimento da Região Norte e em especial do Pará. “A demanda de importação e exportação cresceu muito em nosso estado e eles não tiveram demanda nem estrutura para atender essa realidade, o que acabou colapsando o porto… Hoje existem dezenas de contêineres parados que não podemos movimentar por falta de maquinário”, lamenta.
A empresa importadora tem um prazo de 15 dias para desembaraçar a carga que chega ao porto nos órgãos e devolver o contêiner vazio para o armador (dono do navio). “Se paga de US$ 150 a US$ 200 de taxa ao dia a partir do 15º dia quando essa operação não é realizada. Hoje muitos contêineres passam 10 dias além desse prazo, gerando um prejuízo grande”.
Jacques lembra que o comércio paraense hoje é movido pela importação, que cresce muito em datas comemorativas. “Cargas para Dia das Mães e Natal, por exemplo, chegam com 2 meses de antecedência em média, e com esse problema gerado pela Santos Brasil isso não vem sendo cumprido. Para você ter uma ideia, temos cargas encomendadas para o Dia dos Pais que continuam encalhadas no porto e que não vão servir sequer para a mesma data para o ano que vem, O prejuízo é incalculável…”, contabiliza.
ATENDIMENTO
Quando portos apresentam dificuldade de logística a tendência é que importadores e exportadores migrem para outros modais e para outros portos vizinhos. “Isso está em vias de ocorrer aqui. Muitos já cogitam em mudar suas operações para o porto do Amapá. Por ano a minha empresa opera 600 contêineres ao custo de R$ 55 mil cada de arrecadação de ICMS para o Estado do Pará. Seria uma perda grande para o Pará, não ?”, coloca.
Ismael Matias Jr., proprietário da transportadora norte Brasil Logística, disse que o grande gargalo hoje em Vila do Conde é o descarregamento das cargas, onde os motoristas das empresas passam horas a fio em filas esperando atendimento. “Essa morosidade acarreta um atraso grande na entrega dos produtos ao cliente final, extrapolando todos os prazos e gerando um efeito cascata. Quando o porto não cumpre o agendamento para o descarregamento, gera um atraso na entrega e outro agendamento precisa ser marcado, prejudicando os clientes”.
Ele diz que como não há cumprimento os prazos de carregamentos e de destinação final das cargas, os clientes acarretam muitos prejuízos pois não conseguem colocar seus produtos no comércio. “Muitos vêm substituindo o modal fluvial pelo rodoviário e se não há carga para transportar, a empresa fica no prejuízo e o resultado final é demissão de funcionários e até fechar as portas”.
Após o agendamento, a carga deveria ser liberada num prazo de duas horas, mas é recorrente que motoristas fiquem 14 e até 24 horas parados no porto. “Um motorista meu ficou 32 horas esperando a carga. Isso gera um passivo trabalhista enorme que eu preciso assumir para atender meu cliente final. E quem paga esse prejuízo?”, indaga.
José Maria Mendonça, vice-presidente da Fiepa e presidente do Centro das Indústrias do Pará (CIP) avalia que a reunião foi produtiva onde todos puderam se manifestar e expor seus pontos de vistas. “Agora esperamos para que a situação em Vila do Conde se normalize e os interessados se apressem na busca de uma solução, pois as operações no porto precisam voltar à normalidade o mais rápido possível”, pondera.
Empresa culpa a chuva pelos problemas
Roberto Teller tentou justificar a difícil situação no porto, afirmando que entre as medidas emergenciais adotadas estão a locação de duas Reach Stakers (utilizadas para a movimentação de contêineres) – a primeira entrando em operação ontem mesmo (14) e a segunda, no próximo dia 24, além da transferência de uma terceira Reach Staker de outra unidade da empresa, equipamento que iniciará sua operação em 15 de outubro. Disse ainda que a Santos Brasil também deslocou uma equipe de manutenção de seu terminal em Santos para agilizar eventuais reparações que se façam necessárias. “Temos hoje nove máquinas operando no porto e com essas aquisições serão mais 3 que ficarão na reserva para operar contêineres cheios e vazios”.
O diretor da arrendatária esclareceu que esse período de baixa produtividade é pontual e foi reflexo do uso emergencial dos equipamentos fora das condições ideais em função dos trabalhos de recomposição do piso do terminal, danificado em função das chuvas de inverno, associado ao aumento da demanda de contêineres vazios. “Crateras foram abertas numa área de 12 mil metros quadrados do porto. Com isso tivemos que locar da CDP áreas externas para colocar nossas empilhadeiras de grande porte numa distância de 2,5 quilômetros distante do terminal, deteriorando o maquinário e atrapalhando a operação”, explica.
Essa soma de fatores, segundo ele, exigiu que os equipamentos fossem utilizados diuturnamente e em condições extremas, em área de piso irregular, reduzindo a sua disponibilidade para 50% do ideal. Ele informou ainda que a empresa já investiu cerca de R$ 50 milhões no terminal de contêineres de do porto de Vila do Conde e que já aprovou investimentos de mais R$ 120 milhões para 2023. “Com isso o terminal de Vila do Conde aumentará em quase 40% a capacidade do terminal, dos atuais 217 mil TEUs (unidade equivalente de 20 Pés)/ano para 300 mil TEUs/ano em 2025.”, contabiliza.