Alexandre Nascimento
Na riqueza da tradição das religiões de matriz africana, a religião do Candomblé comemora hoje (2), o Dia de Iemanjá. Assim como na religião da Umbanda, que celebra a orixá feminina no dia 8 de dezembro, a data representa um espetáculo de devoção, cores vibrantes e respeito pelas águas que guardam histórias ancestrais, que reúnem fieis em terreiros, mares e rios para homenagear a Rainha do Mar, como ela também é conhecida.
“Iemanjá é um orixá feminina, que faz parte do panteão divino dos povos Iorubás, a mãe de quase todos os orixás, a padroeira dos pescadores. Por ser rainha do mar, exerce o poder, na crença das religiões de matriz africana, sobre quem vive no mar decidindo se as águas permanecerão calmas ou turbulentas”, disse Márcio Neco, historiador e cientista da religião.
Na realidade, essa celebração anual é marcada historicamente pelo sincretismo religioso, que coincide com as comemorações do Dia de Nossa Senhora dos Navegantes na tradição católica. “No período da escravização, os escravizados eram proibidos a cultuar seus orixás, eram até obrigados a se batizar e adotar nomes cristãos. Nesse contexto, eles disfarçavam que cultuavam os santos católicos, enquanto que celebravam no íntimo suas divindades”, explicou Márcio Neco.
Mas, diante dos processos de mudança, os candomblecistas não precisam mais do sincretismo para continuar a manifestar a sua fé. Atualmente, apesar dos casos de intolerância religiosa, os cultos a Iemanjá mantém seus cultos e ritos, como vestir branco, realizar procissões, levar oferendas às águas como flores, jóias, perfumes e comidas.
“Dentro da crença deles, se essas oferendas não afundarem ou voltarem para a margem, indica que Iemanjá não recebeu. Isso faz com que o fiel faça uma reflexão sobre, porque sua oferenda não foi recebida”, declarou o cientista da religião.
Na realidade, em alguns locais do Brasil a festa à Iemanjá acontece em datas diferentes ao do Candomblé, como em 8 de dezembro pelos umbandistas, que possuem o mesmo contexto do sincretismo e rituais, assim como costumes já consolidados, inclusive entre pessoas que não se denominam das religiões de matriz africana. “Para ambas as religiões, o culto sempre representa a associação às águas, numa relação que faz com que umbandistas participem das celebrações dos candomblecistas e vice-versa. Costumes já enraizados, como no dia 31 de dezembro, quando pessoas vestem brancos, pulam ondas, algumas sem saber que são rituais ligados à Iemanjá”, destacou Márcio Neco.
Mas, apesar de estar livre do sincretismo religioso, que era uma forma de impedir a liberdade dos escravizados, a intolerância religiosa ainda é constante contra as religiões de matriz africana, embora seja crime de racismo religioso e que se equipara aos crimes de injúria racial e racismo. “Acontece, mas a celebração deve ser sempre uma forma de protesto e resistência à intolerância religiosa”, concluiu o Márcio Neco.
O culto à Iemanjá também é consolidado em Belém, por exemplo, uma imagem de 12 metros da orixá foi erguida na entrada do Espaço Afro-religioso Mãe Dinair – Terreiro São Sebastião e Toya Jarina, na avenida Augusto Montenegro, próximo ao estádio Mangueirão, em novembro do ano passado. Segundo a direção do espaço, o monumento de Iemanjá estará aberto à visitação durante o dia e as 20 horas terá início o ritual de celebração da rainha do mar.