Luiz Octávio Lucas
Égua, tu já tá no teu momento, mano? A frase é só para ilustrar como um paraense da gema pode repreender alguém que exagerou no comportamento. O que parece ser a coisa mais natural do mundo para nós, soa muito engraçado para quem é de fora ou até mesmo para os próprios paraenses, quando se veem retratados em vídeos na internet por humoristas profissionais que adotaram o jeitão papa xibé para arrancar gargalhadas. Não é preciso procurar muito no Instagram, por exemplo, para achar perfis desse tipo, com milhares de seguidores.
Um desses comediantes é Caio Ariel, 29 anos, ex-estudante de medicina. Dono do perfil @tradutorparaense, com quase 85 mil seguidores, ele se propõe a “traduzir o Pará com muito humor e avacalhação”, segundo consta na própria bio da página. “Tranquei o curso no primeiro semestre para viver o artista que eu sempre fui”, justifica.
Na página, Caio faz esquetes com os trejeitos paraenses. Em um deles explica que no Pará não se fala “poxa, minha irmãzinha querida, mamãe está muito brava e decepcionada com você”, e dá logo a letra de como é esse aviso. “Na verdade nós falamos – ‘Ei, sua moleca! Mamãe tá maaansaa contigo…’”, imita.
“Faço vídeos desde criança, fiz um vídeo que viralizou no Facebook e a partir daí comecei a ver que dava pra fazer alguma coisa com humor com o jeito paraense”, explica. “Mas só se tornou um negócio profissional mesmo este ano, em 2022, quando larguei tudo para seguir com isso”.
Segundo o comediante, a repercussão do trabalho tem sido incrível. “Sempre esperei que isso fosse acontecer, mas não esperava que fosse tão rápido. Inclusive chegou a outros países, isso é muito louco”, avalia.
“Atribuo esse sucesso principalmente a Deus, se não fosse Ele, isso não teria acontecido. Eu estudo pra caramba sobre marketing digital, posicionamento na internet, procuro me profissionalizar na área de comunicação e tem toda a galera que me acompanha e gosta do meu trabalho, e multiplica no WhatsApp e no Instagram”, detalha.
“Quando a gente trabalha com internet, absolutamente tudo do dia a dia pode virar conteúdo. Se eu to andando na rua e cai uma manga na cabeça de alguém, isso pode virar um conteúdo. Dou sempre um jeito de gravar, para não perder a ideia” exemplifica.
Sobre o desafio de fazer humor em tempos de politicamente correto, Caio Ariel diz não se preocupar. “O politicamente correto nunca foi um problema para mim, porque meu humor não ofende, é mais inocente, pra família inteira. Sempre me preocupo com a imagem que eu quero passar. Não me preocupo, porque eu sei que as palavras que vou usar dificilmente vão ofender”, avisa.
O ex-estudante de medicina conta que sempre levou jeito para fazer rir e atribui o dom a algo divino. “Trabalho com o Instagram, com o Tik Tok, mas meu dia a dia sempre foi assim. Desde criança sendo o palhaço da galera. Não tem uma foto de criança que eu não esteja fazendo careta. Essa é a forma que Deus escolheu para mim. Sempre de bom humor”, diz.
De planos para o futuro, o “tradutor paraense” quer apenas seguir fazendo rir. “Plano futuro é que se torne um negócio cada vez maior, mais lucrativo. Não trabalho de graça, sei muito bem do valor do meu tempo. É continuar produzindo conteúdo para que o negócio cresça cada vez mais”, planeja.
ICOARACI
Dono do perfil no Instagram @gerasorriso, um trocadilho com o próprio nome, Geraldo; o apelido de onde mora, Icoaraci, a Vila Sorriso; e o que gosta de fazer, levar alegria, Gera Wellington, 44, é licenciado em história, mas encontrou no humor paraense uma forma de retomar a própria vida, após se afastar do trabalho por uma crise de depressão.
Diagnosticado com transtorno bipolar, o comediante viu na paixão pelo audiovisual uma maneira de se distrair e divertir outras pessoas. Deu tão certo que hoje ele soma mais de 10 mil seguidores no Instagram, fãs de personagens como Rick Fernandez, Germano Pacamum e o Turu, vividos por ele.
“Em 2009 tive pensamentos suicidas, me afastei do trabalho, recorri ao INSS. Aí pensei – ‘eu preciso fazer alguma coisa para ocupar a minha mente’. Comecei a fazer vídeos e viralizaram”, explica.
“Um deles foi o ‘Eu não passei no vestibular’, foi noticiado no Dol e viralizou. Depois foi um ‘Se os ônibus de Belém fossem escolas de samba’, aí dava as notas, ônibus mais esculhambado, mais pitiú.. novamente o Dol publicou e viralizou, então percebi que algo mais regional viralizava”, comenta.
No Instagram desde o ano passado, Gera criou o personagem paraense Rico Fernandes, que veio de Santa Catarina e voltou de lá ‘mais sofisticado’. “Só toma açaí com granola, anda por Belém de cachecol e sobretudo”, descreve ele, que também gera conteúdo para o Tik Tok e o Facebook e acumula até 1,2 milhão de visualizações em alguns vídeos.
“O Germano Pacamun é o primo que faz o contraponto, é do interior de Vigia, fala ‘mais quando já’, mais cantado, e vou usando esses termos”, conta.
O sucesso, segundo ele, já é visível e tem um motivo.
“As pessoas pedem pra tirar fotos, gravar vídeos. Paraense é aquela pessoa que quando falam mal do Pará, querem vídeo respondendo, me pedem isso. Tem a influencer que falou mal do açaí, uma mineira, e fiz um vídeo com pão de queijo com açaí. A gente não tem vergonha de ser daqui”, pontua. Outro meme que fez sucesso foi o vídeo com as caras e trejeitos de moradores dos bairros de Belém.
“Barreiro, uma cara mais de malaco. Batista Campos, uma cara mais de soberba, e fez sucesso”, descreve. “Brinco com a chuva, o nosso clima, e sempre usando termos do nosso dicionário Papa Xibé”.
“Me sinto realizado com os paraenses se identificando”
Outro comediante que faz sucesso com seus vídeos divertidos, sempre com a camisa do Pará, é Víctor Barros. O ator e criador de conteúdo tem 26 anos, atualmente estuda Artes Cênicas na Escola De Arte Dramática da USP, em São Paulo e, apesar de ter saído do Pará, o Pará não saiu dele… Quem o acompanha no Instagram sabe bem disso!
https://www.instagram.com/victoorbarros/?hl=pt
Pergunta: Como surgiu a ideia de criar um perfil de humor baseado no paraense?
Resposta: Tudo começou quando me mudei pra São Paulo em 2016, logo eu percebi a imagem equivocada que as pessoas daqui tem do Pará e da região Norte como um todo. E, égua, isso me deixava muito mordido, comecei a ouvir todo tipo de comentário sem noção. Aí comecei a pensar que eu queria fazer alguma coisa pra mudar esse pensamento atrasado, a nossa região é tão rica, tão linda e eu queria/quero que as pessoas conheçam as coisas lindas que o Pará e o Norte possuem.
Como eu já trabalhava com comédia, decidi unir as duas coisas e comecei a usar a comédia pra falar sobre a nossa cultura e sobre a minha experiência como um paraense morando em São Paulo, tudo com o objetivo de valorizar a nossa cultura e quebrar esses estereótipos que existem sobre nossa região. Fiz show de humor solo, stand up, e assim comecei esse projeto. Quando chegou a pandemia eu não pude seguir fazendo shows presenciais, e foi aí que veio a ideia de seguir com esse projeto só que agora nas redes sociais.
Como tem sido a repercussão?
Égua, eu te juro que não tenho palavras pra descrever o quanto eu fico feliz, e o quanto me sinto realizado quando vejo os paraenses se identificando com meus vídeos! Tu é doido é, isso significa muito pra mim, dirocha. Quando um(a) paraense me fala que se sente representado(a) pelo meu trabalho, ou que meus vídeos fazem essa pessoa rir, se divertir, ou quando alguém que não é do Norte e fala que se interessou pela nossa cultura acompanhando meu trabalho, isso faz eu me sentir completamente realizado!
A que você atribui esse sucesso?
Acredito que primeiro de tudo atribuo ao amor que tenho pelo que eu faço! Quando a gente se dedica a fazer o que ama, isso fica nítido no desempenho do trabalho, eu me divirto muito fazendo meus vídeos e quando a gente se diverte o espectador também se diverte. Mas além disso também atribuo ao objetivo, acredito que quando a gente foca em um objetivo, tudo fica mais compreensível para nós mesmos.
Eu tenho muito evidente que quero usar a minha arte para representar o Pará e fazer as pessoas de fora da região conhecerem a cultura, e unindo a linguagem que uso, faz com que pessoas de outros estados sintam interesse em acompanhar e conhecer mais, e faz com que os paraenses sintam-se representados. E não posso deixar de atribuir esse momento da minha vida as pessoas que me seguem, se não fossem por essas pessoas acreditarem no meu trabalho, me acompanhar nas redes, nada disso seria possível. Então a minha eterna gratidão aos meus seguidores que são os melhores do mundo.
Como surgem as ideias para as postagens?
As minhas ideias vêm de diversos lugares. Às vezes eu vejo algo na rua que me dá um norte e vem a ideia de um vídeo, acompanho bastante o que acontece na internet que me inspira também. Sempre que vejo algo que me dá uma ideia eu penso “como isso se conecta com o Pará?” Ou “Se isso acontecesse com um paraense ou acontecesse no Pará como seria?” e então escrevo. Às vezes utilizo os comentários equivocados feitos por pessoas, quando alguém me faz uma pergunta estereotipada eu já penso “preciso fazer um vídeo sobre isso”. Mas a minha maior inspiração é sem dúvida a minha saudade. Na maior parte das vezes eu utilizo as coisas que mais me fazem falta e falo sobre elas nos vídeos.