Dr. Responde

Bactéria pode ser a chave para curar doenças

Cintia Magno

Diferente do que se pode imaginar em um primeiro momento, as bactérias têm propriedades que podem proporcionar benefícios ao ser humano, sobretudo a partir do olhar da ciência e da pesquisa. É o caso, por exemplo, de uma bactéria da espécie Pseudomonas aeruginosa, encontrada em solo paraense e que, segundo descoberta feita por cientistas do Instituto Tecnológico Vale – Desenvolvimento Sustentável (ITV-DS), da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) e outras instituições parceiras, tem potencial para combater doenças como herpes e até mesmo o câncer de mama.

O pesquisador do Instituto Tecnológico Vale, José Bitencourt, explica que uma bactéria encontrada no solo do município de Paragominas, no sudeste do Pará, pertencente à espécie Pseudomonas aeruginosa, é de uma cepa única só encontrada naquela região e que, portanto, apresenta características específicas que demonstraram potencial para produzir um composto químico chamado biossurfactante, com capacidade de atacar microrganismos de importância médico-veterinária.

“Em estudos realizados pelo Instituto Tecnológico Vale e parceiros, foram observadas propriedades viricidas, bactericidas, além de capacidade de eliminar células cancerosas sem danificar as células saudáveis do corpo”, aponta. “É importante ressaltar que esse é um estudo feito em parceria com a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), que já realiza pesquisas no solo da região de Paragominas”.

José Bitencourt destaca que a bactéria estudada tem diversas atividades bioquímicas e biológicas que foram analisadas e possibilitaram observar que o biofilme, como é chamada a substância que a bactéria produz normalmente para autoproteção, tem propriedades contra células tumorais. Segundo o cientista, testes preliminares em laboratório expuseram células cancerígenas de mama à ação desse composto e mostraram que, na concentração de 12 g/mL, apresentou potencial para reduzir o processo de proliferação dessas células tumorais in vitro.

“Durante o estudo, todas as concentrações utilizadas desse biossurfactante diminuíram a viabilidade, ou seja, a ação das células cancerígenas foi reduzida para menos de 50% em 72 horas, demonstrando um potencial antitumoral comparável aos níveis alcançados pela quimioterapia padrão. Para compreender se o composto teria eficácia semelhante no combate a outros tipos de células tumorais, seria necessário realizar novos estudos”.

Além do câncer de mama, o estudo avaliou também o potencial do composto no combate a três tipos de vírus: o do herpes simples, o coronavírus murino e o vírus sincicial respiratório, também com resultados satisfatórios. “Os testes feitos em laboratório demonstraram que a solução do composto chegou a inibir 97% da atividade viral nos três tipos de vírus citados”, esclarece o pesquisador do Instituto Tecnológico Vale.

Ainda que as etapas realizadas pelo estudo sejam preliminares, os resultados obtidos e apresentados já se mostram bastante promissores. “É importante enfatizar que, na metodologia científica, existe um rito bem longo de estudos e mais pesquisas que precisa ser respeitado. Portanto, no caso desse estudo realizado pelo ITV em colaboração com a Unifesspa, vários testes específicos ainda precisam ser feitos para se chegar, de fato, até a etapa do possível uso do composto na formulação de medicamentos a serem utilizados pela população”.

Instituto atua em diversos estudos sobre a Amazônia

A descoberta da nova bactéria que apresenta um potencial terapêutico animador é apenas um dos inúmeros projetos desenvolvidos no Instituto Tecnológico Vale – Desenvolvimento Sustentável (ITV-DS). Presente na região amazônica, com sede em Belém, há 14 anos, a instituição sem fins lucrativos mantida pela Vale atua como centro de pesquisa multidisciplinar com foco na geração de conhecimento e valor.

Assumindo a missão de contribuir com o Pará e o Brasil no desenvolvimento de soluções tecnológicas e científicas não apenas para os desafios da cadeia da mineração, mas para a própria sustentabilidade para as futuras gerações, o ITV-DS desenvolve inovações em pesquisas de diferentes áreas estratégicas: desde estudos sobre a biodiversidade, serviços ambientais, recursos hídricos, socioeconomia, genômica ambiental, reflorestamento com espécies nativas, recuperação de áreas degradadas, ocupação e uso da terra, mudanças climáticas, entre outros.

À frente ou formando as equipes que tocam tais pesquisas, o protagonismo feminino faz parte dos trabalhos no instituto de pesquisa. No Instituto Tecnológico Vale, as mulheres são 38% do corpo científico, número que segue em crescimento. Dentre os pesquisadores e bolsistas, ao todo são 40 mulheres paraenses que pensam, estudam e buscam o melhor para a Amazônia.

Entre essas mulheres cientistas, está a engenheira florestal paraense Sâmia Nunes, que atua com pesquisas que geram e compartilham dados que auxiliam nas tomadas de decisão sobre a implementação da restauração florestal, com o objetivo de contribuir para a ampliação da restauração na região. “Atuar no desenvolvimento de pesquisas que contribuam e tragam soluções para a recomposição de florestas na Amazônia é o que me satisfaz profissionalmente”, pontua. “Acredito ainda que ajudar as pessoas a entenderem que é possível ter desenvolvimento tendo a vegetação como aliada, é a maior beleza da profissão que escolhi para trilhar”.

Em outra frente de atuação, a pesquisadora Renata Tedeschi coordena o projeto que realiza pesquisas na área de previsão mensal de precipitação com auxílio de machine learning, ou seja, com aplicação de Inteligência Artificial que permite às máquinas extraírem conhecimento dos dados estudados e aprenderem com eles de maneira autônoma. Natural de Curitiba, a física de formação e pós-doutora em Clima pela Universidade de Exeter, da Inglaterra, atua no Instituto Tecnológico Vale desde 2019. “Quero me aprimorar cada vez mais em gestão de pessoas e sonho em aprender Ciência de Dados para aplicar esses métodos na melhoria contínua das previsões realizadas. Tenho o desejo de um dia poder estar entre os revisores dos relatórios do IPCC [Intergovernmental Panel on Climate Change – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas]”.

Doutora em Biologia Evolutiva e Ambiental pela Universidade de Ferrara, na Itália, e com pós-doutorado em países como Alemanha e Canadá, a pesquisadora mineira Sibelle Vilaça atua no ITV com o projeto Genômica da Biodiversidade Brasileira (GBB), realizado em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

A iniciativa é voltada para o mapeamento genético e genômico de espécies da fauna e flora ameaçadas de extinção, exóticas ou com potencial para impulsionar a bioeconomia em regiões, especialmente na Amazônia. “Ser pesquisadora, para mim, é um privilégio. Ter a possibilidade de abrir portas para outros cientistas ao ajudar a alavancar o uso das ferramentas genômicas para o conhecimento da nossa biodiversidade é um objetivo a ser conquistado”, aponta a pesquisadora que ainda no ensino médio se identificou com os temas relacionados à biologia e à genética.

Renata Tedeschi
Sibelle Villaça
Sâmia Nunes