Em mais um desdobramento da Operação Hades, deflagrada pelo Ministério Público do Pará (MPPA), o desembargador Pedro Pinheiro Sotero, do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA), determinou o afastamento por seis meses do prefeito de Ananindeua, Daniel Santos (PSB), por suspeita de envolvimento em um esquema milionário de corrupção, fraudes em licitações e lavagem de dinheiro. A medida faz parte de uma investigação que apura desvios de recursos públicos que somam mais de R$ 115 milhões.
A decisão judicial incluiu ainda o bloqueio de bens no valor de R$ 131,8 milhões vinculados ao prefeito e à sua empresa, a Agropecuária J D EIRELI. Também foi determinada a apreensão dos passaportes dos investigados e a execução de mandados de busca e apreensão em imóveis residenciais e comerciais ligados aos envolvidos. Um dos alvos foi um luxuoso apartamento localizado em Fortaleza, no bairro nobre Meireles, à beira-mar, avaliado em cerca de R$ 2 milhões.
O imóvel, embora não registrado em nome de Daniel Santos, apresentava indícios claros de ligação com o prefeito afastado. Durante a ação da força-tarefa, foram encontrados no apartamento objetos pessoais e fotografias de Daniel e seus familiares. Além disso, no local foi apreendida uma coleção de relógios de alto valor, avaliada em aproximadamente R$ 3 milhões.
Esquema de favorecimento e propinas
De acordo com o MPPA, o esquema investigado gira em torno do direcionamento de processos licitatórios da Prefeitura de Ananindeua, especialmente das secretarias municipais de Saneamento (SESAN) e de Saúde (SESAU), para favorecer um grupo específico de empresas. Entre elas, destacam-se a EDIFIKKA e a DSL Construtora, controladas pelo empresário Danillo da Silva Linhares.
Essas empresas, segundo as investigações, venciam certames com cláusulas restritivas ilegais e com publicidade precária, o que dificultava a participação de outros concorrentes. A comissão de licitação, inclusive, teria conhecimento prévio sobre quais empresas participariam das concorrências. O membro da comissão, Manoel Palheta Fernandes, também afastado de suas funções, é acusado de receber propinas diretamente das empresas vencedoras. Extratos bancários mostram transferências que coincidem com pagamentos da prefeitura.
Vantagens pessoais e uso da máquina pública
O MPPA detalha no relatório que Daniel Santos teria recebido vantagens indevidas através de empresas com contratos com o município. Uma das acusações é de que parcelas de uma aeronave particular comprada por ele foram pagas por empreiteiras beneficiadas. Há ainda indícios de que a compra de um complexo de fazendas em Tomé-Açu, no valor de R$ 16 milhões, foi financiada parcialmente com recursos repassados por essas mesmas empresas.
Empresários ouvidos no inquérito relataram ter sido coagidos a arcar com despesas particulares do prefeito, como o fornecimento de combustível e a compra de maquinário agrícola para suas propriedades.
Risco à investigação e tentativa de obstrução
A decisão de afastamento também se baseia no risco de obstrução das investigações. O secretário de Saneamento, Paulo Macedo, teria avisado servidores sobre a iminência da operação e orientado ajustes contratuais para encobrir irregularidades. Há ainda a suspeita de que o prefeito tentou forjar documentos para justificar pagamentos suspeitos.
Em outro ponto da investigação, chama atenção a mudança repentina no depoimento do empresário Ronaldo de Souza. Após denunciar o prefeito, ele alterou sua versão em uma ata notarial. No mesmo período, sua empresa recebeu mais de R$ 736 mil da prefeitura, o que levantou suspeitas de tentativa de silenciamento da testemunha.
Diante do conjunto de provas e da gravidade dos fatos, o desembargador Pedro Sotero afirmou que o afastamento dos agentes públicos é necessário para “evitar a reiteração delitiva” e garantir a integridade da colheita de provas, protegendo o andamento da operação.