
Apurar o olhar para as novas tecnologias e inovações já desenvolvidas pode fazer a diferença entre manter o mesmo processo produtivo utilizado há anos e adotar um modelo que alie agricultura e sustentabilidade. Estimuladas a pensar em negócios sustentáveis, as irmãs Thainara e Thayse Vasconcelos optaram pelo segundo caminho e vêm transformando a forma de cultivo de uma importante especiaria na região sudeste do Pará.
Foi entre reuniões em salas de bate-papo virtuais que nasceu a startup DINAM (Diamante Negro da Amazônia), que hoje é tocada pelas irmãs. Thainara Vasconcelos, 23 anos, lembra que a ideia de trabalhar com a pimenta-do-reino surgiu a partir do olhar para as necessidades da própria região onde moram, em Parauapebas.
“A DINAM surgiu como uma ideia em um programa de apoio ao empreendedorismo sustentável que ocorreu no finalzinho da pandemia. E, dentro desse programa, a gente foi estimulada a olhar para o nosso território, para a nossa região, identificar os problemas que aqui tem e pensar em soluções que fossem sustentáveis, tanto no setor econômico, quanto social e ambiental”.
Pesquisando sobre que setores poderiam atuar, elas conheceram alguns produtores de pimenta-do-reino de Carajás que puderam relatar quais eram os desafios enfrentados por eles na cadeia, além de destacar a importância da cultura para a economia do Estado, uma vez que o Pará é o segundo maior produtor de pimenta-do-reino no Brasil. Inicialmente, a equipe pensou em solucionar apenas o problema do escoamento da produção, mas logo viram a oportunidade de tornar aquela produção mais sustentável.
“Depois de conversar muito mais com os produtores e entender como era produção, a gente percebeu que tinha que atuar além. A gente olhou para o início da cadeia e para como a pimenta-do-reino era produzida, ainda no modelo tradicional”, contextualiza Thainara.
O Modelo de Produção Sustentável da DINAM
A pimenta-do-reino é uma planta trepadeira e que, portanto, necessita de uma estaca para se apoiar, o que se conhece como ‘tutor morto’. Neste modelo tradicional, porém, em que se usa essa estaca de madeira, se identificou que o produtores enfrentavam dois problemas: o primeiro era o custo elevado da estaca, e o segundo era o impacto causado ao meio ambiente, já que era preciso derrubar uma árvore para utilizar a madeira para produzir as estacas. Foi neste ponto que as irmãs decidiram interferir.
“O que a gente começou a fazer foi reproduzir e promover aquilo que a Embrapa já faz, que muitos produtores aqui no Pará também já estão fazendo, que é a substituição desse modelo tradicional que usa essa estaca de madeira cortada, por um modelo inovador, um modelo sustentável, que usando uma árvore chamada Gliricídia que serve como tutor para a pimenteira, um tutor vivo. E aí a gente vai ter então uma produção sustentável”.
No modelo de cultivo que utiliza a Gliricídia como tutor, não apenas o custo de produção diminui para o produtor, como ainda se consegue promover o plantio de árvores enquanto se cultiva a pimenta-do-reino, contribuindo com o sequestro de carbono da atmosfera e com os demais serviços ambientais prestados pela vegetação.
“Essa é uma tecnologia que a nossa Embrapa vem pesquisando há anos, é uma pesquisa que tem mais de 30 anos e tem muito produtor, inclusive aqui no Pará, já reproduzindo. E a ideia que a gente teve foi de promover cada vez mais isso para que novos produtores se interessem e para que aqueles produtores que já produzem no modelo tradicional também passem a produzir de forma sustentável para que, com isso, a gente tenha uma transformação positiva de toda a cadeia”.
Thainara explica que a startup não tem produção própria, ela trabalha a comercialização da pimenta que é fornecida pelos produtores. Mas ao longo do seu processo, inclui a promoção do modelo sustentável de produção da cultura. “Inicialmente, a gente começa com o escoamento dos produtos, a gente tem produtores parceiros que produzem pimenta, fornecem os grãos e a gente comercializa através da nossa linha de produtos. E a segunda fase do projeto é a atuação em campo como produtor, levando essa tecnologia para campo, fazendo com que eles produzam essa pimenta de forma sustentável”, explica.
“Não é o objetivo da DINAM ter produção própria, o objetivo é que a gente tenha esses produtores parceiros, que a gente leve essa tecnologia para campo, que a gente atue em toda cadeia, dê essa autonomia para eles, para que a gente possa, de fato, desenvolver a cadeia produtiva, o que acabou se tornando um dos nossos objetivos no meio do caminho”.
Expansão e Parcerias
Thainara conta, ainda, que através do programa de apoio ao empreendedorismo sustentável que participaram foi possível implantar, em Carajás, no Sudeste paraense, o primeiro pimental sustentável, em parceria com a Fundação Vale e outros parceiros. Com isso, a empreendedora destaca que foi possível levar essa tecnologia para a região e apresentá-la como uma possibilidade para os produtores locais. “Com isso a gente conseguiu trazer essa tecnologia para cá porque, aqui, a pimenta aqui era mais produzida no modelo tradicional. A pimenta era muito mais produzida de forma sustentável próximo de Belém, em Tomé Açu, em Capitão Poço”.
Para 2025, Thainara conta que, ao participar de outros programas de aceleração e conversar com pessoas do setor, surgiu a necessidade de pensar em um modelo que seja ainda mais adequado à realidade amazônica, o que levou a uma evolução do projeto que se mantém focado na produção de pimenta-do-reino, mas desta vez aliado a outras culturas.
“A gente começou a olhar para o nosso projeto e ver que, levar o formato do pimental sustentável era um ponto positivo, porém, a gente ainda estava fazendo monocultivo e no contexto de Amazônia isso fez com que a gente parasse e refletisse sobre o projeto. Então, a gente redesenhou todo o projeto e agora a gente está trabalhando não mais com os pimentais sustentáveis, mas em um projeto novo chamado SAF (Sistema Agroflorestal) com Pimenta, em que se produz pimenta do reino, integrando a pimenta junto com cacau, junto com o açaí”, conta.
“Esse projeto vai recuperar áreas degradadas, fomentar a biodiversidade, melhorar a qualidade do solo e a gente consegue, dentro desse cenário, levar mais transformação e mais impacto para campo. A gente vai permanecer com a pimenta do reino produzida de forma sustentável, só que agora não mais no monocultivo e sim no sistema SAF”.