DIÁRIO NA EUROPA

Um poveiro ilustre chamado Eça (ou Ega)

A obra de José Maria de Eça de Queiroz é tão especial que, ainda nos dias de hoje, monografias em universidades, séries e filmes baseados na obra dele fazem parte de nossas vidas.

Um poveiro ilustre chamado Eça (ou Ega) Um poveiro ilustre chamado Eça (ou Ega) Um poveiro ilustre chamado Eça (ou Ega) Um poveiro ilustre chamado Eça (ou Ega)
A obra de José Maria de Eça de Queiroz é tão especial que, ainda nos dias de hoje, monografias em universidades, séries e filmes baseados na obra dele fazem parte de nossas vidas.
A obra de José Maria de Eça de Queiroz é tão especial que, ainda nos dias de hoje, monografias em universidades, séries e filmes baseados na obra dele fazem parte de nossas vidas. Foto: Divulgação

Hoje vou fazer diferente e escrever um perfil. E a vítima é um camarada que nasceu em Lisboa, é licenciado em Direito e, de vez em quando, bem contraditório.

Tava aqui pensando se entrego o nome do rapaz. Se sim, muitos vão logo reconhecer, caso contrário, vai parecer que tô em cima do muro….

Já falei que ele é lisboeta. Mais um detalhe: é difícil não encontrá-lo em uma balada, em qualquer dia da semana.

Vou cometer uma indiscrição: o rapaz vive às custas da mãe e também “escorado” em amigos da alta sociedade. E, pra escandalizar, tem momentos que é um revolucionário raiz e, logo em seguida, um conservador chato.

Resumindo esta ópera pseudo-barroca: é um bon vivant que tem a vida que muitos adorariam ter mas preferem o comodismo e ser “bem falados” por esta mesma sociedade.

Mas decidi abrir o jogo: ele se chama João da Ega (tomara que ele não leia isto…). João de que? Da Ega, o primeiro e único. Ele costuma descrever-se num português quase camoniano.

Lê aí e me diz se dá pra acreditar: “a sua figura engrouviada e seca, os pelos do bigode arrebitado sob o nariz adunco, um quadrado de vidro entalado no olho direito”.

Aqui entre nós, mas parece mentira: o rapazola saiu de (ou entrou em) um livro do século XIX, né? Pior que é verdade: João da Ega é um dos principais personagens do romance “Os Maias”, de Eça de Queiroz.

Eça de Queiroz e João da Ega: Reflexões e Alter Ego

E por que dei essa enrolada básica pra falar de um personagem se posso discorrer sobre uma personalidade real e reconhecida como das maiores em Língua Portuguesa, tanto em Portugal quanto no Brasil? Esta é fácil: o próprio Eça de Queiroz referia-se a João da Ega como um alter ego.

É lógico que o bom vivant Ega representa apenas alguns dos traços da personalidade de Eça (e não é que os nomes são quase o mesmo?). Mas a vida boêmia, as viagens pelo mundo e o olhar afiado para as situações mais pitorescas do cotidiano são o Ega do Eça.

A obra de José Maria de Eça de Queiroz é tão especial que, ainda nos dias de hoje, monografias em universidades, séries e filmes baseados na obra dele fazem parte de nossas vidas. Foi um intelectual de alto gabarito, diplomata e que representou Portugal na Inglaterra e em Cuba.

Eu o descobri aos 12 anos, assistindo a série “O Primo Basílio”, e de lá pra cá, fui desbravando as milhares de páginas de “O Mandarim”, “A Ilustre Casa de Ramíres”, “A Tragédia da Rua das Flores”, “A Relíquia”, “O Crime do Padre Amaro” e “Os Maias”, dentre muitos outros.

A Descoberta em Póvoa de Varzim

Esse desbravar foi como estar uma um mar azul, como aquele de Póvoa de Varzim, o concelho, do Porto, onde Eça nasceu em 1845. Não perdi a oportunidade e fui até lá conhecer esta história de perto.

É comovente a forma como os poveiros tratam o filho ilustre. A casa onde ele nasceu, na Praça da Almada, o largo em frente, a praça com o monumento em homenagem ao escritor e suas obras.

E um detalhe interessante: a placa que identifica o berço do romancista está com todas as letras: “A Eça de Queiroz. 1845-1900. Homenagem de portuguezes residentes no Brazil”.

José Maria de Eça de Queiroz está para a literatura portuguesa assim como Machado de Assis para a brasileira: dois espadachins sempre prontos a perfurar, expor as vísceras da hipocrisia e sempre com refinados elegância e humor caústicos.

Do contrário, qual o motivo de, lá pelas tantas, ele escrever: “não tenho medo de pensar diferente dos outros. Tenho medo de pensar igual e descobrir que todos estão errados”?

*Sérgio Augusto do Nascimento é um jornalista paraense que vive em Portugal. Foi repórter e editor e hoje é correspondente do DIÁRIO na Europa.