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Trabalho por app pode ter dificuldades

Belém, Pará, Brasil, Cidade. Retranca: PRECARIZAÇÃO/ TRABALHO/ APLICATIVOS - Antônio Reis, 41 anos, motorista por aplicativo. Gancho: O estudo Plataformização e Precarização do Trabalho de Motoristas e Entregadores no Brasil, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que o trabalho mediado por aplicativos resultou em jornadas de trabalho mais longas, menor contribuição previdenciária e forte queda da renda média destes trabalhadores nos últimos anos. Local:  - Belém. Data: 24/05/2024. Foto: Mauro Ângelo/ Diário do Pará.
Belém, Pará, Brasil, Cidade. Retranca: PRECARIZAÇÃO/ TRABALHO/ APLICATIVOS - Antônio Reis, 41 anos, motorista por aplicativo. Gancho: O estudo Plataformização e Precarização do Trabalho de Motoristas e Entregadores no Brasil, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que o trabalho mediado por aplicativos resultou em jornadas de trabalho mais longas, menor contribuição previdenciária e forte queda da renda média destes trabalhadores nos últimos anos. Local: - Belém. Data: 24/05/2024. Foto: Mauro Ângelo/ Diário do Pará.

Cintia Magno

A perspectiva de fazer o seu próprio horário de trabalho, de não precisar se reportar à chefia e, ainda por cima, ter uma renda maior foi o que levou Antônio Reis, 41 anos, a decidir fazer do transporte de passageiros mediado por aplicativo uma profissão, há sete meses. O que ele não esperava era que as jornadas precisariam ser tão extensas e que o retorno financeiro, diante dos custos com a manutenção do veículo, não fosse tão atrativo. A realidade vivenciada por Antônio é revelada no estudo ‘Plataformização e Precarização do Trabalho de Motoristas e Entregadores no Brasil’, que compõe a 77ª edição do Boletim Mercado de Trabalho, lançado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

De acordo com a pesquisa, o trabalho mediado por aplicativos teve como consequência jornadas de trabalho mais longas, diminuição na contribuição previdenciária e forte queda da renda média desses trabalhadores nos últimos anos. Entre 2012 e 2015, o estudo aponta que o total de motoristas autônomos no setor de transporte de passageiros (não incluídos os mototaxistas) era cerca de 400 mil e o rendimento médio ficava em torno de R$ 3.100,00. Já em 2022, o total de ocupados nessa modalidade passou para quase 1 milhão. Porém, o rendimento médio passou a ser inferior a R$ 2.400,00.

Em outra categoria analisada pela pesquisa, a dos entregadores plataformizáveis – que contempla motociclistas, entregadores e condutores de bicicletas – o número de trabalhadores era de 56 mil pessoas em 2015, quando a renda média obtida por eles era de R$2.250,00. Já em 2021, o número de trabalhadores desse tipo no Brasil saltou para 366 mil entregadores, com uma renda média de R$1.650.

A adesão ao trabalho mediado por aplicativos foi planejada por Antônio Reis, 41 anos. Há pouco mais de um semestre, ele iniciou uma jornada diária de trabalho que inicia às 6h e encerra apenas às 17h. “Eu planejei isso, mas não está sendo bem o que eu esperava. Eu achava que ia ser melhor. O que tô percebendo é que esse trabalho acaba favorecendo mais o aplicativo do que o trabalhador”, considerou, enquanto aguardava a chegada de um passageiro no bairro de Batista Campos. “Não é ruim, mas eu achava que ia ser melhor”.

Entre os fatores que fazem com que o faturamento não seja o esperado, Antônio destaca o alto custo com a manutenção do carro. “O custo é muito alto. Não é nem a gasolina, mas a manutenção do veículo mesmo que é muito alta. Fica até difícil ter uma ideia exata de quanto a gente faz por mês porque tem toda a manutenção que não é barata”.

Com um custo de manutenção menor pelo veículo que utiliza como ferramenta de trabalho, a moto, o motorista Robson Lima, 38, vê mais vantagens do que desvantagens no trabalho mediado por aplicativo. Ele está na área há cinco meses e não pretende voltar para o trabalho com carteira assinada. “Está melhor do que com a carteira assinada”, acredita ele, que era técnico de telecomunicações antes de seguir para a área do transporte de passageiros por aplicativo. “Já me chamaram para voltar a trabalhar como técnico de telecomunicações, com carteira assinada, mas eu não quis”.

Robson conta que, trabalhando de 8h às 11h e de 15h30 às 18h, todos os dias, ele consegue obter uma renda média mensal de R$ 4 mil, valor muito superior ao salário mensal de R$2.145 que ele recebia quando trabalhava no regime celetista. “A moto é mais vantagem que o carro porque o custo de manutenção é bem menor. Hoje as pessoas também estão pegando mais moto do que carro porque o trânsito em Belém está muito fechado e a moto é agilidade”, considera. “Para mim foi melhor. Eu tento fazer disso uma profissão mesmo, tanto que eu mandei fazer o crachá com o QR Code pra pessoa já pagar certinho e não ter risco de enviar pro número errado”.

Robson Lima, 38 anos, moto Uber. Foto: Mauro Ângelo/ Diário do Pará.

Em outra frente de atuação que também cresceu significativamente nos últimos anos, Iarley Martins, 21 anos, trabalha como entregador por aplicativo, rodando sempre de bicicleta. A jornada de trabalho mantida há quatro anos é de 15 horas diárias. “Eu começo 7h e largo só 22h. É uma rotina corrida, mas dá pra fazer uma boa renda”.

Apesar de considerar que o trabalho como entregador ainda é vantajoso, Iarley avalia que quando ele iniciou na área, em 2020, o cenário era mais favorável do que o visto hoje. “Antigamente era melhor. A gente fazia uma renda melhor. Hoje tem muito entregador na rua e aí diminuiu a renda. Ainda dá pra fazer, mas antes era mais”.

PANORAMA

CONFIRA ALGUNS DOS NÚMEROS EVIDENCIADOS PELA PESQUISA

l Entre os motoristas autônomos no setor de transporte de passageiros (não incluídos os mototaxistas), a proporção de trabalhadores com jornadas entre 49 e 60 horas semanais passou de 21,8% em 2012 para 27,3% em 2022.

l Em 2015, pouco menos da metade dos motoristas de passageiros (47,8%) contribuía com a previdência, percentual que despencou para somente 24,8% em 2022.

l Após 2018, quando o estudo aponta que houve um crescimento expressivo de pessoas na atividade de entregadores por aplicativo, houve retração da proporção de trabalhadores com jornadas entre 40 e 44 horas e aumento da quantidade dos que atuavam por mais de 49 horas semanais.

l A contribuição previdenciária dos entregadores plataformizáveis não formais também caiu: entre 2012 e 2018, 31,1% deles contribuíam, enquanto de 2019 a 2022 essa média se reduziu para 23,1%.

Fonte: Estudo ‘Plataformização e Precarização do Trabalho de Motoristas e Entregadores no Brasil’ – 77ª edição do Boletim Mercado de Trabalho – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).