Uma investigação conduzida por jornalistas britânicos revelou a existência de uma rede global dedicada à produção e disseminação de conteúdos envolvendo a tortura de gatos. O material, compartilhado em plataformas de mensagens criptografadas, inclui vídeos e imagens extremamente perturbadores, que mostram animais sendo feridos, mutilados e mortos de forma cruel.
De acordo com os repórteres, a rede possui milhares de membros ativos em diversos países, incluindo o Reino Unido. O conteúdo, segundo ativistas, é produzido com o objetivo de chocar, alimentar fantasias sádicas e, em alguns casos, ser vendido ou trocado entre usuários.
A apuração começou após um caso que chocou o norte de Londres: dois adolescentes foram presos por matar dois filhotes de gato em um parque. A partir desse episódio, surgiram indícios de conexões com uma rede mais ampla, que estaria aliciando novos membros e incentivando atos de crueldade em troca de status dentro dos grupos.
Conteúdo produzido sob anonimato e compartilhado
Grande parte desse material é gerado em segredo e distribuído em canais restritos de comunicação. Em grupos privados, membros trocam informações sobre como capturar animais, e até discutem formas de adotar gatos por meio de ONGs — como a RSPCA, no Reino Unido — com a intenção de maltratá-los.
Ativistas do grupo Feline Guardians, que monitoram esse tipo de conteúdo há anos, relataram ter identificado 24 grupos ativos somente entre maio de 2023 e maio de 2024. Um dos maiores contava com mais de mil participantes. Um dos usuários mais ativos teria documentado mais de 200 atos de tortura.
Segundo os investigadores, alguns dos conteúdos são tão extremos que sequer puderam ser exibidos ou detalhados publicamente. Há registros de gatos sendo afogados, eletrocutados e privados de comida, além de relatos de métodos cruéis utilizados para prolongar o sofrimento dos animais.
Crianças e adolescentes também estariam envolvidos
O aspecto mais alarmante, segundo os especialistas, é a presença de menores de idade nos grupos. Em uma das mensagens acessadas, uma criança afirma ter 10 anos e gostar de maltratar gatos. Também foram encontradas evidências de competições macabras promovidas entre membros — como uma disputa para ver quem conseguiria matar 100 gatos mais rapidamente.
Origem e expansão do fenômeno
Esse tipo de conteúdo teria surgido na China em 2023, onde os primeiros vídeos viralizaram nas redes sociais locais. Um dos criadores, que chegou a ser detido pelas autoridades por um breve período, acabou se tornando referência para outros usuários ao redor do mundo. Hoje, as práticas se espalham por grupos na Europa, Ásia e América Latina.
Alguns dos canais utilizados pela rede se autodenominam “comunidades de amantes de gatos” — uma fachada para ocultar o conteúdo cruel. Para entrar nesses espaços, os interessados precisam comprovar, com vídeos próprios, que já participaram de atos semelhantes.
Denúncias e pressão por ações concretas
Ativistas que se infiltraram nos grupos relatam o impacto psicológico causado pelo contato com esse universo. Uma voluntária que pediu anonimato afirmou ter se sentido emocionalmente destruída ao se deparar com a crueldade contínua. Ela também ajudou a rastrear um dos administradores dos fóruns, localizado em Tóquio. Ao ser contatado, o suspeito negou qualquer envolvimento.
Lara, uma das representantes da Feline Guardians, diz que a falta de legislação específica em alguns países, como a China, facilita a impunidade desses crimes. “Esses vídeos são publicados abertamente e vistos por pessoas no mundo inteiro, inclusive crianças. Isso está criando uma nova geração insensível à violência”, alertou.
A organização vem pressionando autoridades internacionais a adotarem medidas concretas contra os grupos. Protestos já foram realizados em frente à embaixada chinesa em Londres, cobrando a criação de leis que coíbam o abuso de animais.
“É inaceitável”, diz RSPCA
A Sociedade Real para Prevenção da Crueldade contra Animais (RSPCA), uma das principais entidades britânicas de proteção animal, declarou que atos como esses não devem ser tolerados em nenhuma sociedade civilizada.
A parlamentar britânica Johanna Baxter, presidente do grupo parlamentar que trata de temas ligados aos gatos, classificou a situação como “extremamente preocupante”, especialmente pelo envolvimento de jovens.
“O abuso contra animais pode ser o primeiro passo para comportamentos ainda mais perigosos. É um alerta para governos, autoridades e famílias”, afirmou Baxter. (Com informações da BBC)