IGREJA

Mundo vê 'sucessivas guerras' com cumplicidade, diz papa em nova encíclica

Em um mundo que vive "sucessivas novas guerras", é de se pensar que a sociedade esteja perdendo o coração.

Em um mundo que vive "sucessivas novas guerras", é de se pensar que a sociedade esteja perdendo o coração.
Em um mundo que vive "sucessivas novas guerras", é de se pensar que a sociedade esteja perdendo o coração.

Em um mundo que vive “sucessivas novas guerras”, é de se pensar que a sociedade esteja perdendo o coração. Essa é uma das razões para o tema escolhido pelo papa Francisco para a sua nova encíclica, dedicada ao Sagrado Coração de Jesus, como forma de instigar os católicos a renovarem a devoção e a fé.

A carta, chamada de “Dilexit nos” (ele nos amou), foi divulgada nesta quinta (24), no Vaticano. Com 220 parágrafos, é a quarta encíclica de Francisco, 87, sendo que a primeira foi assinada junto com o antecessor, Bento 16, no primeiro ano de papado, em 2013.

“Assistindo a sucessivas novas guerras, com a cumplicidade, a tolerância ou a indiferença de outros países, ou com simples lutas de poder em torno de interesses de parte, podemos pensar que a sociedade mundial está perdendo o seu coração”, escreveu o papa, sem mencionar nenhum conflito ou país diretamente.

Além de guerras, Francisco cita “desequilíbrios socioeconômicos, o consumismo e o uso anti-humano da tecnologia” como mazelas que comprovam a necessidade de os católicos recuperarem a importância do coração, entendido como a parte mais íntima dos seres humanos, centro espiritual, “onde são forjadas as decisões importantes”, o lugar da sinceridade.

Em outro trecho, o papa afirma que “só a partir do coração é que as nossas comunidades serão capazes de unir e pacificar os diferentes intelectos e vontades”. “O Coração de Cristo é êxtase, é saída, é dom, é encontro. N’Ele tornamo-nos capazes de nos relacionarmos uns com os outros de forma saudável e feliz.”

Ao comentar o texto em entrevista coletiva, o arcebispo e teólogo italiano Bruno Forte foi mais explícito sobre as guerras a que o papa faz referência. “Neste tempo dramático que estamos vivendo, marcado pela tragédia da torturada Ucrânia, por aquilo que está acontecendo na Terra Santa, essa encíclica nos aparece como um desafio para olhar para cima, em busca de vias onde não basta simplesmente a lógica do mais forte”, afirmou. “É preciso entender o drama que inúmeras pessoas estão vivendo e enfrentá-lo com escolhas corajosas, às vezes aparentemente derrotadas, mas que sejam para o bem de todos.”

Diferentemente das duas encíclicas anteriores, “Laudato si”, de 2015, sobre a crise ambiental, e “Fratelli tutti”, de 2020, com apelos à fraternidade em meio à pandemia do Covid-19, a de hoje se distancia de temáticas sociais para se dedicar a indicações mais espirituais.

Ao longo do texto, no entanto, são mencionadas questões contemporâneas, como inteligência artificial, celulares, redes sociais, algoritmos e o consumismo. “O algoritmo que atua no mundo digital mostra que os nossos pensamentos e as decisões da nossa vontade são muito mais ‘standard’ do que pensávamos. São facilmente previsíveis e manipuláveis. Não é o caso do coração.”

Nas conclusões, afirma que atualmente parece que “o próprio sentido da dignidade depende das coisas que se podem obter com o poder do dinheiro”. “Somos instigados a acumular, a consumir e a distrairmo-nos, aprisionados por um sistema degradante que não nos permite olhar para além das nossas necessidades imediatas e mesquinhas”, escreveu Francisco.

O pontífice não deixou de fora a própria Igreja, que vive a expectativa do fim do Sínodo da Sinodalidade, cujo documento final é esperado para o próximo sábado (26), depois de quatro anos de seu anúncio pelo papa. Para Francisco, a Igreja não deve “substituir o amor de Cristo por estruturas ultrapassadas, obsessões de outros tempos, adoração da própria mentalidade, fanatismos de todo o gênero que acabam por ocupar o lugar daquele amor gratuito de Deus que liberta, vivifica, alegra o coração e alimenta as comunidades”.