
Um gigantesco e duradouro relâmpago com 829 km de extensão acaba de estabelecer um recorde no planeta Terra. Acaba é modo de dizer, porque o relâmpago na verdade aconteceu em outubro de 2017. Apesar disso, o recorde foi confirmado só nesta quinta-feira (31) pela WMO (Organização Meteorológica Mundial).
É o fenômeno chamado megaflash. Segundo a American Meteorological Society, é um raio contínuo com comprimento horizontal de cerca de 100 km ou mais. Devido às longas distâncias, usualmente os megaflashs também têm longas durações, a partir de cinco segundos.
As distâncias enormes percorridas pelos megaflashes exigem também durações longas de raio, geralmente de cinco segundos ou mais.
O fenômeno ocorreu nos Estados Unidos, do Texas até Kansas. Para termos de comparação, uma viagem de carro de São Paulo até Goiânia pode percorrer pouco mais de 900 km. Esse tipo de distância pode se traduzir em percursos de carro de cerca de nove horas ou mais de uma hora em uma viagem de avião.
O novo recorde foi publicado no Bulletin of the American Meteorological Society. Segundo a publicação, a margem de erro do registro é de cerca de 8 km para mais ou menos.
Antes, o valor máximo para um fenômeno do tipo era de 768 km (novamente com uma margem de erro de mais ou menos 8 km), no sul dos EUA, entre o Texas e o Mississippi, em 2020.
O novo megaflash recorde ocorreu nas Grandes Planícies da América do Norte, um local propício, segundo a WMO, para a ocorrência desse tipo de fenômeno.
Como você deve ter percebido, o novo recorde na verdade é de um momento anterior ao recorde até então vigente. Segundo a WMO, houve uma reanálise que levou os pesquisadores a achar a tempestade e o megaflash em questão.
Marcelo Saba, pesquisador do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), diz que os raios são formados por uma descarga que se propaga, começando normalmente dentro de nuvens e eventualmente podendo chegar ao solo. “Cargas elétricas na nuvem que propulsionam, vamos dizer assim, essa descarga que continua se propagando. Se a nuvem é bastante extensa, horizontalmente, ela vai dar chances a que ocorram essas descargas [longos e duradouros raios]”, diz o cientista do Inpe.
A documentação desse gigantesco raio ocorreu graças a satélites geoestacionários da NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration) que fazem mapeamento de raios, tais quais os GOES-16, 17, 18, e 19. Além desses, essa área de estudo também conta o europeu MTG (Meteosat Third Generation) e o chinês (FY-4 Lightning Mapping Imager).
“É difícil de estudar os extremos do que os relâmpagos são capazes porque ultrapassam os limites do que podemos observar na prática”, disse, em nota de divulgação, Michael J. Peterson, do Centro de Pesquisa de Tempestades Severas (SSRC) do Instituto de Tecnologia da Geórgia, nos EUA, e autor principal da nova documentação de recorde.
Anteriormente, tais tipos de medições se baseavam em sistemas de sensores instalados em solo.
“Adicionar medições contínuas a partir da órbita geoestacionária foi um grande avanço. Estamos agora em um ponto onde a maioria dos pontos críticos de megaflashs globais está coberta por um satélite geoestacionário, e as técnicas de processamento de dados melhoraram para representar adequadamente os relâmpagos na vasta quantidade de dados observacionais em todas as escalas”, disse Peterson.
Apesar de soar como medição aleatória de um recorde, a WMO alerta para os riscos que esse tipo de fenômeno aponta. Basicamente, é uma amostra das enormes distâncias que um raio percorre em poucos segundos.
Walt Lyons, parte do comitê da WMO que analisa tais fenômenos, afirma que prédios são os locais mais seguros para se proteger de raios. Em segundo lugar estão veículos fechados.
Durante o recente Mundial de Clubes chamou a atenção jogos sendo paralisados por prevenção, por causa de tempestades nas áreas próximas.
RAIOS E TROVÕES!
O Brasil é campeão de incidência de raios no mundo. E também, até recentemente, detinha o registro do megaflash recordista em distância.
Em 31 de outubro de 2018, um raio com 709 km de comprimento atravessou o Sul do Brasil, estendendo-se do oceano até a Argentina.
Em 4 de março do ano seguinte, outro recorde se fez, dessa vez em relação à duração de um megaflash. Na nossa vizinha Argentina (lar de algumas das mais fortes tempestades elétricas), na região de Córdoba, um megaflash durou 16.730 segundos.
O recorde brasileiro durou até 29 de abril de 2020, e o argentino, até 18 de junho de 2020, mas permaneceu próximo a onde estava. A nova duração recordista (17.102 segundos) ocorreu na fronteira de Argentina e Uruguai.
Saba, porém, questiona o impacto científico desse tipo de fenômeno e classificação. “É uma curiosidade. Não é algo que tenha uma importância científica”, diz.
PHILLIPPE WATANABE