Um dos principais opositores do ditador Nicolás Maduro, o venezuelano Leopoldo López, 53, afirma acreditar que a eleição de Donald Trump possa ser uma boa notícia para seu país.
“A política dos democratas para a Venezuela foi um fracasso”, disse López à Folha de S.Paulo em Lisboa, onde participou do Web Summit.
“A prioridade de [Joe] Biden não era a democracia, mas garantir uma fonte confiável de energia e estancar a imigração. Não conseguiu nem uma coisa nem outra. Espero que agora se usem todas as ferramentas que permitam pressionar os que roubaram as eleições e saquearam os recursos dos venezuelanos.”
López diz que gostaria de ver os EUA liderando uma coalizão que incluísse em posições-chave o Brasil, na América Latina, e a Espanha, na Europa.
“A atitude de Lula em não reconhecer a vitória de Maduro foi importante, dado o fato de o Brasil ser a maior democracia da região e toda a história de afinidade ideológica entre Maduro, Chávez e Lula.”
Seria possível uma coalizão entre governos de orientações tão distintas quanto Lula e o espanhol Pedro Sánchez, de um lado, e Trump, de outro? “Requereria todo um esforço diplomático, mas o que aconteceu na Venezuela não é uma questão de esquerda ou direita, mas de luta pela democracia.”
Entenda o caso
Maduro decretou a própria vitória nas eleições ocorridas em julho deste ano. As Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos e a União Europeia, além de vários outros países, incluindo o Brasil, não reconheceram o resultado, devido a vários indícios de fraude eleitoral. O Parlamento Europeu e os Estados Unidos deram um um passo além e reconheceram Edmundo González, o candidato que concorreu contra Maduro, como o vencedor do pleito.
No evento do Web Summit, feira de tecnologia que inclui temas políticos em conexão com o mundo digital, López participou de uma mesa junto com Iulia Navalnaia, viúva de Alexei Navalni, o opositor de Vladimir Putin que morreu no início deste ano numa prisão em seu país. O tema central do debate foi a colaboração internacional entre líderes autoritários.
Na entrevista dada depois da mesa, López detalhou como se dá essa colaboração.
“Em 2007 a Venezuela se tornou aliada militar da Rússia e começou a importar fuzis AK-103. Hoje a maior parte do armamento militar venezuelano vem da Rússia, incluindo a defesa antiaérea”.
Segundo ele, a ditadura de Maduro também recebe assessoria do governo iraniano. “Eles orientaram os venezuelanos sobre como lidar com sanções internacionais.”
De acordo com López, essa colaboração também é forte na área de tecnologia. “Rússia e China venderam a Maduro equipamentos de reconhecimento facial. Eles foram utilizados para prender opositores do regime que participaram de manifestações, incluindo menores”, diz López. Ele se refere à destruição de dezenas de estátuas de Hugo Chávez espalhadas por várias cidades venezuelanas, ato de vandalismo que Maduro resolveu punir de maneira exemplar.
López é um opositor do chavismo há mais de 20 anos. Ele participou de um golpe fracassado contra Chávez em 2002, teve seus direitos políticos cassados e chegou a ser um dos presos políticos do regime. Faz parte de uma família tradicional de empresários e políticos da Venezuela e é fundador do partido Vontade Popular, de centro-direita. Hoje passa boa parte do ano em Madri, para onde também emigrou Edmundo González.