Nos bastidores da diplomacia entre Brasil e Estados Unidos, um ator brasileiro tem chamado a atenção: a gigante do agronegócio JBS. A recente aproximação entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente norte-americano Donald Trump, marcada por um gesto amistoso durante a Assembleia Geral da ONU, não aconteceu em um vácuo político.
Analistas e fontes ligadas ao mercado apontam que executivos da JBS podem estar desempenhando um papel importante como intermediários informais nesse diálogo, atuando para suavizar tensões e abrir canais de confiança entre os dois líderes.
A relação da JBS com Trump não é nova. Em abril deste ano, a subsidiária da JBS, a Pilgrim’s Pride fez a maior doação – um total de US$ 5 milhões – para a cerimônia de posse de Donald Trump, segundo informa o relatório apresentado à Comissão Federal Eleitoral (FEC, na sigla em inglês).
A empresa é uma das maiores produtoras de aves do mundo – quase 1 em cada 6 frangos nos EUA vem da Pilgrim’s, segundo site da empresa. O valor foi considerado elevado e superou as contribuições de algumas das maiores empresas americanas.
O gesto gerou questionamentos sobre possíveis benefícios regulatórios ou acesso privilegiado junto ao governo republicano. Na época, a JBS buscava expandir seu espaço no mercado norte-americano e reduzir pressões sobre questões ambientais e sanitárias que afetavam sua operação global.
Em abril deste ano, a tentativa da JBS de listar suas ações na Bolsa de Nova York (NYSE) enfrentou resistência de ambientalistas e parlamentares norte-americanos, que pediram maior rigor regulatório.
Um mês depois, em maio, a JBS conseguiu maioria na assembleia de acionistas para aprovar a chamada “dupla listagem” de suas ações — essencialmente, passar a ser listada na Bolsa de Nova York.Em 25 de junho, o fundador da JBS, José Batista Sobrinho pode, finalmente, tocar o sino da Bolsa de Valores de Nova York (NYSE), marcando a entrada da empresa no mercado de ações dos Estados Unidos.
ENCONTRO NA CASA BRANCA
Uma informação divulgada pelo jornal Folha de S.Paulo e confirmada por outras fontes, revela uma reunião entre Joesley Batista e Donald Trump, realizada há cerca de três semanas na própria Casa Branca. Segundo relatos, o encontro foi reservado e contou com a presença de assessores de alto escalão. Os executivos brasileiros conseguiram furar o bloqueio da Casa Branca e conversar com autoridades tanto do Departamento de Estado quanto do Departamento de Comércio.
Um dos principais temas tratados foi o chamado “tarifaço”, a imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros anunciada por Trump em julho, após ter sido “convencido” pela dupla Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo, de que o Brasil violaria convenções de direitos humanos ao condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Durante a conversa com Trump, dentro da Casa Branca, representantes da J&F argumentaram que a medida poderia gerar forte impacto sobre os consumidores americanos, especialmente os de classes mais baixas, que consomem produtos como hambúrgueres, recheios de tacos e almôndegas — itens que teriam aumento imediato de preço com a taxação.
Para se ter uma ideia da dimensão do grupo, a JBS conta atualmente com 75 mil funcionários nos Estados Unidos e 180 mil no Brasil. Em território norte-americano, a empresa atua em diversas frentes, incluindo carne bovina, frango, suínos e alimentos processados, como salsichas e salames. É um peso econômico expressivo que garante à companhia poder de negociação e influência política.
Foi com esse cacife econômico e estratégico que os executivos da J & F, holding controladora da JBS, conseguiram furar o bloqueio inicial da Casa Branca e abrir diálogo direto com autoridades tanto do Departamento de Estado quanto do Departamento de Comércio dos EUA.
Os irmãos Wesley e Joesley Batista, controladores da empresa, são figuras conhecidas por sua forte presença política no Brasil. Ao longo dos anos, os Batista mantiveram contato próximo com figuras influentes em Brasília e no exterior.
Em abril de 2024, o presidente Lula reaproximou-se publicamente dos empresários, num gesto interpretado como estratégico, dada a relevância da JBS como uma das maiores exportadoras de proteína animal do mundo e uma empresa com forte presença nos Estados Unidos. Esse contexto ajuda a explicar por que, mesmo após semanas de atritos, Lula e Trump deram sinais de reconciliação em Nova York.
O encontro amistoso na ONU surpreendeu diplomatas e analistas. Trump chegou a anunciar publicamente que tinha uma “excelente química” com Lula e que os dois se encontrariam pessoalmente para tratar de comércio e cooperação. O clima cordial foi bem recebido pelo mercado e trouxe alívio a setores exportadores brasileiros que temiam prejuízos bilionários com as tarifas.
Apesar desses encontros e articulações não terem ainda sido confirmados, há fatos concretos que reforçam a suspeita como a doação bilionária feita pela empresa no passado e o histórico de articulações políticas dos irmãos Batista.
Seja qual for o grau de influência, o episódio mostra como corporações globais brasileiras, como a JBS, são capazes de movimentar peças no tabuleiro político internacional. Para Lula, o gesto de aproximação com Trump representa uma oportunidade de reduzir tensões comerciais e preservar os interesses do Brasil no mercado norte-americano. Para Trump, pode significar o fortalecimento de laços com um parceiro estratégico na América do Sul. E para a JBS, significa estar no centro de uma negociação que mistura negócios, diplomacia e poder.