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Calor castigou mais de 3 bilhões de pessoas no mundo em 2024

Entenda os efeitos do calor recorde em 2024. Saiba como a população mundial foi afetada pelas altas temperaturas.

Nunca tanta gente foi exposta a calor recorde quanto em 2024.
Nunca tanta gente foi exposta a calor recorde quanto em 2024. Foto: Celso Rodrigues

Nunca tanta gente foi exposta a calor recorde quanto em 2024. Estudo do centro climático americano Berkeley Earth mostrou que, em 2024, 3,3 bilhões de pessoas – 40% da população mundial – experimentaram uma média anual sem precedentes de calor. Nesse total está a população de Brasil, Paraguai, México, Coréia do Sul e de outros 100 países, considerados os mais afetados.

O Brasil, segundo o Berkeley Earth, um dos centros climáticos globais de referência, aqueceu 1,8°C acima da média do período pré-industrial. O Canadá esquentou 3,1°C, mas como ele é naturalmente mais frio que o Brasil, a população sofreu menos o impacto do calor.

Já no Brasil e em outros países sul-americanos com aumentos expressivos, como Bolívia (2,1°C) e Paraguai (1,9°C), essa elevação na média significou termômetros acima dos 35°C com frequência.

O México, que ficou 1,4°C acima da média do período pré-industrial, ficou 70 dias seguidos com o termômetro acima dos 37°C, calor suficiente para fazer macacos caírem mortos dos galhos e hospitais lotarem de gente passando mal.

O Berkeley Earth destacou que condições particularmente extremas foram observadas nas Américas Central e do Sul, na África, em partes da Ásia, na Europa Oriental. O calor extremo também atingiu dois terços da população da China e um terço da dos Estados Unidos.

Além de afetar diretamente as pessoas, o calor é combustível para extremos, como os incêndios florestais de grande magnitude, a exemplo dos que atingiram ano passado o Brasil e agora consomem bairros inteiros de Los Angeles e cidades vizinhas na Califórnia.

Na esteira do Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus (C3S), a agência europeia do clima, a Organização Mundial de Meteorologia (OMM) e demais grandes centros climáticos internacionais de estudo do clima, como as americanas Nasa, Noaa e Berkeley Earth, divulgaram suas análises de 2024 ontem e confirmam 2024 como o ano mais quente da História.

Também foi o primeiro ano em que o patamar de aumento de 1,5°C na temperatura média da Terra em relação ao período pré-industrial foi superado. Porém, o valor calculado pelas agências flutuou. Para a OMM, foi 1,55°C. A Berkeley Earth mediu uma elevação de 1,62°C.

A Nasa e a Noaa consideraram que o aumento flutuou entre 1,47°C e 1,57°C ao longo do ano, menos que os 1,6°C apontados anteontem pelo Copernicus. Não fecharam um número, mas afirmaram ser impossível que seja menor do que 1,5°C.

Já a nova DCENT, da Universidade de Southampton, no Reino Unido, que usa IA para produzir uma linha de base histórica, calculou um aumento de 1,66°C.

– A OMM prova mais uma vez que o aquecimento global é um fato claro e incontestável. Anos individuais ultrapassando o limite de 1,5°C não significam que a meta de longo prazo está perdida. Significa que precisamos lutar ainda mais para voltar ao caminho certo. Temperaturas extremas em 2024 exigem ações climáticas pioneiras em 2025. Ainda há tempo para evitar o pior. Mas os líderes precisam agir agora – declarou o secretário-geral da ONU, António Guterres.

Os cientistas utilizam grande parte dos mesmos dados de temperatura em suas análises. No entanto, usam metodologias e modelos diferentes. Mas todos mostram a mesma tendência de aquecimento contínuo do planeta.

Por consenso, cientistas afirmam que a causa principal de tanto calor foi o acúmulo na atmosfera de gases-estufa oriundos de atividades humanas. O forte El Niño pesou, mas sozinho não explica tamanha elevação da temperatura.

A Nasa destacou que em 2022 e 2023 houve aumentos recordes nas emissões de combustíveis fósseis. A concentração de dióxido de carbono na atmosfera aumentou dos níveis pré-industriais de aproximadamente 278 partes por milhão para cerca de 420 partes por milhão hoje.

Duo Chan, um dos criadores do DCENT, observou que um ano não basta para que o patamar de 1,5°C acima da média do período pré-industrial, estabelecido pelo Acordo de Paris, seja inviabilizado. Mas ele e outros cientistas concordam que é cada vez mais provável que o aquecimento dos próximos anos faça com que esse limite não seja mais possível.

O limite de 1,5°C é, sobretudo, político. Foi incluído no Acordo de Paris para atender às preocupações de que uma meta anterior de limitar o aquecimento a 2°C não protegeria os países mais vulneráveis.

Katharine Hayhoe, cientista-chefe da Nature Conservancy nos EUA, explicou que isso não significa que o mundo esteja seguro abaixo de 1,5 °C, nem que tudo irá acabar se for ultrapassado. Cada fração de grau extra faz diferença.

O ano passado foi muito mais quente do que o esperado, salientou Zeke Hausfather, cientista líder do Berkeley Earth. Os climatologistas haviam projetado que o início de 2024 seria quente devido ao El Niño. Mas achavam que as temperaturas cairiam após o fim dele, no início de junho.

Mas isso não ocorreu. Ao contrário, o termômetro continuou a bater recordes. “Todos nós que fizemos projeções no início do ano subestimamos o quão quente 2024 seria”, afirmou Hausfather à Nature.

Em 2024, 95,2% da superfície da Terra estavam significativamente mais quentes do que a temperatura média durante 1951-1980, 4,6% estavam com temperatura semelhante, e apenas 0,2% ficou significativamente mais fria. Nenhuma parte do planeta teve uma média anual recorde de frio em 2024.

Embora a disponibilidade de termômetros limite as medições diretas anteriores a 1850, evidências indiretas sugerem que a Terra está em sua temperatura média global mais quente desde o último período interglacial, há cerca de 120 mil anos. A temperatura atual cada vez mais se assemelha aos períodos mais quentes do planeta.

A elevação abrupta das temperaturas em 2023 e 2024 é o maior aumento de dois anos desde a década de 1870. Climatologistas investigam se é um evento isolado ou se marca uma mudança no sistema climático da Terra, o que significaria que o aquecimento global está acelerando.

A La Niña fraca recém-formada no Oceano Pacífico deve aliviar um pouco a temperatura. Mesmo assim, tanto a Nasa quanto o Berkeley Earth projetam que o mais provável é que 2025 seja o terceiro ano mais quente desde 1850, com temperatura inferior apenas às de 2023 e 2024.

Texto de: Ana Lucia Azevedo (AG)