LENDA OU REAL?

A mulher que virou papa? A lenda da Papisa Joana

Embora os registros oficiais do Vaticano apontem que todos os mais de 260 papas da história tenham sido homens, uma antiga lenda medieval desafia essa narrativa.

uma mulher teria conseguido se infiltrar na hierarquia da Igreja e assumido o trono papal por um breve período no século IX.
uma mulher teria conseguido se infiltrar na hierarquia da Igreja e assumido o trono papal por um breve período no século IX. Foto: Biblioteca Nacional da França

Embora os registros oficiais do Vaticano apontem que todos os mais de 260 papas da história tenham sido homens, uma antiga lenda medieval desafia essa narrativa. Segundo essa história, uma mulher teria conseguido se infiltrar na hierarquia da Igreja e assumido o trono papal por um breve período no século IX.

Conhecida como Papisa Joana, ela teria se disfarçado de homem, adotado o nome de João VIII e, surpreendentemente, sido eleita como líder da Igreja Católica. Sua verdadeira identidade teria vindo à tona de forma dramática: durante uma procissão em Roma, ela entrou em trabalho de parto e deu à luz uma criança diante da multidão.

O episódio teria causado enorme escândalo. De acordo com diferentes versões da lenda, Joana morreu no parto ou foi brutalmente executada por cidadãos indignados, arrastada pelas ruas e apedrejada até a morte.

A história ganhou força a partir do século XIII, mais de 300 anos após o suposto acontecimento. Aparece em crônicas de frades dominicanos como Jean de Mailly e Stephen de Bourbon, e foi mencionada também por Giovanni Boccaccio no século XIV, em sua obra sobre mulheres notáveis. A figura da papisa foi representada em pinturas, esculturas e até cartas de tarô, além de ter sido brevemente incluída entre os bustos papais da Catedral de Siena, na Itália.

No entanto, não há provas concretas de que Joana realmente existiu. Não foram encontrados registros contemporâneos que mencionem uma mulher no papado durante o século IX. Além disso, o período em que ela teria reinado coincide com pontificados historicamente documentados de Leão IV (847–855) e Bento III (855–858), o que torna improvável a existência de um pontífice oculto nesse intervalo.

Ainda assim, alguns estudiosos, como o egiptólogo Michael E. Habicht, sugerem que moedas antigas poderiam indicar a presença de uma figura feminina na liderança da Igreja. No entanto, a maioria dos especialistas considera a história da Papisa Joana como um mito — uma fábula que reflete as tensões sociais e políticas da Idade Média.

Para muitos historiadores, a lenda tem caráter satírico e crítico. Teria surgido como forma de questionar ou ridicularizar a autoridade da Igreja em um período marcado por contestação e crise institucional. Uma mulher no trono papal, mesmo que apenas em lenda, simbolizava uma inversão radical da ordem estabelecida.