O ponta, secular instituição do futebol hoje quase extinta nas modernas configurações táticas dos times, de vez em quando ressurge em grande estilo, mostrando importância e utilidade. Dizia-se antigamente que o caminho mais curto em direção ao gol passava pelas extremas. Sempre foi verdade, mas alguns insistem em mudar a métrica das coisas.
Eis que o Re-Pa de sábado restituiu a glória dos pontas na figura do novato Maurício Garcez, 28 anos, arisco ponteiro esquerdo designado por Claudinei Oliveira para segurar o lateral-direito Marcelinho em seu campo e matar na origem uma das mais letais jogadas do Remo na Série B.
A estratégia funcionou muito bem. O maranhense Garcez quase abriu o placar antes dos 15 minutos de jogo, com um cabeceio maroto tentando pegar o goleiro Marcelo Rangel no contrapé. O gol só não aconteceu porque Rangel se esticou e tocou com a ponta dos dedos.
Seria também de Garcez, ainda no 1º tempo, uma insinuante manobra na área pela esquerda. Depois de driblar um marcador, ele desferiu chute forte e rasteiro no canto direito do gol. Marcelo Rangel defendeu no susto e a defesa espanou a bola para escanteio.
Foram ações que deram ao PSC o protagonismo ofensivo no clássico, com efeito de abatimento sobre o adversário, que preferia trocar passes longe da área. Garcez rompeu com o que rotineiramente iria acontecer: um atacante avançado brigando com o lateral do Remo, mas sem aprofundar jogadas. Foi assim nos outros clássicos da temporada.
Desta vez, a combinação perfeita entre a observação do treinador e as caraterísticas do atacante resultou no principal toque de diferenciação, atrapalhando os planos do Remo de explorar o corredor lateral direito, por onde o Leão construiu mais da metade de seus gols na Série B.
Garcez havia entrado contra o Botafogo-SP, na Curuzu, jogando por apenas 20 minutos e contribuindo para a primeira vitória do Papão no campeonato. Para todos os efeitos, porém, a estreia de verdade aconteceu no clássico, diante de 45 mil pessoas presentes ao Mangueirão.
Rossi e Diogo Oliveira também foram destaques do PSC, mas coube a Garcez desempenhar um papel tático diferenciado, exibindo técnica e habilidade nos duelos individuais com os marcadores.
E mais: a boa envergadura permite que possa aparecer centralizado na área, quando necessário. Olha, é cedo ainda para avaliações definitivas, mas a impressão deixada foi a melhor possível.
Mundial está servindo para reconhecer grandezas
Coube a um argentino, torcedor do Boca Juniors, dizer na internet uma verdade que muitos esquecem, no afã de babar ovo dos grandes times europeus e desqualificar os clubes brasileiros, principalmente o Botafogo, alvo preferencial desse esquecimento seletivo.
“Botafogo jogava no Maracanã com Garrincha para 100 mil pessoas antes da existência do PSG. Literalmente, o PSG não existia. Está vencendo o clube grande e com história”, afirmou o perfil @amarelo12 quando a partida entre o Glorioso e os franceses estava no 2º tempo.
Na tarde de ontem, no Rose Bowl (Pasadena), o Fogão enfrentou e eliminou o Atlético de Madrid, terceiro clube espanhol. Podia perder por três gols de diferença, mas controlou o setor defensivo no 1º tempo, mas cansou e cometeu falha que permitiu o gol do adversário.
É preciso, porém, focar na grandeza da campanha botafoguense nesta Copa. Enfiado na pior chave do torneio, o chamado “grupo da morte”, com cara de patinho feio diante do campeão e bicho-papão europeu, o Glorioso mostrou a força de campeão da América e eliminou um dos favoritos.
O descrédito é tão disseminado que muitas vezes contamina os próprios torcedores, mas o Botafogo tem a incrível capacidade de desafiar o coro dos contentes e pregar surpresas a quem insiste nas obviedades.
Só compra quem não conhece
Abel Ferreira, famoso pelas carraspanas em repórteres e árbitros brasileiros, anda a desfilar um estilo inteiramente terno e afável na Copa do Mundo de Clubes disputada nos Estados Unidos. O lado pragmático falou mais alto e a rispidez foi deixada de lado diante da exposição pública para torcidas e imprensa do mundo inteiro.
Na estreia, diante do Porto, ele levou um cartão amarelo ao espinafrar a arbitragem. Depois disso, recolheu o galho e deixou fluir um jeitão mais simpático. Chegou mesmo a derramar lágrimas de emoção durante uma entrevista, coisa bem diferente dos coices verbais que distribui nas coletivas pós-jogo quando o seu time perde.
Aliás, no futebol brasileiro, Abel pressiona os árbitros pelo menos uma dúzia de vezes ao longo dos jogos, vociferando xingamentos, tentando intimidar sempre. É óbvio que funciona, pois ele segue impune por aqui.
Na tal entrevista lacrimejante, ele chegou a esboçar uma explicação para o jeito casca-grossa, dando a entender que é uma questão de temperamento mais explosivo. Na verdade, o perfil exibido no Mundial da Fifa prova justamente o contrário: a grosseria é controlada, sempre que convém.
A curiosidade agora é para ver como Abel irá se comportar no Brasil após este doce idílio em terras ianques.