TEXTO: TYLON MAUÉS
Poucas pessoas podem ser apontadas como quadrinistas quase perfeitos. Winsor McCay está neste panteão. Dono de um traço detalhista, leve e lindo, ele deixou uma obra máxima na nona arte com “Little Nemo in Slumberland”, HQ que influenciou quase todo mundo que veio depois. O norte-americano Zenas Winsor McCay (1866–1934) criou histórias que pareciam ter vida própria, se mexendo num 3D natural diante dos olhos. Não foi à toa, já que o artista também foi um prodígio da animação quando essa arte ainda engatinhava.
Suas obras já tiveram algumas publicações no Brasil, mas no final do ano passado a editora Figura lançou o primeiro de dois volumes com tudo o que foi publicado na HQ onírica. O volume 1 traz histórias publicadas de 1905 a 1909, e o volume 2 terá as HQ de 1910 a 1914.
O preço é salgado, de R$ 200 a R$ 250, dependendo da loja ou de alguma promoção. Não é fácil desembolsar essa grana pra um livro, por mais que a editora tenha tido um trabalho primoroso e o papel Pólen Bold 90g seja de primeira. A nova tradução é de César Alcázar e os textos de posfácio, de Erico Assis. Quem tiver à disposição essa quantia e curtir quadrinhos, é uma pechincha. A obra pode nem estar à disposição nas poucas livrarias da cidade, obrigando os interessados a buscarem as lojas virtuais.
As tiras eram publicadas em edições dominicais do jornal New York Herald, que dava uma página inteira para o autor desenvolver uma história esquemática e sublime. Nemo (“ninguém”, em latim) quase sempre começava recebendo ordens do Rei Morpheus e, num deleite de narrativa gráfica e ritmo de texto, vivia sua aventura para terminar acordado no último quadro.
Como bem mostrou um grande autor que explorou o mundo dos sonhos no final do século passado, o britânico Neil Gaiman, quando se está dormindo o limite para se sonhar não existe. Por isso as limitações de tiras dominicais em nada diminuem o prazer quase delirante de ler e vislumbrar “Little Nemo”. Pelo contrário, ele só reforça que uma limitação espacial não é nada páreo para a genialidade.
*Tylon Maués escreve sobre quadrinhos em coluna publicada sempre às segundas-feiras, no caderno Você