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"Killer Joe": escalada rumo ao caos e selvageria

O filho que arquiteta a morte da mãe para botar a mão no seguro de vida. Uma doce e ingênua garota entregue ao assassino como garantia sexual pelos próprios pai e irmão. Valores familiares, morais, não existem. Todos estão corrompidos. O único valor que importa é aquele acompanhado por cifras. O dinheiro move o universo criado por William Friedkin em “Killer Joe – Matador de Aluguel” e, a partir dele e em seu nome, vemos todo o tipo de perversão e insanidade a que as pessoas se submetem e são submetidas.

Este filme de 2011 é uma pequena obra-prima com a assinatura de Friedkin, que morreu na última segunda-feira (7) aos 87 anos, e provava mais uma vez, àquela altura, após um limbo com diversas produções irregulares, a sua potência, versatilidade, originalidade e talento vistos em marcos cinematográficos como “O Exorcista”, “Operação França”, “Comboio do Medo” e “Parceiros da Noite”.

Saber chocar, de uns tempos para cá, é uma arte. O mundo mudou. O errado, muitas vezes, virou a norma e o certo algo completamente absurdo de seguir. De pequenas corrupções, como não respeitar leis de trânsito ou usar o celular no cinema, à permissividade com atos violentos e hediondos, até espetacularizados de certa forma, tudo faz parte do cotidiano, cuja presença é tolerada ou mesmo incentivada (lembram de certo governo que tínhamos recentemente?). Sendo assim, restaria nos adaptar e nos precaver para que eles não aconteçam conosco ou com alguém de nosso convívio, além de buscar, claro, uma reação social.

William Friedkin, um dos grandes diretores da história do cinema, morreu nesta semana – Foto: Divulgação

É por isso que, para chocar, o nível de amoralidade deve ser alto. E Friedkin foi ao ponto exato ao distorcer a lógica da proteção familiar: a corrosão é interna, a individualidade se sobrepõe aos laços de sangue e o objetivo é se dar bem, não importa às custas de quem. Nem o humor ácido e mórbido que rege a narrativa atenua a selvageria exposta, pelo contrário. Ele reforça que tais situações, por mais grotescas e surreais que possam parecer, encontram paralelo com a realidade, em que as pessoas têm dificuldade em traçar um limite para os seus instintos primitivos.

O filme não tira o pé do acelerador. É uma escalada rumo ao caos e a cada passo de Joe, interpretado magistralmente por Matthew McConaughey, ou da família Smith, sentimos o perigo iminente, onde tudo poderia acontecer. A psicopatia em todos é latente. E o ato derradeiro não decepciona: absurdo, abrupto e genial, digno de Friedkin, pois se ele fez uma garota possuída se masturbar com um crucifixo na década de 70, basta dizer que agora ele conseguiu transpor tal profanação religiosa para a atmosfera familiar da forma mais banal e controversa possível (vocês vão saber do que estou falando quando assistirem), além de mostrar que ninguém está imune a tanta violência e degradação.

“Killer Joe” é um show de horrores, uma sátira (?) social das mais poderosas e, como tal, incomoda, faz refletir e lança o alerta: é preciso estar vigilante, caso contrário o processo de falência moral da sociedade pode entrar em um estágio irreversível.

ONDE ASSISTIR:

  • Amazon Prime Video
  • Claro Video
  • Pluto TV
  • Apple TV (para aluguel)

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