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HQ autobiográfica desvenda infância conturbada de George Orwell

HQ autobiográfica desvenda infância conturbada de George Orwell

TEXTO: TYLON MAUÉS

“Ninguém pode olhar para a época da escola e dizer com sinceridade que foram dias completamente infelizes”. A passagem do conto “Tantas, Tantas Eram As Alegrias”, de George Orwell (1903 – 1950), mostra bem o que o jovem Eric Blair – nome verdadeiro atrás do pseudônimo do escritor britânico – sentia sobre as reminiscências de sua infância em um colégio interno. Não dava para ser feliz o tempo inteiro.

Escritor de clássicos como “A Revolução dos Bichos” e “1984”, ambos críticos a regimes autoritários, o autor teve uma vida adulta movimentada, indo de policial na Birmânia, cozinheiro em Paris, mendigo em Londres, a operário em minas de carvão. Sua infância ordinária e triste foi escrita e reescrita por ele no conto que resultou na graphic novel de mesmo nome, adaptada por Sean Michael Wilson e desenhada por Jaime Huxtable.

Orwell fez os primeiros rascunhos do conto na adolescência e foi reescrevendo-o ao longo dos anos. Nunca o mostrou a ninguém. Somente três anos após sua morte ele veio a público, ainda sem os nomes verdadeiros dos personagens. Havia o receio de processos dos retratados que ainda estavam vivos. A HQ, lançada no Brasil pelo selo Minotauro, da editora Almedina Brasil, traz os nomes reais.

O relato, como muitos outros feitos sobre colégios internos da Inglaterra, é chocante para os dias atuais. Surras e humilhações nas crianças eram rotineiras. A família do jovem Eric não era abastada, conseguindo uma bolsa numa instituição aristocrática que privilegiava abertamente os nomes importantes em detrimento até dos novos ricos. A violência dos professores e o constrangimento diário são descritos pelos olhos de uma criança, com o texto conseguindo manter boa parte da inocência. O que só ressalta a força da escrita de Orwell, visto que foram décadas de revisão do texto original.

O título retirado do poema “The Echoing Green” (O Verde Ecoante), de William Blake, permeia toda a obra com sua ironia cortante e os sentimentos ambíguos das crianças que, em muitas vezes, acreditavam que aquelas sessões de castigos eram justas. No entanto, justiça ou correção, aqueles momentos nada traziam de alegria nas lembranças do autor.

O livro de 112 páginas tem um tom árido e muitas vezes incômodo, mas as grandezas do texto original e da adaptação quase literal fazem com que a leitura flua com facilidade.