A 8ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP) reconheceu, nesta quarta-feira (30), a existência de vínculo empregatício entre uma mulher que atuou como missionária e a igreja em que seu marido era pastor. Durante cinco anos, a esposa do líder religioso desempenhou funções sem registro formal e recebia remuneração indireta — o que motivou a decisão favorável ao seu pedido de reconhecimento trabalhista
Segundo os autos, a mulher trabalhou de domingo a sexta-feira, cumprindo jornada das 7h às 21h30, com folga apenas aos sábados. Dentre suas atribuições estavam: atendimento aos fiéis e organização da contabilidade da igreja; controle e contabilização de doações; participação obrigatória em reuniões ministeriais; preparação das refeições para pastores e bispos.
Ela também alegou que, embora estivesse grávida em situação de risco, foi transferida para uma cidade sem infraestrutura médica adequada, o que teria contribuído para o nascimento prematuro de seu filho.
Elementos que definiram a relação de emprego
Ao reformar a decisão de 1ª instância, a relatora, desembargadora Adriene Sidnei de Moura David, concluiu estar comprovada a presença dos requisitos da relação de emprego: subjetividade, habitualidade, onerosidade e subordinação.
Reconhecimento do Vínculo Empregatício
As próprias testemunhas indicadas pela igreja confirmaram “a obrigatoriedade de atuação das esposas de pastores”, “remuneração fixa” e “presença diária em cultos”, elementos afastaram a alegação de trabalho voluntário e demonstraram atuação profissional no âmbito da instituição religiosa.
Reconhecimento sob perspectiva de gênero
O colegiado adotou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero (resolução CNJ 492/2023), ressaltando a importância de distinguir o trabalho feminino administrativo e de cuidado, frequentemente invisibilizado nas instituições religiosas, da simples ajuda ao cônjuge. O tribunal enfatizou que a autora não podia ser tratada como extensão do trabalho do marido, mas como profissional com papel próprio na organização.
Condenação e Implicações
A igreja foi condenada ao pagamento de verbas rescisórias e multa do art. 477 da CLT, horas extras com reflexos em férias, FGTS etc, indenização estabilitária e dano moral no valor de R$ 15 mil.
O acórdão responsabiliza a instituição não apenas pelo vínculo laboral, mas também pelo impacto da transferência forçada durante a gestação, que teve consequências à saúde da autora e do bebê.