Todos os anos, no fim de setembro, as ruas do Brasil se enchem de crianças com sacolinhas nas mãos, ansiosas para receber doces, balas e guloseimas. É a tradicional celebração de São Cosme e São Damião, dois santos que, mesmo separados por séculos e culturas, seguem sendo símbolo de fé, partilha e alegria. Mas a data ainda gera confusão: afinal, é comemorada no dia 26 ou no dia 27 de setembro?
Na Igreja Católica, a memória litúrgica dos santos gêmeos é celebrada no dia 26 de setembro. Essa mudança ocorreu porque o dia 27, considerado originalmente a data de martírio dos irmãos, também é dedicado a São Vicente de Paulo. Para evitar sobreposição, o calendário católico ajustou a festa para o dia anterior.
Já na Umbanda e no Candomblé, o dia de São Cosme e São Damião segue sendo lembrado no 27 de setembro. Nestas tradições, eles são associados aos Ibejis, divindades infantis do panteão iorubá que representam pureza, alegria e a dualidade espiritual dos gêmeos.
Para a Igreja Ortodoxa Grega, a festa acontece em 1º de julho, enquanto em outras tradições ortodoxas a data é marcada em 1º de novembro. Essa pluralidade de celebrações reflete o sincretismo religioso que marcou a história do Brasil e permitiu que diferentes crenças preservassem seus rituais, mesmo em tempos de perseguição.
Quem foram São Cosme e São Damião
Cosme e Damião foram irmãos gêmeos que viveram entre os séculos III e IV na região da Ásia Menor. Médicos de profissão, ficaram conhecidos por tratarem enfermos gratuitamente — prática rara para a época, que lhes rendeu o apelido de “anárgiros”, que em grego significa “sem prata”.
Segundo relatos cristãos, eles não apenas curavam o corpo, mas também evangelizavam, levando muitos pagãos à fé cristã. A fama dos dois incomodou autoridades romanas, e eles acabaram sendo presos e martirizados. De acordo com a tradição, sobreviveram a várias tentativas de execução (foram lançados ao fogo, apedrejados e flechados), mas só morreram após serem decapitados.
A devoção a Cosme e Damião se espalhou rapidamente do Oriente para a Europa, especialmente para Roma e a região da Apúlia, tornando-se uma das festas mais populares da cristandade. No Brasil, a associação deles com os Ibejis fortaleceu ainda mais a popularidade da celebração.
A tradição dos doces
No Brasil, a data é marcada pela distribuição de doces para as crianças, uma tradição que une católicos e praticantes das religiões afro-brasileiras. A prática representa pureza, proteção da infância e partilha. Para muitos fiéis, é também uma forma de agradecer graças alcançadas pelos santos.
História dos Ibejis
Na tradição iorubá, o nascimento de gêmeos sempre foi considerado sagrado. Quando um dos irmãos morria, acreditava-se que o sobrevivente carregava a alma do outro, reforçando a ideia de equilíbrio e complementaridade. Os Ibejis foram trazidos ao Brasil pelos africanos escravizados e passaram a ser cultuados junto às imagens de Cosme e Damião como uma forma de preservar a fé e resistir à opressão.
Orações de São Cosme e São Damião
A devoção aos santos é reforçada pelas orações tradicionais. Uma das mais conhecidas diz:
“São Cosme e Damião, que, por amor a Deus e ao próximo, vos dedicastes à cura do corpo e da alma de vossos semelhantes, abençoai os médicos e farmacêuticos, medicai o meu corpo na doença e fortalecei a minha alma contra a superstição e todas as práticas do mal. Protegei todas as nossas crianças e conservai meu coração simples e sincero. Amém.”
Outra oração bastante rezada é a seguinte:
“Amados São Cosme e São Damião, em nome do Todo-Poderoso eu busco em vós a bênção e o amor. Peço paz, saúde e tranquilidade para mim e para minha família. Que a luz dos santos gêmeos esteja em meu coração e em meu lar. Amém.”
Fé que atravessa gerações
Seja no 26 ou no 27 de setembro, o importante para os devotos é celebrar a vida e a espiritualidade representadas pelos santos gêmeos. Para muitos, a data é também uma oportunidade de reforçar a solidariedade. Afinal, a tradição de distribuir doces é, acima de tudo, um gesto de partilha e de esperança.