Em João Pessoa (PB), o juiz Adhemar de Paula Leite Ferreira Néto, titular do 2º Juizado Especial Cível (JEC) da cidade, foi alvo de denúncia por racismo religioso após proferir decisão que concluiu não haver discriminação por parte de motorista do aplicativo Uber em recusar transporte à usuária por ela estar em um terreiro de Candomblé.
Em 23 de março de 2024, uma mulher que atua como mãe-de-santo solicitou uma corrida via Uber de um terreiro de Candomblé até uma consulta médica. O motorista selecionado enviou mensagem dizendo: “Sangue de Cristo tem poder, quem vai é outro kkkkk tô fora”. A corrida foi em seguida cancelada.
A passageira registrou boletim de ocorrência por intolerância religiosa e moveu ação judicial pleiteando indenização de R$ 50 mil por danos morais.
Decisão Judicial Contestada
Na sentença, o juiz entendeu que o episódio não configurou discriminação. Ele considerou que o motorista exerceu seu direito de recusar corridas, e que a autora da ação manifestou “intolerância” ao considerar ofensiva a frase enviada a ela.
“A autora, a se ver da inicial, ao afirmar considerar ofensiva a ela a frase ‘sangue de Cristo tem poder’, denota com tal afirmação que a intolerância religiosa vem dela própria, e não do motorista…”
Reações e Implicações
O episódio motivou o Ministério Público da Paraíba (MPPB) a abrir procedimento para apurar conduta do magistrado e encaminhar o caso à corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A mulher afetada relatou sentir-se “abalada e consternada”, afirmando que a decisão representa “um grave sinal de perpetuação da violência institucional” contra religiões de matriz africana.
Contexto Mais Amplo
Este caso se insere no debate sobre intolerância religiosa e racismo estrutural no Brasil, especialmente contra práticas de matriz africana. A situação acende alerta sobre o papel de plataformas digitais de mobilidade, a responsabilidade de motoristas parceiros e a interpretação judicial de direitos como liberdade de crença versus obrigação de prestação de serviço.
Além disso, a interpretação dada pelo juiz de que a “intolerância” seria da passageira e não do motorista agrava a controvérsia, levantando questionamentos sobre imparcialidade e sensibilidade do Judiciário frente a vítimas de discriminação.
Editado por Clayton Matos