Notícias

Supremo declara inconstitucional assédio judicial contra jornalistas

Ministros reconheceram a ilegalidade da prática do assédio judicial

FOTO: Antonio Augusto/SCO/STF
Ministros reconheceram a ilegalidade da prática do assédio judicial FOTO: Antonio Augusto/SCO/STF

Ana Pompeu/Folhapress

 

O STF (Supremo Tribunal Federal) declarou o assédio judicial a jornalistas inconstitucional. Nesta quarta-feira (22), o colegiado concluiu a análise do tema e entendeu que o uso de ações judiciais para intimidar a imprensa deve ser coibido.

Foram dez votos a 0 para reconhecer a ilegalidade da prática. Então presidente da corte no ano passado, a ministra Rosa Weber já havia votado e rejeitado a ação sobre o tema sem análise de mérito, por isso seu voto não é contabilizado.

O assédio judicial ficou definido pelo Supremo como o ajuizamento de diversas ações contra os mesmos acusados pelos mesmos fatos em foros diversos para constranger, dificultar ou encarecer a sua defesa. A partir do momento em que a prática for caracterizada, entendeu ainda a corte, as ações podem ser reunidas no mesmo foro.

O assédio judicial foi objeto de uma ação proposta pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), que teve todos os pedidos acolhidos pela corte.

O tribunal analisou conjuntamente uma ação da ABI (Associação Brasileira de Imprensa) que alegou o uso abusivo de ações judiciais de reparação por danos materiais e morais.

Nesse caso, os ministros foram unânimes em acatar parcialmente os pedidos incluindo Rosa Weber. O trecho rejeitado pedia que vítimas de assédio judicial fossem ressarcidas por danos morais e que houvesse uma multa para as pessoas que cometam esse tipo de conduta. Segundo o entendimento firmado, já existem instrumentos previstos para a proteção do réu e para a reparação de danos, cabendo ao juiz de cada caso concreto decidir a respeito.

O julgamento, concluído na sessão desta quarta, teve início em setembro de 2023, em sessão virtual. Luís Roberto Barroso pediu vista e o caso foi retomado na semana passada.

Ficou definido ainda que “a responsabilidade civil de jornalistas ou de órgãos de imprensa somente estará configurada em caso inequívoco de dolo ou de culpa grave (e evidente negligência profissional na apuração dos fatos)”.

Houve divergência neste ponto. Ficaram vencidos Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Kassio Nunes Marques. Eles entendiam que a tese do julgamento não deveria incluir a expressão “culpa grave”. Para eles, isso cria uma isenção à categoria, que passa a responder de forma diferenciada em relação a outros cidadãos.

Na ação da Abraji, a entidade pediu a interpretação de um dispositivo do Código de Processo Civil que trata da cooperação judiciária para centralização de processos repetitivos para que em situações de assédio judicial.

“Há atualmente diversos comunicadores e jornalistas que são vítimas de assédio judicial no país e, assim, têm visto negados os direitos à ampla defesa e ao devido processo legal”, diz o pedido.

O resultado não vai evitar 100% da prática, mas vai dificultar a ação de quem quiser promover o assédio judicial, afirma a representante da Abraji, a advogada Taís Gasparian, que lembra ter iniciado o uso do termo “assédio judicial contra jornalistas”.

“Para quem quiser constranger a imprensa, esse ato estará mais difícil. É um ganho. O Supremo Tribunal Federal de fato repudiou completamente o assédio judicial”, disse Gasparian, que é advogada da Folha.

As ações tentam brecar episódios como o ocorrido em 2007 contra a jornalista Elvira Lobato, que foi repórter da Folha por 27 anos. Em 2007, ela fez uma reportagem sobre o patrimônio empresarial de dirigentes da Igreja Universal do Reino de Deus, que lhe rendeu um prêmio Esso no ano seguinte.

Em decorrência da publicação do texto, fiéis e pastores moveram mais de uma centena de ações judiciais contra a repórter e contra o jornal, em locais diferentes, com a alegação de danos morais. As ações não contestavam as informações contidas no texto.

O caso foi amplamente repercutido e motivou, à época, uma ação no Supremo que culminou com a revogação da Lei de Imprensa.