SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ondas de calor como a que atinge diversas regiões do Brasil com alta de temperaturas de até 5°C têm sido reforçadas por um bloqueio de pressão atmosférica, pelo El Niño e por mudanças climáticas. O país vive a oitava onda do tipo de 2023, e está sob aviso até a próxima sexta-feira (17).
A principal característica da atual onda é a extensão da zona de alta pressão atmosférica, que vai do norte da Argentina ao sul da Amazônia e impede a chegada de frentes frias a essas áreas.
O El Niño, caracterizado pelo aquecimento das águas do Pacífico equatorial, também afeta a circulação de massas de ar, intensificando a permanência de ar quente e seco em parte do país.
Por outro lado, segundo especialistas, a frequência de eventos extremos aponta o rastro de mudanças climáticas na intensidade de chuvas e do calor.
Para grandes cidades como São Paulo, fatores locais como materiais que absorvem o calor em ruas, edifícios e equipamentos públicos criam as ilhas de calor no microclima municipal. A capital bateu novo recorde do ano nesta segunda-feira (13), com 37,4°C.
De acordo com o meteorologista Marcelo Seluchi, do Cemaden (Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), a extensão e a duração da zona de alta pressão retroalimentam o calor e a permanência do ar seco. “A energia do sol é consumida em duas coisas: aumentar temperatura e evaporar água do solo. Com um solo pouco úmido, porque ainda não estamos na estação chuvosa, a maior parte vai para a temperatura.”
Seluchi, que coordena a área de operações e modelagem do centro, ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, se refere ao fato de a primavera ainda ser uma estação de transição, antes da chegada do verão, mais chuvoso.
Sem chuva, também não há o alívio momentâneo das temperaturas. O papel do El Niño é justamente reforçar esse bloqueio com a mudança de correntes de ar, a partir do aquecimento das águas que também altera a circulação na atmosfera, que mantêm frentes frias estacionadas na região Sul. Isso ajuda a explicar a grande quantidade de chuva na região, que tem enfrentado desastres ao longo do ano.
“Nos primeiros 12 dias de novembro na região de Porto Alegre [RS], já tivemos, neste ano, 147,6 milímetros e provavelmente veremos esta semana mais chuvosa”, diz o meteorologista Guilherme Borges, da empresa Climatempo. Ele aponta que a média na capital gaúcha do Inmet para o mês é de 105 milímetros.
Os indícios de efeitos das mudanças climáticas, segundo Borges, já estão comprovados. “Desde 1950 vivemos um ciclo de aquecimento potencializado pelas emissões de gases de efeito estufa.”
Esse cálculo, segundo Micael Amore Cecchini, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, é feito por meio dos estudos de atribuição. “Se formos medir só a temperatura, não conseguimos separar o joio do trigo. Vamos mudando os modelos e tiramos, por exemplo, o CO2 da atmosfera, ou cobrimos o mundo de cidades.
Nesse sentido, os estudos já mostram que teríamos uma época ‘mais fria’ na média.”
Assim, um planeta mais aquecido tende a ver efeitos mais acentuados de fenômenos atmosféricos, como o El Niño, ou mesmo o La Niña, que é marcado pela situação contrária. “É como uma onda que vai para cima e para baixo. As mudanças climáticas aumentam os extremos dessa onda”, diz Cecchini.