FOLHAPRESS
As decisões de Alexandre de Moraes, do STF, sobre a atuação da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) no governo de Jair Bolsonaro (PL) trazem até o momento indícios de irregularidades, mas deixam ainda lacunas sobre como se deu na prática a atuação da “Abin paralela”.
Com base em três decisões de Moraes no inquérito conduzido pela Polícia Federal, veja abaixo o que se sabe até agora e alguns pontos não detalhados pelo ministro nos despachos.
Os documentos mostram que, após a primeira fase, a investigação ampliou seu foco: antes era o uso ilegal do FirstMile, e depois passou a mirar relatórios e informações produzidos supostamente a pedido do que a PF batizou de “núcleo político”, cujo único nome apontado até agora é Carlos Bolsonaro (Republicanos).
Como as decisões de Moraes incluem apenas trechos dos pedidos da PF, outros elementos de prova e indícios podem estar nos apensos e nas representações do delegado do caso, ainda mantidos em sigilo.
O que está sendo investigado?
1 – A compra e o uso do software FirstMile, que fornecia, segundo a PF, dados de localização de pessoas de forma ilegal, sem autorização judicial;
2 – Elaboração de supostos relatórios de inteligência contra adversários políticos de Bolsonaro por parte de servidores da agência;
3 – Uso da agência para fins pessoais da família do ex-presidente da República;
4 – Suposta tentativa da atual cúpula da agência de atrapalhar as investigações.
Como o FirstMile funciona?
O FirstMile utiliza uma brecha no protocolo internacional das telecomunicações, chamado de SS7 (Sistema de Sinalização nº 7). O protocolo atua quando uma pessoa liga para o celular de outra e as redes precisam saber em qual antena o interlocutor está.
Ele é instantâneo, e a conexão entre os dois celulares é estabelecida quando uma informa à outra a localização com base na antena mais próxima. Empresas de inteligência usam uma brecha e criam empresas de telecomunicação de fachada para pedir às operadoras reais a localização de celulares. Assim, quem compra a ferramenta pode incluir o telefone de qualquer pessoa na plataforma e fazer o monitoramento.
Ele invade a rede de telefonia?
A PF afirma que ele invade a rede de telefonia e cita como indício uma troca de email entre representantes da empresa vendedora do software e um servidor da Abin. Em janeiro de 2020, a funcionária da Cognyte afirma que estava “pesquisando e testando novos métodos para acessar” a rede da Tim porque havia sido barrada pela operadora.
Qual teria sido o impacto do uso da ferramenta?
A PF, mostra a decisão, afirmou que a análise preliminar do banco de dados do programa indicou a existência de 60.734 pesquisas, com retorno com a geolocalização em 21.309 buscas. O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou em entrevista que 30 mil pessoas foram alvo do software.
Quem teria sido responsável por pedir e por incluir os números na ferramenta?
Na primeira decisão de Moraes, há um trecho em que a PF indica o “núcleo de pesquisas” na Abin. São 12 servidores identificados até outubro de 2023 como os responsáveis por executar a inclusão dos números na ferramenta. Não há detalhes, no entanto, de quem seria o responsável por cada pedido e se os oficiais da Abin sabiam de irregularidades.
Quais indícios existem do caso Jair Renan e quem são os envolvidos?
No caso de Jair Renan, filho do ex-presidente, a Abin teria atuado para ajudá-lo, já que ele era alvo de investigação da PF sobre as relações com empresas que tinham interesse em contratos com o governo federal. Agentes da Abin tentaram atrapalhar a investigação e coletar informações com o objetivo de evitar “riscos à imagem” de Bolsonaro. Há três policiais federais citados, sendo um deles apontado como responsável por ter feito um monitoramento do caso. Não há informações sobre o que os outros dois teriam feito. Há ainda menção de que o pedido teria partido do GSI, comandado à época por General Heleno. Não é possível saber como a solicitação teria sido feita, nem que indício existe sobre isso.
Quais indícios existem no caso Flávio Bolsonaro?
A decisão diz que o caso do senador estava sob responsabilidade de Marcelo Bormevet, que ocupava o posto de chefe do CIN.
Não há dados dos elementos de prova obtidos na investigação e somente cita uma reportagem do The Intercept que fala da participação do policial federal Marcelo Bormevet no episódio.