Agência Brasil
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu nesta terça-feira (23), em Brasília – por unanimidade – aplicar a pena máxima de aposentadoria compulsória, com vencimentos proporcionais, ao juiz trabalhista Marcos Scalercio, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), sediado em São Paulo. Ele foi acusado por ao menos três mulheres de assédio sexual e importunação sexual.
Scalercio encontra-se afastado desde setembro, por decisão do CNJ. Em seguida ao afastamento, foi determinada a abertura de processo administrativo disciplinar (PAD), que agora resulta na demissão do magistrado.
O caso foi revelado em agosto do ano passado pelo portal G1, após as vítimas terem procurado movimentos de combate ao assédio sexual contra mulheres, como o Me Too Brasil e o Projeto Justiceiras. Ao todo, foram contabilizadas ao menos 87 denúncias contra Scalercio.
O CNJ decidiu demitir o magistrado com base em três casos com apuração mais avançada. Em um desses episódios, o ataque contra uma advogada ocorreu dentro do gabinete do juiz no TRT2. A vítima relatou que Scalercio avançou sobre ela e encostou suas partes íntimas, pressionando-a contra parede. Ela conseguiu se desvencilhar e saiu correndo, acionando na hora a segurança do tribunal.
Em seguida, a advogada denunciou o assédio na corregedoria do tribunal trabalhista, mas o órgão, antes de o episódio vir a público, arquivou o caso sem dar andamento às investigações. Somente depois da divulgação pela imprensa, em agosto do ano passado, que o TRT2 – em decisão de seu plenário – resolveu abrir um PAD contra Scalercio.
“Institucionalmente [as vítimas] não encontraram nenhum amparo”, destacou o conselheiro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Para o futuro, ele sugeriu a criação de um “locus [lugar] de acolhimento para essas vítimas, nesses casos que não são poucos no judiciário brasileiro”.
Outros casos
Os outros dois casos julgados nesta terça-feira pelo CNJ dizem respeito a uma aluna do curso Damásio Educacional, onde o magistrado dava aulas de Direito, e a uma advogada com quem Scalercio teve contato por meio de uma rede social. Em ambos os episódios, ele teria se vangloriado do cargo de juiz para intimidar as vítimas, de acordo com os relatos.
Ao fim, prevaleceu o voto da conselheira Salise Sanchotene, que fez uma descrição minuciosa dos acontecimentos narrados pelas vítimas. Ela concluiu que o magistrado teve conduta escandalosa dentro do ambiente de trabalho, registrou um padrão usual de comportamento e praticou atos gravíssimos, passíveis de punição com pena máxima. O voto da relatora foi elogiado pelos demais conselheiros, sendo seguido por todos.
“Esse processo é paradigmático enquanto reflete uma sociedade estruturalmente machista que invisibiliza as mulheres e, mais do que isso, as silencia”, disse a presidente do CNJ, ministra Rosa Weber. “Lamento que a nossa legislação assegure vencimentos ou subsídios proporcionais ao tempo de serviço, mas é a nossa legislação e nós temos que aplicá-la”, acrescentou ela, em referência à pena de aposentadoria compulsória, que prevê a continuidade do pagamento de salário – de modo proporcional ao tempo que o juiz ocupou o cargo.
Em nome do juiz Marcelo Scalercio, o advogado Leandro Raca apontou o que seriam contradições nos relatos das vítimas e argumentou, também, que o CNJ teria aplicado penas mais brandas em casos similares. Em nenhum momento a defesa do magistrado assumiu a prática dos assédios, que também sempre foram negados pelo juiz.